Há 20 anos decidi começar uma nova carreira. Eu era atriz, bailarina e professora de ambas artes. Digamos que as coisas não estavam muito fáceis no campo artístico.

Então, para facilitar, decidi permanecer no mesmo ramo e achei que a área de roteiro seria o melhor caminho para mim.

Embora eu nunca tivesse escrito nada, sempre me consideraram muito criativa, principalmente com as crianças, pelo menos eu quis acreditar, afinal eu precisava de uma justificativa para tentar ser roteirista.

Abandonar a dança e o teatro sem considerar qualquer outra coisa dentro da minha área seria virar professora em tempo integral e era exatamente o que eu não queria.

Pelo menos foi o que eu pensei na época. Hoje muitas pessoas me perguntam se o meu sonho de infância era ser roteirista, se eu sempre quis escrever, se eu me preparei muito para isso e etc. e tal.

“Você fez letras? Não, não. Você fez jornalismo. Aposto!”; e eu digo não fiz nem um e nem outro. Sempre gostei de histórias, de narrativas e sempre fantasiei muito, mas qual é o ser humano que não fantasia? Qual é o ser humano que não cria muitas narrativas? Nós somos narrativas. Nós somos uma história que nos foi contada. Sua mãe disse pra você o seu nome, que você era bonito e mais um monte de coisas que você provavelmente acreditou e eu não estou aqui pra desmentir, afinal de contas com a mãe não se mexe, mas o ponto é: somos as histórias que nos foram contadas. Algumas são maravilhosas, outras nem tanto.

Enfim, procurei o Celso. Tínhamos feito faculdade de artes cênicas juntos e Celso tinha virado roteirista!

Pedi dicas e ele me disse para ler o Manual do Roteirista, um livro do Syd Field. Nunca comprei esse livro, comprei o livro de exercícios do Manual do Roteirista, do Syd Field, por dois motivos; primeiro: era mais barato; segundo: achei que seria mais proveitoso. E foi. Fiz todos os exercícios, achei que estava bombando e inventei um currículo.

Muito em breve, através de um amigo de bom coração, eu consegui o meu primeiro job como roteirista.

Lógico que o meu amigo de bom coração percebeu que eu não sabia absolutamente nada e é claro que eu fui mandada embora em menos de um mês.

Só que aí, eu já tinha, de fato, uma experiência real no roteiro e uma noção do quanto eu precisava aprender.

Então, eu comecei uma formação autodidata. Eu não tinha dinheiro para estudar e eu nem sabia onde fazer esses cursos.

Era o típico momento vai ou racha. Ou virava roteirista ou ir dar aula de manhã à noite.

É preciso ser criativo num momento desses e muito. E eu acredito que foi um dos momentos mais inspirados da minha vida. O que aconteceu? A urgência. Nada vai fazer você levantar a bunda do sofá melhor do que uma necessidade verdadeira.

Depois essa urgência se transformou e eu passei a querer saber realmente como fazer. Vejam que eu tinha de aprender rápido, afinal as pessoas não podiam perceber de cara a minha inabilidade de iniciante. Dá-lhe urgência!
E aí vocês podem pensar que hoje isso mudou, que hoje eu me inspiro como muita gente, com o mundo. Também. Todo escritor é um voyeur, observamos a vida e os viventes.

Uma palavrinha às vezes conta toda história, as pessoas se revelam nos detalhes e blá-blá-blá, mas ainda hoje é a urgência que me move.

Porque a urgência se transforma dentro da gente, ela só muda de gol, de objeto.

Podemos não querer algo que queríamos há 10 anos atrás, mas sempre queremos alguma coisa.

O tic tac do relógio não para.

E não é medo do tempo acabar, porque isso é fato, é uma urgência de aproveitar tudo o que a vida apresenta.

Essa urgência em absorver cada vez mais pode incomodar, mas me inspira e espero que ela sempre esteja comigo me fazendo levantar do sofá.

Jaqueline Vargas é roteirista da “Sessão de Terapia”, série produzida pela Moonshot Pictures