Entretenimento pode determinar nova era de ouro para publicidade

Divulgação

O brasileiro PJ Pereira estuda há dez anos como o entretenimento pode criar sinergias para atrair os consumidores para as propostas de comunicação

Sócio, CCO e fundador da Pereira O’Dell, que tem sede em São Francisco, nos Estados Unidos, o brasileiro PJ Pereira vai ser o presidente da competição Entertainment Lions do Festival Internacional de Criatividade de Cannes. Esta área está agendada para ser realizada nos dias 21 e 22 de junho como parte do evento que tem início no dia 17 e se estende até o dia 24, na Riviera Francesa

Há cerca de 15 anos trabalhando nos EUA, PJ se tornou autoridade no aproveitamento mercadológico do entretenimento e como pode ajudar marcas, produtos e serviços na interação com consumidores e construir branding. O entretenimento como linguagem tem garantido a PJ premiações importantes. O projeto The Beauty Inside, para a Intel Toshiba, foi distinguido com três Grands Prix no Cannes Lions 2013 (Cyber, Film e Branded Content), além de ser o primeiro trabalho de publicidade a receber um Emmy.

No ano passado, PJ proferiu uma concorrida palestra sob o tema We need a new pact, como parte do Entertainment Lions, festival paralelo ao Cannes Lions, assim como o Health Lions e o Innovation Lions. A Fox 2000 Pictures comprou os direitos para transformar o The Beauty Inside em longa-metragem em Hollywood. O projeto será estrelado por Emilia Clarke, a mesma de Game of Thrones. PJ escreveu a trilogia Deuses de dois mundos.

“Precisamos pensar como quem pensa numa série. Depois da primeira temporada, do primeiro livro, o que vem? Algo que reforça a primeira ideia. Mas, principalmente, se quisermos inventar algo novo, precisamos parar de tentar reinventar a roda todo dia”, diz ele, que acrescenta: “O balanço entre os interesses da marca e da audiência é a porta de entrada. Sem isso, não existe mais nada. Mas há um outro ponto fundamental, que são os interesses dos artistas. Ideias poderosas, com personagens e arcos interessantes, são o que a classe artística procura para expressar seus talentos. Se a propaganda se tornar um caminho para isso, eles vêm junto, com o maior prazer, e trazem com eles sua audiência. Parece que tudo fica cada vez mais complicado, certo? Mas há um truque que faz com que funcione: transformar a marca em personagens”.

Por que o entretenimento é essencial na comunicação de hoje? PJ responde. “Existe uma geração inteira de crianças hoje que não assiste televisão. Todo o consumo de entretenimento e informação deles é on demand. Para eles, a ideia de alguém entrando para interromper a programação para tentar vender um produto é um absurdo, então temos de encontrar novas maneiras, que façam com que as mensagens de marcas sejam parte do conteúdo que eles irão querer consumir. É mais complicado, porque sobem os parâmetros criativos, mas pode determinar a nova era de ouro da propaganda se abraçarmos a causa em vez de resistir”.

Os executivos de marketing podem ponderar que crianças não são consumidoras, especialmente em um cenário de crise, que o problema pode ser transferido para a geração seguinte. “Pode ser que o mercado não seja inteiro assim 100% on demand, mas, entre os millennials e as classes econômicas mais altas, isso é realidade. Eles escolhem tudo que assistem, então já está difícil de fugir disso. Eu diria que o entretenimento não é o foco central da propaganda hoje em dia porque os concorrentes ainda não fazem o que os consumidores realmente exigem. É um pacto silencioso. Ninguém faz, então ninguém precisa fazer. Mas é inquestionável que muitos desses CMOs, que já estão no fim de suas carreiras, têm todos os incentivos do mundo para querer adiar esse jogo que eles não conhecem tão bem. Então é papel dos acionistas que têm uma visão de longo prazo pressionar para que as marcas aprendam a atuar nesse contexto, e da próxima geração de marqueteiros que pressionem para que isso aconteça, ou então, quando chegar a vez deles assumirem o comando, já estarão desatualizados”, diz PJ.

Essa desconfiança é similar à que se observou no início da internet. “É tudo muito parecido com o que era no digital. Quando eu comecei na propaganda, foi fazendo internet. Eu curtia muito. Enxergava que era o futuro. Mas a maioria dos profissionais que tomavam as grandes decisões queria mesmo que isso demorasse para chegar, de preferência quando eles se aposentassem. Resistiram o quanto puderam, mas uma hora a onda passa por você. Hoje um profissional de anunciante ou de agência que não entenda de digital terá dificuldade de arrumar emprego. Em breve será o mesmo com o entretenimento”, destaca PJ, que presidiu o Cyber Lions em 2002.

Em sua opinião, as agências precisam ficar atentas às sutilezas desse formato. “Historicamente, aprendemos que o trabalho que fazemos é criar retorno ao investimento financeiro que uma marca está fazendo. É simples: se investiu um volume de dinheiro, é preciso tirar mais do que se que coloca nesses mesmos recursos para reduzir o preço, ou em uma nova fábrica, ou em design, ou em novas tecnologias, ou deixar rendendo no banco. Como indústria, nosso trabalho é conseguir balancear o ROI desses dois investidores (agências e anunciantes) com uma mesma ideia. Porque se for só um deles, o outro te abandona”.

Quando The Beauty Inside teve expressiva premiação em Cannes, o presidente do júri da área Film Lions foi questionado se a ação teria mais relevância nas audiências do que Game of Thrones. Ele disse que não. PJ disse que concordava, mas em 2014 recebeu um mea culpa de Hegarty. “Eu assistiria Game of Thrones também”. PJ prossegue: “Mas é esse o desafio que temos nas mãos. Essa tem de ser nossa ambição: ou aprendemos a competir com Hollywood pelo tempo dos consumidores ou as marcas não terão mais voz. Não terão oportunidades de falar com quem compra. E sem oportunidade, não tem estratégia, não tem roteiro, não tem investimento em mídia que resolva”.

PJ tem se dedicado à temática do entretenimento nos últimos dez anos. Seu objetivo é entender como juntar a disciplina do digital em criar a própria audiência com a de propaganda para, nas próprias palavras, contar grandes histórias. PJ já produziu dois longas, um deles exibido no Sundance Festival. Em abril ele lança seu quarto livro, A mãe, a filha e o espírito da santa.

“The Beauty Inside não foi sobre Intel. A série foi inspirada na marca com a premissa de que o que está dentro é que importa. E o computador não era o centro, o assunto do filme. Era um personagem que sempre acompanhava o protagonista. Fazia parte da história. Quando encontrarmos histórias bacanas em que o produto pode participar, ele vira personagem e fica muito mais forte. A boa notícia é que quando assistimos a um bom filme, por exemplo, anos depois pode ser que não lembremos da história em detalhes ou do tema, mas lembramos dos personagens. Do Darth Vader. Do Forest Gump. Do homem de lata. Do Tony Stark… Por que não de um produto também?”, ele finaliza.