Essência do podcast como mídia de companhia atrai meios tradicionais
Ouvir podcast é um hábito relativamente novo no Brasil. Especialmente comparado às mídias tradicionais como o rádio, que soma quase um século de história no país. O formato de áudio no digital surgiu no começo dos anos 2000 com uma série de empecilhos tecnológicos para seu consumo: o usuário precisava assinar um feed, baixar o conteúdo em um computador e transferi-lo para um dispositivo móvel, como um iPod. Ou, ainda, baixar diretamente num celular conectado a uma rede wi-fi (os pacotes de dados à época inviabilizam o download direto).
Passados quase 20 anos, os podcasts se popularizaram e têm sido ferramenta relevante para novas formas de engajamento e alcance, principalmente, para emissoras de rádio. As semelhanças entre os meios facilitam essa transição. “O podcast é uma mídia de companhia que está com você enquanto se está fazendo outras atividades, assim como o rádio. Ele funciona como um bate-papo, dando a sensação ao ouvinte de que ele faz parte desse grupo. Firma uma ligação próxima”, compara o publicitário Guga Mafra, apresentador do podcast Gugacast.
O modelo de bate-papo é tão popular que, de acordo com levantamento do Núcleo de Inovação em Mídia Digital da Faculdade Armando Álvares Penteado (NiMD FAAP), mais da metade dos podcasts no Brasil têm o formato estilo mesa redonda, com dois ou mais integrantes conversando entre si. O estudo analisou 1.079 podcasts e identificou insights e tendências de consumo. Os modelos jornalísticos têm espaço de crescimento. Os debates, por exemplo, correspondem atualmente a 9,7% do mercado, seguido pelos documentários/jornalísticos (5,5%) e storytelling/audiodrama (1,9%).
Para Lucas Patrício, CEO da agência de marketing digital GMD, criadora da produtora de podcasts Half Deaf, outro benefício dessa relação próxima com o rádio é o baixo risco e as facilidades de equipamento e de talentos que as emissoras já dispõem. “Com estrutura do rádio e o domínio da arte e da técnica do som, além de profissionais capacitados, as emissoras têm mais facilidade de entender e se adequar mais rapidamente”, analisa. Por outro lado, há o desafio de adaptar a linguagem e o formato, criando algo totalmente novo. “O podcast não pode ser visto como simples adequador de conteúdo já feito na rádio, é preciso aproveitar a enorme gama de experiências que ele gera”.
Segundo Patrício, um dos cuidados que devem ser tomados nessa relação é a singularidade de cada meio. “Fazendo um paralelo, é quase uma dificuldade de aprender espanhol pela similaridade do idioma com o português. A compreensão de que são formatos distintos é fundamental”.
Cada um no seu quadrado
Apesar de compartilharem da mesma essência – o áudio – podcast e rádio também têm identidades próprias que devem ser respeitadas. Seus hábitos de consumo são completamente diferentes. “No rádio ainda há a interrupção para os intervalos, o conteúdo é majoritariamente ao vivo, enquanto o podcast, por ser gravado, pode ser ouvido em qualquer momento. Seu conteúdo vai ser maratonado também, ou seja, é comum que o ouvinte escute mais de um episódio de uma vez. Já a atenção será muito grande, enquanto na rádio, como a audiência tende a ser rotativa, a atenção é mais dispersa”, ressalta Guga. Nesse sentido, combinar o melhor desses dois universos traz para as emissoras um grande trunfo para fortalecer sua marca, ampliar sua base de ouvintes e, claro, atrair novos anunciantes.
“Empresas jornalísticas que fazem podcast vão ter de achar uma maneira de encaixar publicidade e manter credibilidade, cuidando para que esse conteúdo seja integrado com o editorial. O ouvinte é a favor da propaganda que faça sentido, que seja natural e orgânica”, finaliza Guga.