Apesar de ainda estarmos longe da igualdade, uma verdade que a gente raramente enxerga é que esse é o momento onde a diversidade está em seu ponto mais alto na história ocidental e, por consequência, nas empresas. Se pensarmos que há 100 anos não tínhamos nenhuma mulher ou pessoa negra ocupando um alto cargo político, um importante posto militar ou a presidência de uma grande corporação, veremos que estamos sob uma realidade inédita em termos de vozes a serem ouvidas e precisamos aproveitar isso para ampliar esses espaços. Como profissionais negros, precisamos ter na ponta da língua por que diversidade é um dos ativos mais valorosos para as empresas no século 21 e por que elas deveriam priorizar isso.

Em todos os projetos que eu liderei até hoje como jornalista, a minha empresa pôde se beneficiar de uma qualidade que não está na minha formação ou currículo: a minha identidade e experiência de vida. O primeiro site que eu editei tinha como alvo mulheres da classe média baixa, classe de onde eu havia emergido e com a qual eu saberia me comunicar de igual para igual. Eu pude ajudar desde o início, mapeando o que aquele tipo de mulher gostaria de encontrar em um espaço como aquele e como ela poderia ser convencida a se engajar com aquele produto. Aproximadamente um ano depois, eu assumi mais uma equipe como editora de conteúdo online de uma marca que é conhecida no mundo todo pela preocupação com causas sociais que envolvem raça, gênero e meio ambiente. Ser mulher e negra me colocou mais uma vez na posição de poder ajudar a empresa, sendo uma voz que saberia tratar desses temas de uma forma pertinente e sem as possíveis gafes cometidas por alguém que fala “de fora” da situação.

Hoje eu coordeno a equipe editorial do maior site da minha empresa, um vertical de culinária que chegou a ter 100 milhões de visitas mensais em abril deste ano e no qual o público majoritário também é classe C. Todas essas questões de diversidade aplicada na prática que cercaram a minha carreira até hoje sempre deixaram claro pra mim o valor da diversidade nos negócios.

Analisar a importância da diversidade empresarial é uma ótima oportunidade de provar que a inclusão de pessoas fora do padrão homem branco em altos cargos de corporações não é uma questão de caridade, é uma ótima oportunidade de inovação e lucro. Uma pesquisa da Arizona University revela que empresas que têm mulheres em altos cargos de gerência experimentam algo chamado “innovation intensity” e produzem, em média, 20% mais patentes que times liderados por homens.

Investir em uma empresa mais diversa também é uma forma de blindar as próprias decisões internas de erros causados pela falta de conhecimento que reside na separação social. Cercar-se de pessoas com o mesmo contexto de vida que o seu e com valores ou opiniões parecidas com as suas “conduz a um encolhimento da imaginação e da compreensão”, não contribui para que um líder identifique possíveis erros e escândalos. O perigo é que, em uma geração cada vez mais engajada como a do século 21, um erro pode significar boicotes e uma mancha na imagem difícil de recuperar.

Eu acredito que os dados sobre as vantagens e a lucratividade da diversidade, como os muitos que a McKinsey & Company divulgou nos últimos anos, são importantes, mas, para muito além dos resultados positivos, existe também a verdade de que a diversidade não precisa entrar nas empresas só porque é uma ferramenta-chave para inovação. Isso precisa ser estabelecido nas empresas porque é a coisa certa a se fazer. Em 2018 eu fiz a cobertura de um evento que reúne as mulheres executivas mais poderosas do Brasil como a diretora-geral da Kimberly-Clark, a vice-presidente de marketing da PepsiCo e uma das sócias da KPMG. O evento era todo moldado para levantar discussões sobre como levar mais mulheres a cargos de liderança no país e isso, pra mim, é das coisas mais bonitas: o impulso que temos, ao chegar lá, de levar outros conosco.

Há 100 anos não poderíamos sonhar com mulheres liderando as maiores empresas de alimentos e logística do país. Há apenas 132 anos as pessoas negras não sonhavam nem com liberdade no Brasil ainda. Precisamos lembrar que, apesar de ainda estarmos muito longe da igualdade, estamos no momento mais diverso até aqui na história do mundo. Temos de aproveitar o que já conquistamos para evidenciar o que a diversidade tem poder de fazer e, assim, ampliar ainda mais esses espaços.

Jamille Bastos é oordenadora editorial da plataforma TudoGostoso