Mais próximos do sol

Março teve início anunciando uma terrível pandemia que atingiria mais da metade dos povos do planeta. Estive em Nova York entre 9 e 16 de fevereiro, e já se falava nisso, embora ainda de forma não continuada. O vírus que todos temiam tinha o poder de calar muitas bocas, mais por medo do que por outro tipo de sentimento.

E o bicho veio logo depois e para valer, causando um estrago ainda incalculável para os povos mais diretamente atingidos, que no máximo só se permitiram contar as perdas de vidas ocorridas. Aqui no Brasil, terra considerada abençoada por brasileiros e estrangeiros, a pandemia tardou um pouco, mas chegou com força total, provocando, entre outros desastres, a semiparalisação das atividades profissionais e escolares, o que será refeito na sua plenitude esperamos que em breve.

Impossível calcular por enquanto os prejuízos materiais causados ao nosso país, com a economia despencando e fazendo fechar para sempre muitas empresas. Estamos agora todos rezando (os que creem nas forças e ouvidos dos céus) para que de fato a pandemia esteja no fim entre nós e não ocorra, como alguns preveem, uma segunda onda. Seria uma catástrofe em dobro.

No mercado publicitário brasileiro, o detalhamento das mudanças causadas pelo coronavírus foi e ainda é de grande monta, trazendo inclusive algumas incertezas junto aos mandatários do setor, sendo a principal delas, a nosso ver, a adoção definitiva e em larga escala do home office, com suas vantagens e desvantagens, como toda grande inovação. Principalmente quando causada por elementos estranhos à escalada do ser humano rumo ao progresso e ao seu bem-estar de vida.

Muitos dirigentes de grandes anunciantes e de agências estão gostando da ideia, por possibilitar apreciável redução de custos, tema que bem antes da pandemia já vinha preocupando os responsáveis por balanços contábeis mais atraentes.

A adoção definitiva da medida diminuirá de forma expressiva os gastos com as sedes alugadas pelas grandes corporações, que passarão a ter boa parte dos seus funcionários de escritório trabalhando em casa. Esta é, sem dúvida, à primeira vista, uma boa economia para as empresas.

Há, porém, o entrave do produto final, seja ele qual for, que a nosso ver sofrerá em termos de inovação, principalmente, com o home office.

Todos que militamos de alguma forma em trabalhos intelectuais coletivos sabemos da ajuda que um presta ao outro, para melhorar uma ideia ou o final de um trabalho que só espera aquela observação para ser completado e fazer sucesso.

Fico imaginando a redação do PROPMARK totalmente separada entre si, cada qual elaborando seus textos em casa, sem sentir o pulsar das ruas e sem sequer poder compartilhar com o companheiro ao lado alguma frase ou dado histórico que pode levar mais luz à matéria jornalística em produção.

Em 55 anos de PROPMARK, sempre vibrei com o trabalho coletivo, ainda que não se tratasse do mesmo assunto para cada profissional jornalista presente àquela “taba indígena” que gerava o produto final, que no dia seguinte iria ao encontro do leitor, para o bem ou para o mal. Quantos textos foram melhorados nas redações de todos os jornais e revistas do mundo quando faltava uma palavrinha para o fechamento de uma frase e ela saía, às vezes, até mesmo da boca de um office-boy que coincidentemente passava pelo autor do texto naquele momento.

Todos sabemos a força do acaso. Exatamente por isso, torcemos para que as equipes, tanto das agências, como dos clientes-anunciantes e da mídia em geral, prossigam trabalhando em conjunto, ainda que em jobs diferentes.
Imagine o leitor a formatação da letra daquela que será uma bela canção sendo isoladamente elaborada por um único autor. Pode sair a melhor canção de todos os tempos, mas a tendência é de haver maior dificuldade para o fecho da história, sem a dica de alguém passando e se interessando pelo trabalho final, do qual toda obra artística, jornalística, publicitária ou de qualquer outro segmento da inteligência humana necessite para se emocionar com o que acabou de ler.

Abaixo, pois, o home office, que aumentará a solidão dos que trabalham com palavras, provocando no produto final de cada um deles sempre a ausência do fecho necessário que transforma o bom texto em ótimo. Ou até mais que isso.


Pagando por um erro inadmissível, o Facebook está assistindo grandes marcas anunciantes suspenderem suas mensagens comerciais na rede, em sinal de represália pela veiculação de mensagens de ódio racial na mesma. O pessoal do Face já deveria saber que não há dinheiro que cale esse movimento, hoje praticamente mundial. Finalmente o ser humano está se convencendo que a segregação e a repulsa por ela gerada não são apenas sentimentos do passado. Jamais deveriam ter existido.

Fazem parte desse movimento antirracista gigantes como a Coca-Cola, a Volkswagen e a Microsoft, dentre outros, que iniciaram a suspensão de anúncios no Facebook devido à veiculação de mensagens racistas na rede. Nosso país está incluído entre os vários que já estão recebendo pedidos desses anunciantes, como forma de condenar mensagens de ódio racial na rede social.

Muitos outros grandes anunciantes vão aderir à causa, o que sem dúvida fará o Face mudar sua política atual, desruborizando sua face.


Além de ser uma vez mais consagrada em Cannes, com a concessão este ano de Agência Mundial da Década, a AlmapBBDO, presidida pelo criativo Luiz Sanches e tendo como responsável executivo o competente Filipe Bartholomeu, mantém acesa a chama de grande agência do nosso mercado, com trabalhos impecáveis desde a época de José de Alcantara Machado, do gigante Alex Periscinoto, Ercílio Tranjan, Arapuã e tantos outros profissionais que proporcionaram à nossa propaganda – juntamente com mais três ou quatro agências – ser conhecida e aplaudida em todos os festivais publicitários do planeta dos quais participavam. O que, diga-se, prossegue.

A paga que recebe a Almap, além da consagração pública, é a conquista de vários importantes clientes, como mais recentemente a Diageo.


Ainda sobre a questão racial na propaganda, imperdível a matéria de capa desta edição, assinada pelos nossos editores Danúbia Paraizo e Leonardo Araujo, confirmando que as agências têm o desafio de manter a meta sobre inclusão racial. Signatárias do pacto Conexão Negra se comprometeram a alcançar 30% de negros em seus quadros. Passados nove meses desde que 15 das maiores agências que operam em nosso país assinaram o pacto com o Ministério Público do Trabalho de São Paulo, as metas e iniciativas estabelecidas para a inclusão racial nas empresas, em boa parte, estão sendo seguidas.


Aproximando-se dos 100 anos de circulação, a Folha assina campanha pela democracia, cujos verdadeiros enunciados ainda fazem falta em nosso país.