Diamond Princess
Centenas de empresas, produtos, pessoas e acontecimentos são candidatos a serem marcas – para jamais nos esquecermos – do que vem sendo a Covid-19. Dentre todos os candidatos a marca, liderança ainda continua com o deslumbrante transatlântico Diamond Princess.
No mínimo, uma das grandes e tristes marcas. De propriedade e operado pela Princess Cruises, garrafa de champanhe quebrada em seu casco no mês de março de 2004. Tinha um irmão gêmeo − Sapphire Princess. Construídos em Nagasaki pela Mitsubishi Heavy Industries. Em verdade, o Princess é que iria se denominar Sapphire, mas, como seu irmão gêmeo pegou fogo durante a construção, optou-se por Princess.
Um certo dia o Titanic partiu com pompas e circunstâncias para sua viagem inaugural − 10 de abril de 1912, Southampton, NYC −, colidindo com um iceberg às 23h40 minutos do dia 14 de abril e afundando na madrugada do dia seguinte. O Diamond Princess partiu do Porto de Yokohama, no dia 20 de janeiro, para um roteiro que estava acostumado a fazer, diferentes portos pelo caminho, e com 3.711 pessoas a bordo.
No dia 5 de fevereiro, o mundo acorda com uma tragédia. “Dez pessoas a bordo de um navio de cruzeiro ancorado ao largo da cidade de Tokohama, próximo de Tóquio, infectadas com o novo coronavírus…”. Todos os passageiros proibidos de descer… No total foram 39 dias ancorados, centenas de histórias, fortíssimas emoções, dramas inimagináveis. Eram 2.700 passageiros e 1.011 integrantes da tripulação. De diferentes culturas e religiões, e 50 nacionalidades. Ao final, 712 contagiados, 20% das pessoas a bordo, e dessas, sete pessoas mortas.
Como é de praxe, educação e dos melhores costumes, o último a descer do Diamond Princess foi o comandante, Gennaro Arma, 25 anos de experiência, e 22 trabalhando para a Companhia Princess Cruises. Imediatamente condecorado pelo governo italiano. A liderança protagonizada por Gennaro − espetacular, segundo a manifestação dos quase náufragos contaminados − insere-se no território das mais importantes lições de Gestão de Crise de todos os tempos e no negócio de cruzeiros marítimos.
E talvez, a maior vítima do que aconteceu com o Diamond Princess tenha sido um outro navio. O MS Westerdam, que depois de uma via crucis conseguiu autorização do Camboja para atracar, tendo sido recusado antes por 4 portos – Taiwan, Filipinas, Guam e Tailândia. Portos temerosos que se repetisse o mesmo drama do Diamond Princess.
Em decorrência da coronacrise, as empresas de cruzeiros marítimos registram uma perda em seus livros da ordem de 80% de seus valores de mercado. E ainda não sabem quando poderão retomar as operações e dizer “Barcos ao Mar…”. E uma vez mais se confirma o que o mundo sabe desde séculos atrás. Um dos piores lugares para se estar quando eclode uma pandemia é num navio.
Assim, além do Diamond Princess e do MS Westerdam, outros transatlânticos viveram dramas semelhantes. E, conforme relatam os livros referentes às pandemias anteriores, foi nos navios que os vírus espalharam-se com maior velocidade. Pelo confinamento, pela utilização em comum de muitos equipamentos – de piscina a talheres e toalhas −, pelos jantares e noitadas nas boîtes a bordo… Quando se constata um primeiro caso, certamente muitos outros se manifestarão em sequência. E aí vem o drama da distância, de não poderem atracar, de permanecerem confinados em pequenos quartos, muitas vezes marido e mulher sendo separados…
No livro do historiador americano Alfred Crosby, Epidemia e Paz, 1918, o relato de navios que precisavam permanecer ao largo durante meses. Relata Crosby: “A ética não era a mesma, a quarentena consistia em dizer, morra no seu barco e não venha nos contaminar…”. Ou seja, reze sempre para jamais encontrar-se num cruzeiro, na hipótese de uma nova pandemia. E mesmo depois de superada a pandemia, as empresas de cruzeiros ainda terão uma longa jornada para resgatar a imagem da atividade. Nem todas conseguirão. Em muitas, os rombos nos cascos são definitivos.