Editorial: Válvula de escape
Têm aparecido nos últimos dias, através da publicidade, o BNDES, a Odebrecht, a Petrobras e outras empresas que talvez aprendam que a propaganda pode ajudá-las nesta tormenta, mas que o melhor mesmo teria sido evitar se envolverem com atos ilegais.
Principalmente – se é que assim pode ser dito – com o lado obscuro de políticos sem escrúpulos, capazes de tudo e mais um pouco para se manterem no poder.
E, para isso, usam não apenas empresas ricas, como também a parte mais pobre da população brasileira, alardeando sua defesa contra as elites desonestas (sic) e prometendo-lhe uma condição de vida melhor, uma farsa como se vê diante do aumento dos miseráveis em todas as grandes cidades do país.
Basta ao leitor – se preciso for – olhar à sua frente e em volta, para verificar que o que mais cresce no país, junto com a corrupção endêmica e diretamente proporcional a isso, é a pobreza em seu sentido mais amplo.
Pena que a velhacaria dos nossos dirigentes políticos dificilmente retroagirá, pois nossas leis são brandas, possibilitando julgamentos com resultados incompatíveis com o grau de safadeza cometido.
E, para sorte dos malfeitores – que formam, eles sim, a verdadeira elite privilegiada do país –, o escândalo Fifa passou a ocupar a atenção da opinião pública brasileira tendo em vista sua devoção ao futebol, também uma válvula de escape para o nosso cotidiano.
Observe o leitor como o modus operandi Fifa e CBF, além de outras entidades congêneres espalhadas pelo mundo, assemelha-se ao praticado no mensalão e no petrolão, com farta distribuição de propinas para todos os gostos e formas de ganância.
2. Enquanto isso, os competentes, porém péssimos comunicadores, Nelson Barbosa e Joaquim Levy, esforçam-se em busca do reequilíbrio das contas oficiais, deixando de lado a lição dos tempos de que a pressa é inimiga da perfeição.
Esses mestres deveriam levar em conta que os números do governo não podem se sobrepor às necessidades e luta pela sobrevivência das pessoas físicas e jurídicas do país. O raciocínio é simples: são estas no curto prazo que alimentam aqueles números.
Curiosamente, a inversão dessa prioridade tem causado uma incompreensível e até digamos infantil queixa dessas autoridades: o governo está arrecadando menos.
Oras, se todos os players do país desceram vários degraus na sua escala econômica, como não esperar por uma arrecadação fiscal menor?
Se os doutores que reclamam fossem mágicos, agradeceríamos suas mágicas invertendo esse processo: menos produção, menos negócios, mais tributos nas burras oficiais.
Na verdade, e por falar em burras, os burros devemos ser nós, o povo, que ainda acreditamos, por menor que seja essa crença, no trabalho e nos resultados a longuíssimo prazo que suas excelências prometem.
Alheia a esse quadro desanimador, nossa presidente da República deu agora para passear de bicicleta, sob a alegação de que isso faz bem para a saúde. É provável que faça, mas melhoraria a saúde dos brasileiros se as fotos diárias nos jornais estampassem a presidente às voltas com pilhas de pastas e papéis em sua mesa de trabalho, com os ministros à sua volta procurando rápidas soluções para sairmos dessa crise que, no seu longo prazo de duração diagnosticado pelos doutores em Economia do governo federal, poderá ao seu fim nos deparar com todos mortos, parodiando Keynes.
Por outro lado, a presidente Dilma Rousseff não deve ter se dado conta de que, no imaginário popular, pode estar relembrando Collor de Mello, com suas bravatas esportivas enquanto durou presidente da República.
3. A propósito, já tem gente culta na população brasileira apostando que está em vigor nas hostes oficiais a política do quanto pior, melhor.
Porque, piorando ainda mais, serão criadas condições ideais para os salvadores da pátria se apresentarem em troca de maior poder ou de permanência mais prolongada no seu desfrute.
Pode ser apenas obra da imaginação de alguns sofredores que jamais viram o Brasil tão esfacelado, ou, melhor dizendo, o seu povo tão abatido diante de uma crise para a qual não colaborou e cujo preço, mesmo que se disponha a pagar, como se dispôs, é alto demais para as suas possibilidades.
*Presidente da Editora Referência, que edita o jornal propmark e as revistas Propaganda e Marketing