Conveniência aquece adesão de micro markets em condomínios
Imagine estar em casa durante a quarentena e, no meio daquela receita nova de pão, você perceber que acabou o fermento? Não são raras situações como essa, mas se antes da pandemia da Covid-19 já seria um incômodo sair de casa por tão pouco, imagina ter de fazer o mesmo com tantos riscos de contaminação.
Foi nesse cenário de forte demanda por itens essenciais na dispensa de casa que os micromercados de conveniência ganharam popularidade em condomínios.
A tendência tem atraído não apenas startups e foodtechs, mas também grandes redes de supermercado e de outras áreas, como farmácia, lavanderia e até salão de beleza. No segmento alimentar, há ainda empresas que atuavam em setores similares, como conjuntos comerciais, mas que migraram para o modelo de prédios residenciais após a pandemia.
Esse é o caso da Nutricar, que há sete anos oferece serviços de micro market e cafeteria em mais de 450 escritórios corporativos em São Paulo e, desde dezembro de 2019, ampliou suas operações para prédios residenciais.
Com o início da pandemia, a nova operação passou a ganhar mais relevância no escopo da companhia. Com 60 lojas no modelo, um ritmo de abertura de até cinco unidades por semana, a empresa espera que o negócio represente 50% das receitas totais em 2021. Bernardo Fernandes, um dos sócios, detalha o novo cenário. “O empreendimento residencial é um nicho que veio para ficar.
No corporativo, a gente vendia 20 dias por mês em horário comercial, mas agora vendemos 24h por dia”, pontua. Apesar dos benefícios, a estrutura de minimercado em condomínios exige dinâmica completamente diferente de espaços tradicionais. “Esse formato requer uma personalização muito maior, logística de abastecimento diário, oferta de portfólio de produtos mais perecíveis, como sucos e água de coco, entre outros”, destaca.
A numenu também precisou se adaptar. Até abril, a empresa atuava como microloja de conveniência em automóveis por aplicativo, ofertando snacks, guloseimas e outros itens, como carregadores de celular.
Com a queda de circulação de pessoas e do serviço de mobilidade, Rafael Freitas, fundador da startup, remanejou a rota. Levou o formato para condomínios e, pouco mais de quatro meses depois, soma quase 50 lojas em espaços residenciais em São Paulo.
“Muita gente pergunta se, com a flexibilização da quarentena, as vendas cairiam, mas, ao contrário, nosso faturamento cresce a cada semana. O modelo é sustentável, inclusive, em momentos de normalidade. É uma comodidade que veio para ficar”, aposta Freitas. Mas não são apenas startups e foodtechs que estão experimentando novos caminhos.
Com previsão de abertura de oito lojas em outubro e outras 15 até dezembro no formato container em condomínios, a rede Hirota aposta no modelo express para se aproximar cada vez mais de seus consumidores.
Segundo Hélio Freddi Filho, diretor de marketing e expansão, a proposta é conhecer os hábitos de consumo, o perfil de compras e, a partir daí, gerar insights para criação de produtos e novas abordagens.
Como as lojas são baseadas no autoatendimento e autopagamento, a experiência é completamente digital, o que permite o acompanhamento da jornada de forma mais personalizada. O não contato humano também acaba sendo uma vantagem em um momento de restrições e distanciamento social. “É um sonho antigo de toda marca conseguir entrar na casa das pessoas.
Alcançamos esse objetivo com o modelo Hirota Express em condomínios e, a partir daí, estudamos os hábitos de compra diretamente, oferecendo uma experiência melhor, entendendo como ofertar o mix de produto mais adequado. É muito rico o que vem de informação porque você passa a entender na casa dele os hábitos”.
O executivo explica que um time de business intelligence monitora possíveis padrões de compra para prever necessidades e, consequentemente, montar uma oferta mais eficiente.
Como o espaço é reduzido, não há estoque na loja, o que exige estratégia para não oferecer produtos que fiquem encalhados, nem deixar faltar. A ideia é funcionar como uma extensão da dispensa da casa.
Com lógica semelhante atua a Nutricar, que também mantém um time de BI para fazer a gestão de itens ofertados de acordo com parâmetros como geolocalização e clima, entre outros fatores.
“Percebemos que moradores buscam produtos diferentes de acordo com a região dos prédios. Temos um time de BI que faz a captação de dados para oferecer o que as pessoas estão buscando. Como não temos estoque de produto, a estrutura é compacta e a reposição das nossas lojas precisa ser diária”, destaca Bernardo.
“Monitoramos ainda fatores que influenciam o consumo. Quando chega uma frente fria, por exemplo, tem aumento de vinhos e massas. Aos fins de semana com sol, as pessoas fazem churrasco, então, abastecemos com carvão e cerveja”.
Nesse contexto, a segurança também é priorizada nas lojas. Pela disponibilidade 24h, o controle a esses espaços precisa de alguns parâmetros, sobretudo, para o consumo de bebida alcoólica.
No Hirota, por exemplo, a porta do estabelecimento fica trancada, e apenas maiores de idade têm acesso ao mercado usando o aplicativo que fornece um QR Code de identificação. Menores só podem entrar acompanhados. Já na Nutricar, as geladeiras com bebidas alcóolicas ficam trancadas, e são abertas apenas por consumidores maiores de 18 anos.
Aprendizados
Disponível majoritariamente em shoppings, a Ofner também tem fortalecido seus negócios em condomínios. O formato existe desde 2016, mas ganhou espaço na pandemia. Atualmente, são 25 lojas no modelo truck em São Paulo.
Segundo Mario Martins da Costa Jr., diretor-comercial da rede de confeitaria, a versatilidade e a praticidade são o grande trunfo. “Temos uma resposta superpositiva com relação a esta opção, as pessoas adoram encontrar a Ofner no condomínio ou em alguma rua perto de casa. É uma forma de nos aproximar ainda mais do nosso público”.
Para Freddi Filho, do Hirota, a discussão vai além. A modalidade em condomínio funciona como um impulsionador das lojas convencionais também.
“O consumidor quer conforto e segurança, quer evitar deslocamentos e trânsito. Temos observado, inclusive, gente fazendo sua compra da semana no micro market, mas nosso objetivo de entrar nos condomínios é também o de awareness, para que, na hora de fazer a compra do mês, ele lembre da gente e visite a loja tradicional”.