Criatividade, metodologia e esponjas
Pense em uma esponja de lavar louça. Agora, imagine uma pilha gigante de pratos sujos dentro da pia, daqueles bem engordurados, que dão nojo até de pegar. O que você faz? Não sei você, mas o que eu faço segue exatamente este ritual: pingo um pouco do detergente na esponja, dou uma molhada para o sabão misturar com a água, espremo um pouco para fazer espuma e mando ver na louça. Minha autoconfiança para “matar o job” chega com tudo. Mas ela dura mais ou menos até o quarto prato. É nesse ponto que chego a uma triste conclusão: o sabão da esponja já não dá conta da gordura e a água da esponja está mais suja que a própria louça. E agora? Vou até o detergente e repito o ritual. Pingar, molhar, espremer e voltar com tudo para lavar a interminável pilha da noite anterior (sim, eu lavo só no dia seguinte). Mas volto diferente. Volto com a autoestima inabalável de ter água e sabão renovados ao meu lado, com sangue nos olhos e as mãos espumando de confiança.
Por que falo isso? É simples, porque esse “refresh” da esponja também vale para a gente. Pense assim: a esponja é você, a pilha de pratos é o seu problema e o refil de sabão com água é o ferramental que precisa ser renovado de vez em quando. O tal do mindset. Renovar nosso modelo mental é fundamental. Aliás, é praticamente um ato de fé. Sim, porque imagina deixar de fazer as coisas como você fazia para tentar um jeito diferente? Não é fácil, não. Nosso cérebro fica ecoando um “para que se mexeeeer?” à la Galvão, sem descansar. E só descansa mesmo quando percebe que o novo jeito é legal e dá certo também. Às vezes, mais certo que o antigo. E isso vale para todos nós, para quem trabalha nas agências, produtoras, empresas, mas, fundamentalmente, para quem trabalha com criatividade no dia a dia.
Quando eu vim para a Ana Couto, tive esse choque de modelos. Do tradicional “brainstorm na salinha” para o modelo de Sprints com os clientes. Da hierarquização de muitas agências para um modelo mais horizontal, com agilidade, autonomia e alinhamento. Do “gostei e não gostei” para o modelo “approve or improve”, onde o cliente se sente coautor das ideias e, por isso mesmo, convidado a aprová-las ou melhorá-las de forma colaborativa. Ah, e tudo isso com método. Muito método.
Aliás, uma das práticas que a propaganda deveria beber do design e de outras áreas do conhecimento é o uso consistente de metodologia. Aqui cabe um parêntese: metodologia não é aquela tia chata que entra para acabar com a festinha das crianças no play. Ao contrário, ela arruma o play para as crianças brincarem ainda mais. É uma turbinada na criatividade. Pense no Google, Apple, Vale do Silício. O que não falta é metodologia. E olha como os caras são criativos e geram valor para suas Marcas.
Aqui na AC, tive a oportunidade de criar, junto com o time, nosso fluxo de trabalho. São basicamente 3 etapas: Brand Insight, Brand Idea e Brand Connections. Cada uma com sua metodologia específica. E o cliente valida cada etapa antes da gente seguir para a próxima. Isso evita aquele jeito antigo de trabalhar em que a agência leva planejamento, criação, mídia, projeto especial disruptivo intergaláctico, mas, logo no primeiro slide, o cliente diz que não era nada daquilo. Transformar cada job em uma concorrência não faz o menor sentido. Sem falar no desgaste emocional das pessoas. Por isso, cada vez mais, fazer junto é fazer melhor. Um jeito diferente de trabalhar não só com propaganda, mas com criatividade em geral. É o único? Óbvio que não, mas tem funcionado muito bem. Para a gente e para os clientes. Não custa nada lembrar, as esponjas “somos nozes”. De vez em quando é legal trocar a água e o sabão. Pura questão de higiene… mental.
Rodrigo Dorfman é diretor de criação da Ana Couto