Lula Vieira: Uber
Ou seja, com quase 50 mil motoristas de táxi na cidade do Rio de Janeiro, existem facínoras como aqueles que aleijaram o colega no aeroporto do Galeão simplesmente porque ele tinha aceitado fazer uma corrida a partir do terminal, mas existem bons samaritanos dispostos a ajudar um desconhecido largado numa via expressa. Já conversei com gente de profunda cultura, de altíssima sensibilidade e senso de humor, da mesma forma que tive que aturar conversa de verdadeiras bestas-feras, capazes de odiar passageiros, outros motoristas, o governo e o ser humano como um todo. 50 mil é um número que abrange todo o tipo de pessoa e não há uma única razão concreta para imaginarmos que a média geral seja diferente de médicos, jornalistas, escritores e músicos profissionais. A classe dos motoristas é um universo. Mas a reivindicação que fazem, procurando banir o Uber, não é tão justa como as palavras de ordem podem levar a crer.
Em primeiro lugar, é preciso deixar claro que, por enquanto, é inegável que o Uber tem apresentado um serviço excelente, com carros novos, motoristas muito educados e alguns diferenciais bastante simpáticos. O simples fato de permitir ao cliente conhecer o perfil do profissional que vai atender já é uma vantagem apreciável. É o consumidor que avalia a qualidade do serviço recebido e dá notas ao motorista e – por extensão – ao conforto da viagem. E poderá ser identificado e ser recusado antes de se apresentar, o que não é de pouca utilidade quando se imagina que ele poderá ter sido chamado para levar sua filha a uma festa ou trazê-la de volta tarde da noite. Outra vantagem é o sistema de pagamento, por cartão de crédito pré-registrado. Os carros do Uber são geralmente mais novos, mais bem cuidados, assim como os motoristas mais bem vestidos. A oferta de lenços de papel e garrafas d’água não são simples frescuras numa cidade como o Rio de Janeiro. Outra reclamação dos taxistas é que eles pagam taxas para a Prefeitura, o que não acontece com os motoristas do Uber. É um argumento. Mas a taxa paga permite aos táxis ser identificados facilmente na rua, trabalhar com exclusividade em aeroportos, rodoviárias e em pontos fixos, circular em faixas exclusivas, prestar um serviço, digamos, oficial, pelo menos em princípio, oferecendo ao cliente garantias quanto à qualidade. Na verdade, um táxi devidamente identificado tem o aval da autoridade municipal. Isso vale tanto para o carro como para quem o conduz.
O Uber não anda pela rua, com o bigorrilho aceso, sinalizando que está livre. Sua relação de consumo é outra, não é uma concessão governamental. Também não podemos esquecer que os taxistas têm direito a um desconto por volta de 30% no valor do veículo que compram, o que corresponde à soma do IPI e do ICMS. Num carro como o Corola representa algo em torno de 21 mil reais de desconto. E tem mais: o direito ao financiamento do FAT, que lhe permite comprar seu carro em até 60 meses, com juros por volta de 4,5% ao ano, contando ainda com isenção do IOF. Qualquer outro que queira comprar um carro terá que arcar com juros de, no mínimo, 20% ao ano. Este meu cálculo é bastante grosseiro, pois os juros podem cair dependendo da entrada. É só para ilustrar que os taxistas têm algumas vantagens que os incentivam a ser legalizados. Acho justo que seja assim. Para completar, acho que as lideranças dos taxistas deveriam estabelecer uma relação maior com a prefeitura, para discutir soluções que atendam aos interesses da população e dos motoristas. Ameaçar parar a cidade poderá adiar o problema um pouco, mas vai ser difícil não permitir que sistemas que atendam melhor sejam abandonados pelas pessoas. Pode ficar mais difícil usar o Uber, mas sempre haverá uma saída legal para que o passageiro que queira ser melhor atendido possa fazê-lo.