Ciência decifra reações de consumo
O diálogo com o consumidor nem sempre é explícito como parece. Às vezes, o que ele diz sobre uma marca não é necessariamente o que ele pensa ou sente. Essa é a questão abordada pelo neuromarketing, cuja proposta é entender que tipo de reações as campanhas, os serviços e os produtos causam nos consumidores. São Paulo sediou a edição de 2013 do Fórum Mundial de Neuromarketing entre os últimos dias 6 e 8, servindo como plataforma para que o assunto fosse debatido entre os especialistas e também para que os profissionais de marketing conhecessem como funciona a aplicação das neurociências no entendimento do comportamento do consumidor.
O evento reuniu vários cientistas cujos trabalhos direcionam-se na identificação do que chamam de emoções não declaradas, ou seja, aquilo que o consumidor de fato sente e pensa sobre uma marca, mas não consegue verbalizar. Aí está centrado o objetivo do neuromarketing. “Os consumidores não necessariamente mentem. Eles simplesmente não conseguem traduzir em palavras o que estão sentindo”, afirma Elissa Moses, vice-presidente executiva de neuromarketing e emoções da Ipsos.
Para Elissa, existem três pontos fundamentais que explicitam o uso da neurociência nos estudos de marketing. O primeiro parte da premissa de que o consumidor não é capaz de dizer exatamente o que está sentindo — não porque não quer, mas porque é difícil verbalizar suas sensações. Em segundo lugar vem a diferença constatada entre o que ele pensa e sente — o que faz parecer com que ele não esteja falando a verdade. Por último, outra constatação: a de que o consumidor diz uma coisa, mas age de forma completamente diversa.
A explicação para esse comportamento, apontam os especialistas, é que existem dois sistemas de processamento no nosso cérebro. Um deles trata apenas das informações que recebemos, experimentamos e vivenciamos conscientemente, fazendo com que percebamos as sensações e as classifiquemos. O outro, responsável por 95% da atividade cerebral de percepção, trabalha no plano do inconsciente e abriga as ferramentas neurais que trabalham e processam as impressões rápidas, intenções e emoções. Tais emoções, diz Elissa, “não são apenas sentimentos, e sim reações fisiológicas inconscientes que ocorrem em cadeia envolvendo o cérebro e todo o corpo humano. Tudo acontece em milissegundos”.
Nesse minúsculo intervalo de tempo, o corpo se comunica com o cérebro, fazendo com que antes sintamos para só então agirmos. Quando a neurociência mostra resultados comportamentais com base nos batimentos cardíacos e na respiração, por exemplo, está avaliando qual reação determinado anúncio ou produto causou. “Um anúncio com boas propriedades de neuromarketing tem elementos que tocam nas emoções do consumidor, como pessoas e animais, situações familiares e um roteiro que de alguma forma o mobiliza”, afirma Carl Marci, da Innerscope, empresa que usa a biometria nas pesquisas de marketing.
Desalinhamento
O fato de existirem dois sistemas distintos trabalhando com as informações que o corpo e o cérebro recebem é endossado pelos resultados distintos registrados entre os estudos de neuromarketing — que utilizam técnicas de biometria e rastreamento ocular, por exemplo — e as pesquisas tradicionais. Elissa explica que essa discrepância é normal, já que os métodos de avaliações são diferentes. “Os estudos não necessariamente devem sempre mostrar os mesmos resultados. O consciente e o inconsciente estão sempre lutando um contra o outro. É preciso deixar ambos se mostrarem, não deve haver preocupação em alinhá-los, pois estão relacionados a dois tipos diferentes de informação”, diz.
Mas a diferença nos resultados tem levantado dúvidas sobre a validade das técnicas de neuromarketing, que passaram a ser usadas com frequência no mercado apenas na última década e ainda não conquistaram a confiança de muitos dos profissionais da área. A executiva da Ipsos, porém, garante que a satisfação dos clientes atesta a validade da neurociência aplicada ao marketing. “Há muitas empresas que usaram essas ferramentas e saíram satisfeitas. Elas obtiveram informações que não poderiam ter conseguido de outra forma, buscaram um entendimento mais completo de qual é o potencial de suas marcas e produtos”, avalia.
A maioria dos clientes é composta por empresas de grande porte. Algumas inclusive passaram a incluir neurocientistas em suas equipes de marketing para desenvolver seus próprios estudos. Há, entretanto, companhias médias, que não estão no primeiro escalão do setor em que atuam, buscando essas técnicas para, segundo a executiva, “procurar uma visão que as concorrentes não terão” durante a disputa pela maior fatia do mercado.
Simplificação
Para Elissa, o principal trunfo do neuromarketing é ser capaz de fornecer informações muito específicas, relativas ao inconsciente das pessoas, o que não era possível fazer há alguns anos. No futuro, porém, as ferramentas e tecnologias estarão disponíveis em plataformas móveis, tornando possível a identificação do comportamento do consumidor onde quer que ele esteja.
A executiva afirma que isso se deve ao fato da evolução tecnológica e também à eficiência das técnicas de neuromarketing. “Há vantagens como o baixo custo e a capacidade de o consumidor participar de uma pesquisa no seu ritmo e com privacidade. Quando algo vem para agregar e se mostra benéfico para o mercado, é acatado e se desenvolve naturalmente”, diz.
Quanto ao Brasil, Elissa considerou o país um terreno fértil para o desenvolvimento do neuromarketing, uma vez que “há bons pesquisadores e cientistas, um importante mercado criativo e a atuação de marcas grandes e poderosas”. “Nossos clientes daqui nos desafiam cada vez mais”, finaliza a executiva da Ipsos.