Emicida: "A publicidade do nosso país não é um espelho fiel do que é a calçada dele"
Emicida no lançamento de coleção feita com a Imaginarium
“É que tem gente que quando pega a mão da gente/ Faz a gente querer que o tempo pare/ Que dure eternamente/ É tão gostoso, tão doce, tão quente/ Tão doido, isso é tão a gente”
O trecho faz parte da música “Mil Coisas”, feita por Emicida especialmente para uma parceria com a Imaginarium. O artista, por meio da Laboratório Fantasma, marca criada ao lado do seu irmão, Fióti, assina uma coleção com a empresa de fun design.
A collab resultou em cinco peças para o Dia dos Namorados e o lançamento aconteceu na última quarta-feira (22), em São Paulo. O evento teve parceria com as marcas Doritos, Budweiser e Smirnoff Tônica.
Emicida apresentou a música com participação de Drik Barbosa. Antes, o rapper conversou com o PROPMARK sobre seus critérios para aceitar uma parceria, o seu envolvimento em cada projeto e sua visão sobre a representatividade na publicidade. Acompanhe a entrevista exclusiva.
CRITÉRIOS
Não só nesse episódio da Imaginarium, mas todas as vezes que a gente se relaciona com uma marca a gente busca quem fazer parte do nosso dia a dia. No meu entender e para a Laboratório Fantasma, as coisas precisam partir de um ponto verdadeiro. A gente é convidado para N projetos, mas nem todos eles fazem parte da nossa rotina. E acredito muito que o fã, o consumidor e todas as pessoas que se conectam com isso sentem essa verdade. Então a primeira coisa é partir de um ponto verdadeiro. Depois disso a gente senta junto e conversa sobre que tipo de história a gente vai contar e o que a marca precisa comunicar. Essa é a minha parte favorita do processo. Minha parada é contar história. Com o passar do tempo eu fui desenvolvendo uma sensibilidade muito maior para contar histórias que não são necessariamente a minha mas se encaixam na minha.
IMAGINARIUM
Foi bem bacana ter colado com o pessoal da Imaginarium. Eles terem refletido e sugerido de falar de amor no ambiente urbano, essa coisa de como a gente consegue criar uma atmosgfera musical que faça justiça ao que a Imaginarium tenta fazer na vida das pessoas, que é presentear de uma forma inusitada. Naquele presente as pessoas reconhecem a sua própria personalidade: ‘isso é muito eu’. É mais que um produto. Se não for isso aí, não conecta a nada, é só um plástico e não tem história para contar. E o que move o mundo são as histórias. O pessoal que trabalha na criação da LAB, tenho que agradecer a Deus pelo time inteiro, porque a equipe é muito sagaz. A gente foi desenvolvendo um modus operandi de captar os caminhos.
ENVOLVIMENTO
Me envolvo com tudo. Tem gente que solta, que se atrela a marca e não põe a mão. Eu acho que precisa ter a minha voz e minha visão, por isso eu gosto de acompanhar mais de perto. Não gostaria que as pessoas simplesmente se conectassem com algo que usa meu nome. Acho que quando as pessoas ouvem a música, vestem a camiseta ou colocam o boné, elas estão corroborando com um certo estilo de vida, visão de mundo. E para que tudo que a gente crie esteja nessa visão de mundo eu gosto muito de estar muito perto. Fora que me formei em Design e não trabalhei com isso direito, é minha chance de executar um pouco esse lado.
IFOOD
Uma parada muito legal foi que durante o desenvolvimento. Tenho vários irmãos que são motoboys, que ficam na rua o dia inteiro, fazendo o corre deles. E teve uma pesquisa do iFood mostrando que a rapaziada se identificava com a gente e indicaram a gente para fazer um som em homenagem a eles. Isso foi gratificante para caramba. É muito bacana quando você percebe que sua música conversa com várias pessoas que tem a mesma origem que você. Principalmente agora quase 15 anos depois de ter começado a ficar famoso esse tipo de coisa é muito gratificante. Fomos filmar num escadão no Centro de São Paulo. A gente estava filmando com quatro ou cinco motoboys e aí começa a parar outros e de repente ficou lotado. Mas aquela parada é tão real para a vida deles que eles param lá também. É a história de vida deles. Não foi em vão.
REPRESENTATIVIDADE
A gente ainda tem uma caminhada longa no sentido da representatividade da trilhagem que a gente trabalha e a gente ajuda a construir isso de alguma forma. Mas ainda estamos bem distantes do ideal. E isso não tem a ver simplesmente com a cultura hip hop, mas com representatividade feminina, LGBT… Infelizmente a publicidade do nosso país não é um espelho fiel do que é a calçada do nosso país, assim como a moda também não é. A gente trabalha justamente para mostrar que cada vez que a gente dá um passo o quão essa visão de sociedade brasileira é obsoleta. E ela ainda é muito presente na publicidade brasileira. Isso precisa mudar.
MIL COISAS
Criamos a música para essa parceria, partimos do zero. Eu componho muito, só hoje fiz quatro músicas, mas nenhuma ficou legal. Todo mundo tem isso [de achar que não ficou legal]. Uma vez o J. R. Duran me falou ‘Sabe qual a diferença do fotógrafo ruim e do fotógrafo bom? O bom só mostra o que ele acerta.’ Isso vale para tudo.
COMPOR
Para mim é mais difícil compor no dia a dia. Com uma meta final, em que precisar falar disso, é mais fácil. A gente se encontra e se desencontra do caminho muito mais pela forma do que pela necessidade. Isso é um pouco mais simples de fazer. Não são coisas muito extensas. Quando eu penso nas minhas músicas tenho que pensar muito em quando comecei e nas reticências. Tem que fazer uma reflexão de tudo que já falei e do que eu gostaria de falar para o mundo agora.
DRIK BARBOSA
Gosto demais de trabalhar com ela. Ela é muito sensível e muito sagaz. Ela olha as paradas e sabe o que fazer. Pelé e Garrincha: tocou, tocou, tocou e gol.
AMOR
A coisa que foi especial é porque eu tenho muito esse exercício de sair desse lugar comum que a gente vai parar as vezes. As pessoas imaginam que a gente, mesmo depois do sucesso de músicas como ‘Passarinhos’ e ‘Madagascar’, só fala de coisas sérias e muito densas. Mas essa música [Mil Coisas] fala de coisas sérias, o amor é uma coisa séria. Encontrar alguém com quem você se sinta completo é uma coisa séria, as pessoas às vezes passam a vida inteira tentando e não encontram. Entendo isso como um tema grandioso.
Drik Barbosa e Emicida na apresentação da música “Mil Coisas”