É pra casar ou pra “ficar”?

O mercado de comunicação e marketing e as relações entre clientes, agências, veículos e plataformas parece um céu cheio de nuvens: cada hora que você olha está diferente. O certo é que são cada vez mais raros os dias de céu de brigadeiro.

Ao contrário: o que mais vemos são nuvens pesadas, que se transformam em tempestades como tardes de verão. Isso não ocorre só com o nosso mercado, é verdade.

Essa inconstância é o novo normal no ambiente de negócios, não importando o setor. Quem se dispõe a administrar negócios nesse ambiente mutante e volúvel precisa ter desapego com modelos de atuação.

O que funcionou ontem pode não funcionar amanhã. É preciso ter um radar ligado todo o tempo, captando as mudanças e, o mais difícil, ter o discernimento quanto ao tipo e o momento da mudança.

Essa minha reflexão foi motivada por informações contraditórias que recebi recentemente, de fontes diferentes. Uma delas, vinda de um líder do setor de gestão de projetos, dá conta de que, nos EUA, mais de metade dos contratos entre clientes e agências tem se dado por projeto – ou por job. Ou seja, o cliente prefere contratar agências para projetos específicos, evitando um relacionamento mais contínuo e duradouro.

Prefere “ficar” com uma e com outra a casar. Esse tipo de relacionamento já é realidade no mercado brasileiro de live marketing e em outras modalidades de serviços de marketing. Mas, para a gestão de contas publicitárias, o que prevalece é um contrato que extrapola um job ou um projeto específico.

Se estivessem num ambiente de redes sociais, o cliente e a agência se diriam estar num “relacionamento sério”. Pode não ser casamento, mas existe um vínculo mais forte, enquanto dure.

Aí me deparo com duas matérias, uma da Marketing Week e outra da Advertising Age, que chegaram até mim pela curadoria do Cenp (Conteúdos Cenp), numa newslettersob título A reinvenção da roda. A matéria da Ad Age, sob título P&G’S new agency model tests the limits of cross-shop collaboration (Novo modelo de agência da P&G testa os limites de serviço colaborativo).

Sem dúvida, o modelo adotado por Marc Pritchard e sua turma do marketing da Procter & Gamble, maior anunciante mundial, chama a atenção pela ousadia de colocar diversas agências trabalhando juntas para o cliente e ainda contando com uma complementação in-house de compra de mídia.

Chamada de Woven (Tecido), a “agência” desenvolve trabalhos para a divisão de produtos dedicados ao cuidado com tecidos (Tide e outros). O desafio está em reunir dois grupos rivais (Publicis e WPP), juntando 3 agências top (Grey, Leo Burnett e Saatchi & Saatchi) embaixo do mesmo teto e com executivos rivais sentando lado a lado para gerar campanhas para os produtos da P&G.

E ainda tem a estrutura in-house da empresa (apoiada pela Carat, da Dentsu Aegis) para comprar mídia. Se no início deste texto eu usei a figura do casamento para tratar da relação entre cliente e agência, neste caso é poliamor. O cliente gostosão P&G mantém dentro de casa 3 agências sexies para lhe servir. Será que vai dar certo?

No seu harém de agências, será que o cliente não vai ter sua preferida, provocando ciúmes nas demais? Vamos acompanhar… Como contraponto, tem a matéria da britânica Marketing Week.

Essa trata de uma união feliz e monogâmica entre a grande varejista ASDA (terceira rede de autosserviço do Reino Unido) e a AMV BBDO (agência do ano no Cannes Lions 2018). Trata-se de um contrato à moda antiga, com a agência sendo responsável por toda a propaganda do cliente – criação e mídia –, inclusive administrando serviços de terceiros.

A união já completou um ano e o cliente e a agência parecem estar ainda em lua de mel. Esses casos antagônicos refletem a dificuldade em se identificar um modelo de relacionamento ideal entre clientes e agências. Afinal, o ideal é casar e ser feliz para sempre ou trocar de parceira (o) como se troca de roupa?

Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional das Agências de Propaganda) (alexis@fenapro.org.br)