Em meio à pandemia, uma... língua!
Parou as redações, ainda que por poucos momentos. Mas, parou. Mais que na hora de mostrar essa língua de 50 anos para o coronavírus… Em tempo, Andy Warhol passou perto, mas jamais colocou a mão na língua…
Em meio à coronacrise, onde a única vacina comprovadamente eficaz e existente era a máscara, além, claro, de uma comunicação de excepcional qualidade e capaz de mobilizar as pessoas, coisa que definitivamente não aconteceu em nosso país, muito especialmente em São Paulo pela bateção de cabeça infernal e patética de João e Bruno, uma língua com 50 anos de idade ocupou a cena, ainda que por poucos dias. Todos muito nervosos e apavorados. A língua vermelha, espichada, boca a fora, concebida no mês de abril de 1970 – 50 anos – para ilustrar o cartaz da turnê dos Rolling Stones.
Um dia toca o telefone do Royal College of Art. Era a assistente do empresário do conjunto de rock Rolling Stones. Diz o assistente: “Estamos precisando de uma indicação de um designer para criar o cartaz da turnê pela Europa de uma banda de música… o nome, sim, Rolling Stones…”. Dias depois… “É do escritório do Rolling Stones? Foi daí que pediram uma indicação de designer? Estamos indicando o John Pasche… um jovem e talentoso artista de 24 anos…”.
Na semana seguinte Pasche encontra-se com Mick Jagger. Recebe o briefing e marcam uma segunda reunião para dali a uma semana. Pasche chega com duas dúzias de sugestões. Jagger recusa todas, mas, estimula… “tem algumas boas ideias, mas, por favor, tente um pouco mais…”.
Na semana seguinte Pasche volta e Jagger escolhe uma língua saindo de uma boca. E pede pequenas modificações. E a partir daí provas, idas e vindas, um pedido adicional de adaptação para aplicação na capa de um programa…
Numa terceira reunião, diante de uma língua saindo de uma boca, mas, ainda originalmente, em preto e branco, Jagger mostrou para Pasche a ilustração da divindade hindu Kali, também com uma língua saindo pela boca… Gesto típico, segundo Pasche, das divindades e das crianças. Jagger bateu o martelo! Antes do Natal de 1970, a língua mais vista, publicada e comentada da história moderna estava finalizada, pronta e aprovada.
Faltava definir a data de seu lançamento.
Abril de 1971, álbum Sticky Fingers – a língua faz, finalmente, seu debut. O álbum seria lançado na sequência nos Estados Unidos, e, naquele momento, decidiu-se mandar uma versão oficial da língua via fax. Ao receber o fax, razoavelmente borrado, Craig Braun, que trabalhava com Andy Wharol, decidiu dar uma arrumada.
E, ao arrumar, não deixou de proceder a pequenas e relevantes modificações. Alongou a língua e colocou pequenos detalhes adicionais. E essa versão converteu-se na versão oficial da língua mais famosa e publicada dos tempos modernos.
A única capaz de parar as redações, dar uma pausa nas matérias sobre o coronavírus, 50 anos depois, para falar dela, da língua. John Pasche recebeu 50 libras por seu trabalho, e, no fim do primeiro ano, um bônus de performance de 200 libras. A partir de 1976, com o sucesso da língua, assina um contrato sobre a venda de merchandising e passa a receber 10% do total das vendas líquidas. Durante 12 anos ganhou um bom dinheiro e, diante de uma proposta irrecusável da banda, vendeu seus direitos autorais sobre a língua.
Essa língua. Que, repito, 50 anos depois, continua parando as redações e mexendo com o mundo. Mais que na hora de mostrar a língua para a Covid-19 para que desapareça e nos devolva a paz. Já que a economia vamos levar alguns anos para recuperar.