Heitor Caetano, único brasileiro no CC:DC, conta sobre a experiência como embaixador da diversidade
O diretor de criação está participando no WTS Creative Academy, programa de imersão criativa com o objetivo de construir um projeto sobre inclusão para a Procter and Gamble (P&G)
Heitor Caetano, diretor de criação da DPZ&T, é o único representante brasileiro e latinoamericano como embaixador da diversidade no Cannes Can: Diversity Collective (CC:DC), projeto lançado em 2017 para impulsionar discussões sobre diversidade e inclusão no festival de Criatividade de Cannes. Ele está participando no WTS Creative Academy, programa de imersão criativa com o objetivo construir um projeto sobre inclusão para a Procter and Gamble (P&G).
O cronograma envolve também se engajar em diversas outras ações que acontecem ao longo do festival, como fazer intercâmbio cultural com outros embaixadores, conectar outras pessoas com as ações do CC:DC Beach e colaborar com as iniciativas de ativação da Inkwell Beach, uma “nova praia”, espaço que celebra perspectivas criativas e de comunicação de comunidades sub-representadas na indústria.
"O CC:DC talvez seja a única iniciativa concreta de inclusão do festival. Porque ele sai do discurso e vai pra prática. Enquanto o Festival de Cannes ainda tenta encontrar desculpas ou fórmulas básicas para justificar a ausência de pessoas negras no evento, o CC:DC está encontrando formas de unir talentos de todo o mundo e trazê-los para cá", afirma Caetano.
Abaixo, ele conta um pouco da sua experiência como embaixador:
Como tem sido a experiência de participar do projeto?
Eu tenho me sentido muito honrado. Ser a única pessoa da América do Sul a ser selecionada pela CC:DC, em meio a tantas pessoas talentosas no mundo, de alguma forma, também é a confirmação de que a escolha de não abrir mão das minhas identidades enquanto uma pessoa negra e LGBTQIAP+, e usá-las no meu trabalho para criar debates e construir pontes, está sendo reconhecida.
Sem contar o quão engrandecedor é compartilhar experiências e discutir o mercado ao lado de pessoas vindas de quatro diferentes continentes. Ao mesmo tempo, essa imersão também tem servido de bússola. E ainda é frustrante reconhecer que, apesar das diferenças geográficas ou culturais, a publicidade mundial ainda tem muito que avançar nas questões de diversidade e inclusão.
Como foi o processo de inscrição e seleção?
O processo contava com um questionário e duas demandas criativas: criar uma campanha em vídeo e uma marca que me definisse. Basicamente, era sobre me tratar como uma marca e mostrar para o programa, através dessas peças, o porquê eu deveria ser um dos selecionados. Desenvolver isso foi bem difícil, porque não é apenas sobre falar de você como em uma entrevista, mas, literalmente, vender o seu melhor.
O que eu tentei fazer na minha inscrição foi me apoiar em um raciocínio que, pessoalmente, mexe muito comigo: construir minha autoestima profissional sempre foi sobre pegar coisas de volta. Sinto que, na vida, como uma pessoa negra e LGBTQIAP+, pelas questões estruturais, houve muitas tentativas de esvaziar minhas identidades e me afastar de lugares de privilégio. Na propaganda não foi diferente. Fui crescendo ao passo que também fui compreendendo como avançar sem ter que abrir mão de quem eu sou. Ainda mais em um mercado movido a privilégios e extremamente branco e heteronormativo. Um processo de mudança que aconteceu de fora para dentro para que eu pudesse tentar mudar o mercado de dentro para fora.
Qual foi o projeto desenvolvido para a P&G?
A P&G é a patrocinadora do Widen The Screen Creative Bootcamp e o desafio criativo do programa é desenvolver uma campanha para uma das plataformas de diversidade da marca, em uma imersão de três dias. No meu caso, o briefing escolhido foi sobre a plataforma My Black is Beautiful, que empodera e incentiva pessoas negras, especialmente mulheres, a aceitarem e sentirem orgulho dos seus cabelos.
Nesta edição, o festival foi muito criticado pela falta de representatividade entre os jurados brasileiros. Como iniciativas como esta podem ajudar a elevar participação de grupos minoritários no festival e também na indústria?
O CC:DC talvez seja a única iniciativa concreta de inclusão do festival. Porque ele sai do discurso e vai pra prática. Enquanto o Festival de Cannes ainda tenta encontrar desculpas ou fórmulas básicas para justificar a ausência de pessoas negras no evento, o CC:DC está encontrando formas de unir talentos de todo o mundo e trazê-los para cá. Não apenas com o programa de embaixadores, mas com a InkWell Beach, que se tornou um ponto de encontro, desenvolvimento e partilha entre profissionais negros de todo o mundo.
E eu acredito que a ocupação é uma das principais ferramentas de transformação das estruturas. Afinal, não adianta ter cases com pautas de diversidade sendo premiados e só pessoas brancas e heteronormativas subindo para receber os prêmios. Isso é capitalizar a humanidade do outro. O que o CC:DC faz é construir oportunidades para que outras pessoas sejam vistas, ouvidas e reconhecidas não apenas por seus projetos profissionais, mas por suas histórias.