D&AD adota postura mais global

 

Reconhecido e altamente cobiçado pelo rigor em seu julgamento, sobretudo com o teor estético dos trabalhos participantes – afinal vem daí o significado de sua sigla, Design & Art Direction –, o D&AD acontece em 2014 com uma postura mais global, deixando cada vez mais a predominância anglo-saxã de lado. Se há uma década a premiação de origem britânica nascida em 1962 era quase que exclusiva para seu próprio mercado, com penetração externa basicamente oriunda de países de língua inglesa ou dos arredores europeus, o festival passa a ser mais atrativo para os chamados países em rápido crescimento – com destaque para o aumento, em todos os sentidos, da presença brasileira.

“A qualidade das inscrições internacionais deve se mostrar crescente mais uma vez. Esperamos ótimos trabalhos vindos do Brasil, da Ásia e de territórios como a Índia, a qual acreditamos estar passando por um real renascimento no momento”, exemplifica Tim Lindsay, CEO do D&AD. O executivo crê em uma grande presença brasileira na 52ª edição do prêmio, lembrando o momento eufórico que o mercado local enfrentará em 2014. “Claramente, o trabalho vindo do Brasil se mostra cada vez melhor. O empenho para o aumento da qualidade de produção dos filmes brasileiros é latente e, olhando para os últimos vencedores, podemos perceber que há algumas grandes agências liderando esse processo. Esperamos que elas encorajem as operações menores também”, complementa.

O esforço por parte da organização do evento para que a participação verde e amarela siga em alta é tão claro quanto a qualidade do trabalho local. Se em 2013 foram cinco jurados do país, sendo um presidente de júri – Alexandre Gama, presidente da Neogama/BBH e CCO global da BBH Worldwide, em Press Advertising, a edição deste ano pula para 11 participantes, sendo três presidentes: Luiz Sanches, sócio e diretor-geral de criação da AlmapBBDO, em Press Advertising; Anselmo Ramos, vice-presidente de criação da Ogilvy Brasil, no White Pencil; e Fernanda Romano, sócia e diretora de criação da Naked Brasil, em Digital Marketing. Completam a lista, como jurados, Guilherme Jahara, CCO da F.biz (Direct); Vellas, diretor de cena da Sentimental Filmes (Film Advertising Crafts); Fernando Campos, sócio e diretor de criação da Santa Clara (Integrated & Earned Media); Rui Branquinho, vice-presidente de criação da Y&R (Outdoor Advertising); Eduardo Lima, diretor-geral de criação da F/Nazca S&S (TV & Cinema Advertising); Icaro Doria, diretor-executivo de criação da Wieden+Kennedy SP (Writing for Advertising); Gustavo Piqueira, presidente da Casa Rex (Graphic Design); e Fred Saldanha, CCO da AgênciaClick Isobar (Digital Marketing).

Em 2013, o país foi o quarto mais premiado, com um total de 30 prêmios: quatro Yellow Pencils, troféu para os melhores trabalhos; oito Nominations, espécie de shortlist; e 18 In-Books, cases destacados por sua criatividade e escolhidos para integrar o anuário da competição. O D&AD entrega ainda o Black Pencil aos trabalhos de maior excelência criativa entre os Yellow Pencils – no ano passado foram apenas quatro, sendo um para “Dumb ways to die”, da McCann Melbourne para Metro Trains –, e o White Pencil, troféu dedicado a um case específico que consiga demonstrar a força da comunicação para modificar positivamente a vida das pessoas – na última edição entregue para “Help! I want to save a life”, da americana Droga5 para Help Remedies, que transformava as caixas de curativos em facilitadores para quem pretendia se tornar um doador de medula óssea. O Reino Unido foi o destaque, com 202 prêmios (17 Yellow Pencils e três Black Pencils), seguido por Estados Unidos, com 113 (13 Yellow Pencils e um White Pencil) e Austrália, com 50 (sete Yellow Pencils e um Black Pencil).

O resultado do Brasil acabou sendo o melhor da história da premiação, que no ano anterior conquistou apenas dois Yellow Pencils. Em 2013, entre os quatro “Lápis Amarelos”, dois foram para a F/Nazca S&S pela criação do comercial “Alma”, para Leica, ambos na área de Film – sendo um pela cenografia e outro pela direção de cena. Os dois demais prêmios ficaram com a AlmapBBDO, com o filme “Do amor ao bingo”, criado para a Getty Images, em Web Film; e com a Leo Burnett Tailor Made, com “Meu sangue é rubro-negro”, case para o Heboma, em Integrated.

Apesar de acreditar em um ótimo resultado brasileiro em prêmios, Lindsey não faz grandes previsões. “A coisa mais excitante no julgamento do D&AD é o inesperado”, destaca. O júri se reunirá entre 24 e 28 de março, em Londres, para avaliar os trabalhos inscritos – uma média de 20 mil, considerando as últimas edições. Os considerados In-Book e Nomination são indicados logo em seguida, enquanto os Lápis serão revelados durante a cerimônia de premiação, marcada para 22 de maio, também na capital inglesa. As inscrições, que terminariam nesta quarta-feira (29), foram estendidas até 5 de fevereiro.

Percepção brasileira

A impressão de maior recepção à comunidade global iniciada pelo D&AD nos últimos anos, deixando um pouco de lado seu ar exclusivamente britânico, também é percebida pelos brasileiros que em 2014 atuarão como presidentes de júri. “Essa presença brasileira mostra, sim, uma mudança de postura do festival, passando a ser mais internacional. Uma das críticas que eles sempre sofreram foi a de ser um evento feito por ingleses e para ingleses, o que muitas vezes afastava outros interessados. Mas eles estão mudando isso ano a ano”, avalia Anselmo Ramos, vice-presidente de criação da Ogilvy Brasil, que comandará o júri do White Pencil – que destaca a melhor ideia social de uma marca que promova uma transformação real e positiva. Ramos participou do festival como jurado há dois anos e lembra já ter começado a perceber essa mudança então.

Participante de longa data de júris dos principais festivais do mercado publicitário, Fernanda Romano, sócia e diretora de criação da Naked Brasil, presidirá o júri de Digital Marketing em 2014 – sua terceira no D&AD, sendo a primeira em 2009 e a segunda em 2011. Ela conta que, antes de sua primeira participação como jurada, foi procurada pela organização da premiação para uma pesquisa sobre como o mercado global enxergava o evento. “Eles já tinham a sensação de que o resto do mundo os considerava muito fechados, seguindo o padrão inglês – coisa que só fazia sentido para eles. Os jurados também eram em sua maioria britânicos, o que acabava gerando um resultado bem diferente daqueles vistos em outros festivais”, conta Fernanda.

Nesses últimos cinco anos, em sua opinião, já foi possível perceber uma grande evolução nesse sentido. “Eles mudaram a organização como um todo, não só aumentando a presença de jurados do resto do mundo, mas na forma de receber e olhar para essa presença como um todo. Agora existe, de fato, uma maior neutralidade nesse sentido. Antes quase todos os Lápis (troféu da premiação) eram ingleses – e mais do que isso, londrinos. Mesmo dentro da Europa, o D&AD não conseguia alcançar outros mercados com facilidade por esse motivo. Agora, eles entendem que é positivo ter entre seus participantes trabalhos do mundo inteiro – afinal, atualmente, qualquer grande trabalho, se colocado em uma língua universal e cair na internet, ganha o mundo”, salienta.

Rigor continua

O rigor na avaliação, que por muitas vezes derruba drasticamente o número de prêmios distribuídos a cada edição – e consequentemente os torna mais cobiçados pela comunidade criativa –, não deve deixar de ser a marca registrada do D&AD, mesmo com sua “internacionalização”. “O festival é regido pelos sócios de uma espécie de clube de criação, o qual idealizou o prêmio (que chega à 52ª edição em 2014). Seus líderes sempre são ingleses, pessoas criadas naquele mercado e que têm esse rigor como porta de entrada. Lá não tem choramingo ou jeitinho. Eles são muito sérios nesse sentido e, enquanto o comando do festival ficar na mão dos ingleses, tenho certeza que esse rigor será mantido”, enfatiza Fernanda.

Para ela, essa qualidade e o foco da premiação em si continuam como os principais diferenciais frente às dezenas de outros acontecimentos semelhantes na indústria da comunicação do marketing. “Vale lembrar que, hoje, prêmio e festival são coisas diferentes. Cannes, por exemplo, é muito mais do que um prêmio, passando por conteúdo, network e outras coisas. O Leão ainda é uma chancela importante, mas a celebração dos trabalhos é quase que secundária. O D&AD é um prêmio mais semelhante ao One Show, por exemplo, que é a barra de todo mundo que está competindo pelo reconhecimento criativo”, diz a sócia da Naked.

Ramos também crê na manutenção da postura. “Acho incrível a forma como eles mantêm o critério lá em cima em relação à qualidade criativa dos trabalhos. Você vê trabalhos que ganham ouro em outras premiações e que chegam lá e conseguem um In Book (presença no anuário do D&AD) – o que já é um ótimo prêmio e um fato a se comemorar”, acrescenta.

Brasil

Sobre a presença brasileira na edição deste ano, ambos os presidentes acreditam em um bom resultado para o país – em 2013, foram quatro Yellow Pencils, oito Nominations (espécie de shortlist para concorrer a um Lápis) e 18 In Books, totalizando 30 prêmios. “Acho que o Brasil vai bem sim. Foi muito bem no Cannes Lions 2013, com uma participação histórica (recorde de 115 Leões, entre eles o título de Agência do Ano para a Ogilvy), e muitas das peças premiadas lá no ano passado devem estar na edição deste ano do D&AD”, acredita Ramos. “O Brasil está amadurecendo muito em termos de ideias, com conceitos que se mostram relevantes em todas as partes do mundo, e não mais apenas no mercado local”, complementa. Um dos exemplos é “Retratos da real beleza”, criado pela própria Ogilvy para Dove e que recebeu nada menos que 19 Leões na última edição de Cannes, sendo um deles o até então inédito Grand Prix de Titanium Lions para o país – e estará entre os competidores do D&AD este ano.

“Eu gostaria muito de ver o Brasil bem representado, mandando trabalhos bacanas. O país foi muito bem em Cannes no ano passado e com trabalhos de verdade. Infelizmente, temos lá fora uma sombra que nos acompanha, uma imagem de que fazemos muito truque. E como no D&AD esse tipo de trabalho é muito difícil de se dar bem, ficaria muito feliz de ver o país passar o rodo como fez em Cannes, com cases notáveis. Isso ajudaria muito a acabar com essa fama”, ressalta Fernanda.