"Degustar um vinho é o que convence as pessoas"
Luciana Salton: o marketing da área de vinhos tem de ser muito experimental
Representante da quarta geração da família à frente da vinícola que leva seu sobrenome, Luciana Salton, diretora-executiva, fala com paixão da empresa, fundada em 1910 como um armazém de secos e molhados. Nestes mais de 100 anos, a empresa precisou inovar e adaptar-se às mudanças do mercado para sobreviver. No ano passado, investiu em novas categorias de produto, como a linha Grape Tea de chás misturados com uvas e a vodka Vorus. Confira a seguir trechos da entrevista concedida por Luciana ao PROPMARK na sede da empresa, em Bento Gonçalves (RS).
Como foi sua entrada na empresa?
Em 2017, completa dez anos que trabalho aqui. Embora eu tenha envolvimento na parte emocional com a empresa desde sempre… Meu primeiro contato com a Salton foi quando tinha 14 ou 15 anos. Eu ficava na loja, na unidade de São Paulo. Quando acabei a faculdade, trabalhei no Unibanco e na Roche e, somente depois, comecei como coordenadora de marketing. Mais tarde, de novos negócios. Em 2010, virei diretora.
Qual o diferencial da área de vinhos?
O marketing da área de vinhos tem de ser muito experimental. Conhecer e degustar um vinho é o que convence as pessoas. Por isso estamos sempre presentes em eventos. Fazer o maior número de pessoas conheçam os vinhos é a melhor maneira de divulgá-los. É dentro da taça que você vê qual é a qualidade do vinho.
Como é distribuído o investimento de marketing de Salton?
A verba varia de ano a ano. 2016 foi um ano que tivemos de desacelerar os investimentos. Um valor que é muito importante é a degustação no próprio ponto de venda. A gente sabe que pelo menos 80% do vinho consumido no Brasil é comprado no varejo. E as nossas ações vão muito de acordo com a sazonalidade. No verão, a gente degusta os sucos, os chás, os espumantes. No inverno, os vinhos. Já quando quer divulgar a vodka, a gente vai para o período da noite, na pré-balada. É um momento fundamental. Têm alguns rituais bobos que são gerados em torno do vinho em si, e a pessoa chega em frente a uma gôndola com 1.500 rótulos e como é que escolhe? A gente tenta fazer da maneira mais simples possível. Vinho precisa ser uma bebida democrática. Cada um pode gostar de um. Não tem certo e errado. Ter uma promotora que fale um pouquinho sobre a característica do vinho é um dos principais impulsionadores de venda. Sem ser isso, a gente também investe em relacionamento. Você ter um entendedor, em uma reportagem, que recomende o seu vinho também é uma chancela. A gente está falando de um público que consome dois litros de vinho por ano per capita. É muito pouco. Na Argentina, essa média é de 40 litros. O Brasil tem muito potencial para crescer. E a gente tem de tentar desmitificar. As pessoas precisam ter menos medo. Não achar que é sazonal. Só tomo vinho no frio, só bebo espumante no calor…
Vocês investem em comunicação para ajudar na desmistificação?
A gente trabalha as redes sociais, tem alguns anúncios em revistas especializadas, mas nós contamos principalmente com esse trabalho tête-à-tête. Para 2017, a gente pretende fazer um trabalho diferenciado para as pessoas verem a Salton de maneira diferente. O nosso negócio são momentos de satisfação. A gente fala que a Salton não faz vinho e espumantes, mas, sim, leva momentos de satisfação para as pessoas com experiência. Para o ano, com a nossa nova agência aqui do Sul, que é a e21, estamos bem animados.
Como foi o processo de escolha da nova agência?
Não foi uma concorrência oficial. Nós somos muito assediados por grandes empresas. E tinham três agências fazendo proposta: a Arc, que era nossa antiga agência, a Martins + Andrade e a e21. A gente escolheu eles. Estamos passando por um redesenho de nossas linhas. Queremos mostrar qual é a proposta de valor dentro de cada marca. Nós vamos fazer a construção de uma marca mãe Salton e cada linha dentro dessa empresa vai se comunicar com ela. A gente tem produtos premiums: tem o Classic, que é um dos principais e custa em torno de R$ 25; a linha Intenso; a linha Paradoxo, que é intermediária; Talento e Desejo, que custam R$ 90; e Gerações, de R$ 150. Dentro dessa grande empresa tem pequenas empresas para entregar esses produtos de boutique. Vamos definir claramente qual a posição e o que cada um desses produtos quer contar para o consumidor. A gente quer passar a marca Salton como uma segurança para o consumidor. Quando ele for a um restaurante ou a um supermercado, ele sabe que, dentro da faixa de preço que ele quer, em qualquer um dos produtos da marca Salton que levar, ele vai encontrar um perfil de vinhos adequados.
Além da marca Salton, a empresa tem outras?
Os vinhos finos levam a marca Salton. A gente tem o conhaque Presidente. Tem a vodka Vorus, que foi lançada em maio do ano passado e já teve mais de 100 mil caixas vendidas. É a terceira vodca mais vendida, nas principais redes do Brasil. Com a parceria com a e21 a gente vai trazer identidade para os produtos. Cada vez mais se fala de branded content, engajamento emocional, e com Vorus a gente achou um nicho em que as pessoas se identificam com a cultura viking. É uma atitude de braveza, valentia, não para o mal ou a briga, mas o nunca desistir, ter resiliência, persistência… A gente faz essa analogia com as pessoas que vão brigar pelos seus sonhos. O produto é muito voltado para o público jovem e estamos prevendo, em breve, algumas invasões vikings em festas, danceterias, teremos personagens interagindo com consumidores. Provavelmente em sete estados do Brasil. A gente quer trazer vida ao produto.
Como é dividido entre as categorias o consumo de vinho no Brasil?
O consumo total é de 19 milhões de litros, sendo quase 80% de tintos. Dos vinhos, o consumo da maior é de importados. E os espumantes são o oposto: quase 80% do volume consumido é de espumante brasileiro. Isso se deve muito à imagem que as pessoas têm de que o Brasil faz ótimos espumantes. Salton tem 40% do mercado brasileiro de espumantes. O clima é bom, está perfeito para acidez da uva, que vai dar um espumante fresco, jovem, aromático, agradável… Já nos vinhos tem um pouco de preconceito. Quando as pessoas provam os produtos, elas não acreditam que a gente tem capacidade de elaborar produtos desta maneira. A gente sabe que existe pouco esclarecimento com a cultura de consumo de vinho e mais ainda com a cultura do consumir vinho brasileiro. Mas é isso que a gente trabalha no dia a dia para construir esta história. Cada vez que a pessoa abre uma garrafa de vinho, a gente tem tudo isso por trás. Tem o amor, o envolvimento. Essa emoção, esse carinho que a gente tenta passar. A Salton é uma empresa muito diferenciada, não só pelo que a gente faz como marca, mas também pelo relacionamento com nossos fornecedores, pela nossa missão de criar vínculos fortes e duradores, seja com funcionários, clientes, fornecedores. A Salton tem uma alma.
Como é dividido o consumo pelas regiões do Brasil?
No Sul, o consumo é maior até por uma questão cultural. Seguido pelo Sudeste. Norte e Nordeste são bem mais baixos. Centro-Oeste consome muito destilados, principalmente conhaque.
Quantos fornecedores de uva a Salton tem?
Apenas de cinco a dez por cento das uvas que usamos são produzidas pela Salton. O resto vem de mais de 500 famílias de todo o Rio Grande do Sul. As regiões produtoras principais são Campanha, Serra e Campos de Cima da Serra.
E a Salton tem uma planta em Santana do Livramento?
Santana do Livramento, e aquela região onde a cidade fica, a chamada Campanha gaúcha, é conhecida como a Califórnia brasileira. É uma região muito promissora, pela planície, pelo solo e pela amplitude térmica. Lá é feita a vinificação primária. Em vez de fazer a viagem de toda a uva, transporta só o mosto.
Quais as outras unidades?
Além de Santana do Livramento, onde a Salton adquiriu uma área de 635 hectares em 2010, tem a principal planta em Tuiuty, distrito de Bento Gonçalves, onde é feita a vinificação, são recebidos as uvas e o mosto. Tem outra em Jarinu (SP), onde são feitos os destilados e a expedição dos vinhos, e o escritório em São Paulo. São quatro pontos.
O que é o projeto Terroir?
O projeto Terroir é a preocupação com a uva e com a conscientização dos viticultores. Ele é realizado em todas as regiões onde temos fornecedores. O objetivo é estreitar o relacionamento com os principais parceiros da vinícola e fortalecer a parceria a longo prazo.
Vocês investiram em outras categorias recentemente?
Nós sempre tivemos outras categorias. Com o conhaque, a gente tinha um consumo de estável para decadente e um consumidor envelhecendo. Então nós precisávamos de um produto que tivesse giro para esta unidade de São Paulo, que rejuvenescesse nosso consumidor. Por isso lançamos a Vorus. Economicamente para a empresa esses produtos também trazem mais fluxo de caixa. Já que para os não alcoólicos, como chás e sucos, também tem a questão da baixa tributação, que é bem menor que dos destilados, por exemplo, que pagam 30% de IPI.
E a Salton pensa em mudar a fórmula do conhaque?
O conhaque francês é de uva. A maior parte dos conhaques que a gente tem no Brasil é de gengibre, cana, extratos de ameixa… No momento, não temos nem a matéria-prima suficiente para fazer. Mas a gente prevê algumas edições especiais para os destilados e os vinhos. A gente fez uma edição limitada da safra de 2010, quando comemoramos o centenário da empresa. Na mudança, achamos uma barrica guardada havia mais de 20 anos.
Além da vodca devem ser lançados mais destilados?
Sim, ainda este ano. A gente tinha lançado uma linha de malte uísque, que estava na moda, mas a gente viu que o mercado ainda não estava tão forte. Estamos reformulando o produto. Todos os nossos lançamentos devem ser no segundo semestre.