Nas últimas eleições para o Senado dos Estados Unidos (2005), o ator hollywoodiano Michael J. Fox, portador do Mal de Alzheimer, foi o garoto-propaganda da campanha da candidata Claire McCaskill, que defende o uso de células-tronco embrionárias. Apesar da candidatura da senadora, o governo norte-americano é proibido de patrocinar esse tipo de pesquisa.
No Brasil, o artigo 5º da Lei de Biossegurança, proposta em 2005, prevê o uso de células-tronco embrionárias de embriões inviáveis ou que estejam congelados há mais de três anos. E é preciso o consentimento dos genitores. A polêmica, portanto, é que muitos defendem, inclusive a Igreja Católica, que o embrião é vida e, por isso, seu uso para fins terapêuticos é um atentado contra a vida.
Hoje, o uso de célula-tronco adulta (encontrada no cordão umbilical, placenta, fígado e medula óssea) é permitido no País, mas a célula-tronco embrionária não. A diferença entre esses tipos de células-tronco é que a embrionária tem a capacidade de se transformar em outros tecidos do corpo, como ossos, nervos, músculos e sangue. Por isso, a célula-tronco embrionária é útil em terapias de combate a acidentes vasculares cerebrais, traumas na medula espinhal, entre outras doenças.
Por esse motivo, campanhas sobre as células-tronco embrionárias não são feitas. A Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) trabalha apenas com mídia espontânea para divulgar seu trabalho com célula-tronco adulta. “Nossos pesquisadores esclarecem a necessidade de doação de medula óssea e o que é célula-tronco em entrevistas para a mídia”, informou a assessoria de comunicação.
Mas enquanto a pesquisa em células-tronco embrionárias não é aprovada, movimentos e grupos de pessoas a favor das pesquisas espalham-se pelo Brasil e buscam, por meio da internet e do marketing viral, divulgar sua opinião e pressionar o governo.
Fundador do movimento Células-Tronco Esperança, Cláudio Antônio de Deus criou em 2004 a logomarca do movimento – duas flores cujos caules formam um fragmento de DNA – quando o projeto da Lei de Biossegurança ainda tramitava no Congresso. Sua filha é portadora de esclerose múltipla e a terapia com células-tronco embrionárias pode salvar sua vida. “Senti que precisava fazer alguma coisa e, por isso, criei o movimento e o logo. Nunca recebi dinheiro de ninguém, apenas o apoio de algumas empresas e instituições que divulgam, gratuitamente, o nosso site, criado em 2007 e mantido por voluntários que acreditam na causa. E muitos professores e alunos de medicina e biologia sempre nos procuram e ajudam na divulgação do nosso movimento”, explica Antônio de Deus.
Outro movimento similar é o “Quem sofre tem pressa”, composto por membros de diversas ONGs (organizações não-governamentais) que no último dia 5 de abril fizeram caminhadas em São Paulo (SP), Belo Horizonte (MG), Fortaleza (CE) e Brasília (DF) para pressionar o STF (Supremo Tribunal Federal) a aprovar as pesquisas com células-tronco embrionárias.
Laboratórios
Em contrapartida, o congelamento de cordão umbilical torna-se, aos poucos, uma prática comum entre os pais que acreditam que podem prevenir doenças futuras de seus filhos por meio das células-tronco adultas. O laboratório Cryopraxis existe desde 2001, mas nunca fez nenhuma campanha publicitária de seus serviços. “Divulgamos nosso trabalho por meio de mala direta e newsletter. Neste mês, vamos lançar a revista Cryopraxis News, que terá uma tiragem de 25 mil exemplares e será trimestral. O objetivo da publicação é esclarecer todas as dúvidas sobre o assunto”, explica Amarildo Costa, gerente comercial do laboratório.
O tema da Campanha da Fraternidade deste ano da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) é “Vida em abundância para todas as criaturas”, na qual se mostra contra o aborto, a eutanásia e, claro, as pesquisas com células-tronco embrionárias.
Agências estimulam discussão
A convite do propmark cinco agências de publicidade criaram anúncios – que foram veiculados na edição de segunda-feira (5) – nos quais demonstram seu posicionamento com relação ao uso de células-tronco embrionárias.
Criado pelo diretor de criação Paulo Coelho, pelo redator Zico Farina e pelo diretor de arte Rodrigo Panucci, a Africa acredita que somente com informação as pessoas podem se posicionar corretamente sobre o assunto. “Nossa proposta é mostrar para o cidadão comum que apenas com as informações sobre o assunto é que as pessoas poderão se posicionar diante da questão. O anúncio visa exatamente a isso e alerta para que as pessoas se informem, descubram e formem a sua opinião”, disse Coelho.
A equipe da NeogamaBBH também concorda que com relação à célula-tronco as pessoas têm que ter opinião, não importa se a favor ou contra.“Há mais mistérios entre a ciência e a religião do que sonha a nossa vã filosofia. Mas o fato é que as células-tronco são uma descoberta sobre a qual você não pode deixar de ter opinião. A favor ou contra, a sua vida e a de quem você ama vai de alguma maneira depender disso”, declarou Alexandre Gama, presidente e diretor geral de criação da agência. Assinam a criação do anúncio da Neogama Pepê e Laura Esteves.
Chamar a atenção para a reflexão é o que propõe a McCann Erickson, com seu anúncio “Punheta”. Segundo Adriana Cury, diretora de criação da peça, o debate sobre o tema é a melhor forma da população se posicionar sobre o uso de células-tronco em pesquisa. “Não somos nem contra nem a favor. No final do anúncio justificamos que é preciso que esse tema seja debatido em profundidade, informando e conscientizando a sociedade. Só assim é possível tomar uma posição”, argumentou. O anúncio da McCann Erickson também teve a participação do diretor de arte Doriano “Carneiro” Cecchettini e do redator Hugo Veiga.
Em formato de pergunta de múltipla escolha, a Leo Burnett coloca duas alternativas sobre o futuro do ex-baterista do grupo O Rappa, Marcelo Yuka. Após levar seis tiros em um assalto no Rio de Janeiro em novembro de 2001, Yuka ficou tetraplégico. E a terapia com células-tronco embrionárias o ajudaria a andar novamente. “A equipe de criação do anúncio é a favor das células-tronco e, por isso, resolvemos colocar a foto do Marcelo em pé na resposta ‘sim’ e ele na cadeira de rodas na alternativa ‘não’”, explicou Ruy Lindenberg, diretor de criação da agência. A criação é de João Caetano e Alessandro Bernardo.
A Talent quer convencer aqueles que ainda são contra o uso de células-tronco embrionárias com anúncio no qual o leitor se vê como um cadeirante.“Quem tem saúde não sabe como a vida das pessoas que estão numa cadeira de rodas ou tem algum problema de saúde é difícil. E como isso poderia ser solucionado com a liberação das pesquisas”, disse Leo Macias, diretor de criação do anúncio, ao lado de João Livi, e dos criativos Gustavo Nardini e Pedro Bullos.
Maria Fernanda Malozzi