Dispepsia crônica de informações
Se não é exatamente isso, é mais ou menos por aí.
Nilinho comia absurdamente. Aí ouvi uma história contada pelo Ronald Golias, fiz uma adaptação e disse que aconteceu com ele, mas não aconteceu. Eu disse que, depois de ele ter comido seis Big Mac, quatro tortas de maçãs e mais um milk-shake, perguntei a ele se não era a hora de enfiar o dedo na garganta e colocar tudo pra fora. E ele teria respondido: “se coubesse um dedo, comeria uma banana…”. Quando eu comecei a trabalhar com marketing, convivíamos com uma escassez crônica de dados. Tipo Regulador Xavier nº 2. Comandando o marketing do Itaú, e integrante da Comissão de Marketing Bancário da Febraban, propúnhamos, e todos concordavam, com a salutar troca de dados e informações entre os bancos. Mas, quando chegava à diretoria dos mesmos para conseguirmos a aprovação… Não!
Conclusão. Todos tinham acesso a todos os dados de todos os concorrentes. Como? Todos eram obrigados a enviar regularmente esses dados ao Banco Central. E todos recorriam aos préstimos de um simpático funcionário da instituição que vivia de xerocar e compartilhar os dados mediante simpáticos presentes mensais e de fim de ano. E todos faziam cara de bisnaga… Conto essa história para meus queridos amigos e jovens profissionais de marketing das empresas e fazem cara de inveja. Estão, literalmente, empanturrados de dados. Não sabem o que fazer com tantos dados e informações. Todos os dias batem as suas portas startups com novas métricas e registros querendo vender seus serviços e eles ainda não conseguiram dar sentido ao que compraram nos meses anteriores. Tipo Regulador Xavier nº 1.
Desculpe-me, querido leitor. Neste exato momento ia recorrer a Smokey Robinson e seu clássico The Tracks Of My Tears. Entrei num portal e lá estava a música. Primeiro verso: “People say I’m the life of the party cause I tell a joke or two”. Sentado? Tradução do portal: “As pessoas dizem que eu sou a vida do partido porque eu contar uma piada ou duas”. Segue: “Although I might be laughing loud and hearty deep inside I´m blue”. Tradução: “Embora eu possa estar rindo e entusiasta no fundo eu sou azul…”.
Voltando a Smokey Robinson e sua maravilhosa canção: “if you look closer, it’s easy to trace the tracks of my tears…”. Hoje é possível fazer-se isso 24 X 24 X 7 de todas as pessoas que estão deixando os tracks of their tears, e movimentações, e consultas, e comparações, e compras sem se precisar olhar de perto. Mesmo a milhares de quilômetros de distância é possível monitorarmos as movimentações de suspects, prospects e clients. Movimentações, objetivamente, e até mesmo registros de sintomas conclusivos. Através de satélites de baixo custo, os grandes varejistas monitoram o movimento de carros nos estacionamentos de seus concorrentes. Prognósticos sobre faturamento provável antes do fechamento de balanços são estabelecidos pela movimentação de caminhões nos pátios das fábricas.
Semanas atrás, em matéria no The Economist, a informação de que a Orbital Insight de Palo Alto, Califórnia, monitorando via satélite as áreas de cultivo agrícolas, vinha fazendo projeções mais acertadas sobre as safras que o departamento de agricultura. E que, através de fotos de satélites, empresas especializadas medindo o comprimento das sombras projetadas pelos tanques de armazenamento conseguiam determinar com precisão máxima o nível dos estoques de petróleo…
É só o começo. Você não vê porque os dados trafegam no digital e não formam fila na porta da fábrica, mas, neste exato momento em que você me lê, existem toneladas de dados tentando despertar a atenção, interesse e compras de todas as áreas das empresas, muito especialmente do marketing. Socorro! Dispepsia crônica de informações causando perplexidade patogênica e paralisadora. Objetivamente, informação bruta abunda, sobra, derrama, vaza. Virou commodity. Agora chegou a hora dessa gente bronzeada e inteligente mostrar seu valor. O segredo não é dispor dos dados. É que decisões tomar a partir dos dados; e, de quais dados. Todo o mais é cascalho, detrito, entulho.
Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing