Em busca das boas ideias em Direct
Em 2012, o Brasil teve um desempenho em Direct Lions inferior ao de 2011 (quando conquistou dez Leões), mas não deixou a desejar. Com uma performance elogiada pelos jurados, levou para casa cinco Leões, com destaque para a prata por “Recibo com receita”, da Ogilvy para a Hellmann´s – peça que também ganhou ouro em Promo & Activation. Além da prata, foram conquistados quatro Leões de bronze, com três trabalhos da DM9DDB e outro da Age Isobar. Representante do Brasil na área, Marcio Salem, presidente e diretor de criação da Salem, acompanha a evolução de Direct desde seu primeiro ano, quando atuou como jurado. Em 2008 voltou ao júri da área, mas no posto de presidente. O executivo é enfático ao afirmar que priorizará as grandes ideias, independentemente do resultado, e garante: falta pouco para o país conquistar um GP na área.
Lembranças
“Vou ao festival há muito tempo, acho que há uns 15 anos. A primeira lembrança que me vem à mente quando penso em Cannes tem a ver com as visitas que eu fazia bem no início, para ver de perto as campanhas, ouvir as palestras e acompanhar tudo que fosse possível. No começo, quando só tinha filme e mídia impressa, ia para ver as peças e me inspirar. Com o tempo, eles começaram a incluir outras áreas e a grande mudança, na minha opinião, foi quando inauguraram Direct, em 2002. A Salem, apesar de ser uma agência completa, tem origem no marketing direto e é muito forte nesse segmento. Por isso, a chegada da área foi vista com bons olhos por nós. Para a minha sorte, fui convidado para ser jurado logo no primeiro ano, em uma época em que ainda estávamos tentando definir o formato que a área teria. Depois disso, continuei participando, inscrevendo peças e ganhando Leões. Tempos depois, em 2008, tive a enorme surpresa de ser convidado para ser presidente do júri. Foi muito exaustivo, eu precisava coordenar 32 jurados de diversos países, com pronúncias de inglês diferentes e pensamentos diferentes. Mas foi absolutamente incrível. Quando saí de lá, pensei: ‘Bom, agora acabou. Minha participação como jurado ou presidente é finita’. Mas, novamente, fui pego de surpresa pelo convite de ser jurado da edição de 60 anos do festival, e não poderia estar mais feliz. Realmente achei que não faria mais parte do júri, pelo menos em Direct. O legal é que houve um espaço entre essas participações, então pude me reciclar e poderei levar novas ideias e um novo olhar ao julgamento. Para falar bem a verdade, acho que gosto mais de participar e acompanhar o festival como espectador do que como jurado, pois tenho mais tempo para viver aquilo tudo. Mas, é claro, recebo com muita felicidade o que vier.”
Preparação
“O convite deste ano veio em um momento único, no qual a Salem está passando por adaptações e se tornando uma agência mais completa. Ainda não tive contato com os jurados brasileiros dos anos anteriores, mas pretendo falar com alguns. Vejo que minha visão sobre ser jurado mudou com os anos. Na primeira vez, ficava preocupadíssimo em como iria avaliar as peças, o que iria dizer e fazer, o que iriam pensar de mim. Dessa vez vou tranquilo. Quero fazer meu trabalho bem feito, mas com calma, curtindo as peças e lidando com o processo com mais leveza. Não dou a menor importância para o glamour de fazer parte do júri. O meu barato é poder ver de perto as peças e ter contato com grandes profissionais.”
Vantagens e desvantagens
“Acho muito positiva a transição do festival, que antes era mais restrito à publicidade, para um evento da comunicação. Essa mudança foi natural, acompanhou as mudanças do mundo e dos anunciantes. Seria até estranho que Cannes se mantivesse fechado em um mundo em que a multidisciplinaridade das ferramentas de comunicação é o principal assunto de hoje. Por outro lado, sinto que algumas áreas não têm personalidade, como é o caso de Direct. Acho que ela se misturou muito com digital, com promoção e com mídia, e acabou perdendo um pouco da sua essência. Algumas se mantêm fiéis, como mídia impressa, filme, spot e design, mas outras são áreas amorfas. O ideal seria que o festival pensasse integrado, como já vem fazendo, mas que soubesse reconhecer a essência de cada área. Acho que essa divisão mais clara motivaria muito mais as inscrições em cada competição.”
Critérios
“Para ser sincero, acho a avaliação de resultados uma parte muito chata do julgamento. As pessoas estão em Cannes em busca de boas ideias. Uma campanha pode ser corretíssima, ter dado ótimos resultados, mas, sem uma grande ideia por trás, não me conquista. Eu vou buscar apenas boas ideias. É claro que elas precisam ter resultado, mas esse não é meu foco. No final das contas, o que fica na cabeça das pessoas e se torna inesquecível é a ideia.”
Concorrência
“Gosto dos trabalhos da Inglaterra, que têm uma sutileza no humor e uma perspicácia. Também gosto de campanhas da Austrália, dos Estados Unidos, da França, da Espanha e da Argentina.”
Brasil
“Acho que o Brasil terá um bom desempenho este ano. O legal é que todas as agências inscrevem em Direct, não só as especializadas. Isso traz uma garra de participar e ganhar e, com isso, felizmente, o nível criativo se eleva. Estou muito otimista e com grandes expectativas, pois sei que vou encontrar peças da AlmapBBDO, da F/Nazca S&S, da DM9DDB e de todas as agências que respeito e que são ótimas. Aliás, o Brasil terá um bom desempenho em várias áreas, não só Direct. Já somos um país muito premiado, com dois GPs maravilhosos em Press. Acho que, em breve, virá um GP para o Brasil em Direct.”
Trabalhos memoráveis
“Adorei um case do ano passado, no qual um idoso recebia um ingresso para um show de rock, mas, caso um jovem o ensinasse a utilizar a internet, ele ganhava esse ingresso como recompensa. Também gosto muito do supermercado na estação de metrô, da Coreia do Sul (GP do Media Lions em 2011), e de uma campanha da Unicef que materializava doações em camisetas. Por exemplo, quem ajudava a combater a dengue comprava uma camiseta por 20 reais com o desenho do mosquito. Teve um doador que comprou um avião para ajudar crianças necessitadas e ganhou uma camiseta com um avião. Achei lindo. Também adorei “Recibo com receita”, da Ogilvy brasileira para Hellman´s. Achei uma ideia inteligentíssima e simples. Sou fã de ideias criativas e diferentes.”
Participação
“Infelizmente, não dá tempo de ver e estudar tudo o que gostaria. Na agência tenho o costume de selecionar algumas peças para os criativos apresentarem aos clientes, mas nunca consigo ver todas. É muita coisa. Quando estou lá, se estou vendo um filme, sei que já perdi algum shortlist ou alguma palestra. E ainda tem as premiações à noite. É uma loucura. Gostaria de ter tempo para ver todas as campanhas e parabenizar os responsáveis por elas. Não tenho ego do tipo ‘se não é meu trabalho, não valorizo’. Eu aplaudo as agências brasileiras merecedoras, porque isso me alimenta. Quando você está aberto, essas inspirações voltam para você.”
Marketing direto
“A concorrência por atenção do público é geral, inclusive na mídia dirigida. A gente precisa encantar o consumidor no momento em que ele tem contato com a peça. Não acho que só porque é uma peça de marketing direto que você já retém a atenção da pessoa. Eu posso estar falando com você e olhando para você, mas você pode estar pensando em outra coisa, por exemplo. É preciso conquistar essa atenção. Sempre encho o saco dos meus criativos e de mim mesmo para sempre ter uma boa ideia, independentemente de ser para uma peça de varejo ou para apresentar uma nova solução de tecnologia. Quando existe uma boa ideia, ela tem eco, é comentada, gera repercussão. Outra coisa importante é saber qual o perfil da pessoa que se quer atingir, senão todo o trabalho é em vão. Quando o cliente souber com quem quer falar, deve investir no meio mais próximo de interação com essa pessoa. Se juntarmos tudo isso, é muito mais fácil obter a resposta esperada.”
Ferramentas
“Acho que a febre do digital já passou. Hoje, clientes voltam a analisar todas as ferramentas com equilíbrio. Eles sabem que um e-mail, por exemplo, é muito vulnerável, ninguém mais dá atenção. Por outro lado, um e-mail casado com uma ação legal é ótimo. A solução é pensar na melhor forma de abordar. O digital não é barato, barato é receber a resposta que se quer pelo menor preço. O barato de economizar não é barato de verdade, porque pode por tudo a perder.”
Lazer
“Sou um CDF, careta mesmo, assumo. Vou ao festival para ver o festival. Acordo cedo e aproveito ao máximo. Mas é óbvio que, estando em um lugar maravilhoso como a França, tento fazer alguma coisa antes de tudo começar ou depois, para não perder nada. Gosto de passear nas cidades lindas que ficam ao redor, como Saint-Paul de Vence e Mônaco. Adoro jantar em lugares legais, sempre que posso me dou esse privilégio – acompanhado ou não. Sou apenas avesso aos points da cidade. Não sou contra, mas não aproveito o festival dessa forma.”
Salem por Salem
“Sou muito família, amo ficar com meus quatro filhos e com minha mulher, e um apaixonado por cinema. Também sou um curioso, o que reflete no meu trabalho criativo. Gosto de ouvir as histórias das pessoas e de falar com elas. Gosto de ouvir o cliente e de dar soluções ao seu problema. Eu me definiria como um interessado em ouvir e criar em função do que ouvi.”