Editorial: O que nos espera
Estamos redigindo este editorial na tarde de sexta (24), com as pesquisas apontando a reeleição da presidente Dilma Rousseff.
Como elas erraram no primeiro turno, provocando uma apressada conta de chegar nas horas que antecederam o pleito, é possível que o mesmo ocorra neste domingo.
Tudo é possível em um país que não se cansa de desafiar a lógica, contrariar a razão e se emocionar mais com o resultado de um jogo de futebol do que com o futuro próximo do seu povo.
Mantendo a ilusão de uma subvenção aos mais necessitados, que eterniza o círculo vicioso do “papai faz pra você”, sem produzir vencedores, o atual establishment governista conquista as massas para prosseguir no poder.
Se essa conquista fosse benéfica e partisse do pressuposto que se governa para todos e não apenas para uma parte da população, seria por certo aplaudida até pelos hoje adversários, que, aliás, não formariam um contingente tão numeroso, dividindo o país.
Mas, choca mais o que nos espera, confirmando-se as pesquisas válidas até esta sexta-feira. Prevemos mais inflação – o maior imposto sobre os assalariados –, maior descontrole das contas públicas, maior avanço no dinheiro da União e o seu mau exemplo prosperando entre a população, com boa parcela – rica, classe média ou pobre – passando a crer que o crime compensa.
Quanto à imprensa – este é um jornal especializado que completará 50 anos de circulação ininterrupta no próximo mês de maio –, a maior fatia do bolo de maldades estará a ela reservada, como alguns sinais já foram emitidos na campanha eleitoral.
A ideia fixa de reduzir o poder econômico da mídia – que não é nova nem aqui, nem em parte alguma do planeta onde impera o populismo – embute disfarçadamente (por enquanto) outra ideia fixa: a de controlar o conteúdo dessa mesma mídia, como tantos na História já fizeram, embora seus governados não acreditassem. Exatamente como aqui.
É só observar a cantilena de diversos líderes do Partido que hoje nos governa, com destaque – até surpreendente, porque ele é um produto da mídia e somos testemunhas oculares desse digamos fenômeno midiático – para o ex-presidente Lula da Silva, rancoroso na qualificação de partido político com que costuma adjetivar essa mesma mídia que o ajudou a se transformar em um dos maiores líderes nacionais de todos os tempos.
Mas, o que nos espera é muito mais do que o controle da mídia e as três ou quatro ações que acima relacionamos.
O que nos espera – e não merecemos isso – é o confronto tramado sob medida pelos atuais detentores do poder, entre pobres e ricos, desfigurando um país que distribui oportunidades a todos, embora nem todos tenham condições de aproveitá-las, provavelmente pela falta de melhor orientação oficial a respeito.
Para incendiar, a fim de atingir objetivos inescrupulosos, é sempre melhor jogar gasolina do que água sobre a população, mesmo em época de seca prolongada como agora, calculada e absurdamente usada contra governos da sigla adversária, como ocorre em São Paulo.
As viúvas de Marx, Lenin e Stalin estão esfregando as mãos de contentamento pelo que está para acontecer em um país que, como reproduzimos nesta página em Frases recentemente, não perde a oportunidade de perder oportunidades.
Há um contingente de fanáticos à espreita, esperando o endosso das urnas para fazer o calendário girar de volta ao passado, sem levar em conta que as experiências mais à esquerda produziram fracassos retumbantes e substituíram as castas até então dominantes por outras, mais onerosas e raivosas.
Dividir para governar é o seu lema. As advertências de Maquiavel mudaram de mãos e agora são aproveitadas pelos novos ricos da política, que se saciam à vontade sobre o PIB nacional.
Lamentamos os que se deixam levar por essa onda, verdadeira máquina de produzir mentiras segundo os clássicos da História. Não são, porém, culpados. Culpados somos todos aqueles que não conseguimos antever – embora tudo indicasse para isso – onde poderíamos chegar.
Como bem disse o festejado Marcello Serpa, exemplo de empresário, profissional e cidadão, em seu artigo no Facebook e no online do propmark (22/10): “Caímos na armadilha da culpa. O Partido, Lula, Dilma e seu marqueteiro sabem como ninguém manipular a culpa que boa parte dos empresários, artistas, educadores, intelectuais, estudantes que justamente por serem conscientes e esclarecidos sentem. Culpa pelas desgraças sociais do Brasil e por serem parte dessa elite demonizada pelo PT por tanto tempo. Estamos novamente anestesiados. Junho de 2013 foi um espasmo de consciência de uma maioria. Todos os estratos sociais foram às ruas como nunca antes neste país. Lula sumiu. Dilma piscou e Brasília tremeu. Mas, ao ver uma indignação justa aos poucos se transformar em apenas uma baderna/midiática/black bloc, essa maioria assustou. Com medo voltou aos poucos à sonolenta e preguiçosa indignação de sofá. E assim, de Rivotril em Rivotril, vamos sucumbindo e ruminando em direção a mais um governo que não permite o contraditório, a contestação. Um governo extremamente autoritário e manipulador no seu discurso de ódio e divisão. O discurso ainda vai virar ação, falta pouco”.
N. da R.: Este editorial foi redigido, repetimos, na tarde da última sexta-feira (24).
* Este editorial foi publicado na edição impressa do propmark de 27 de outubro de 2014