Marcas realmente precisam de slogans?
Pense rápido: quais slogans vêm à sua mente? Provavelmente, não muitos, não é mesmo? Mas a culpa não é da sua memória. Com a efemeridade que a internet trouxe para a vida das pessoas e a rápida mudança de assuntos nos dias de hoje, as marcas passaram a trabalhar mais a propaganda em cima de temas e não necessariamente de um slogan. O Google, por exemplo, não adota um slogan fixo e é, no entanto, a marca mais valiosa do mundo (com valor de US$ 109,5 bilhões), segundo o último ranking da Brand Finance. Sua última campanha no Brasil trazia uma mensagem absurdamente simples: “Dá um Google”. É um jeito de falar popular que já faz parte do dia a dia das pessoas e mostra a principal funcionalidade do buscador, que é a pesquisa. Simples assim.
“Estamos num momento muito diferente. A Nike, por exemplo, tem um slogan muito forte, que é o ‘Just do it’, mas praticamente não usa mais. Ela é muito tematizada, está muito mais focada em temas de campanha do que slogan. Isso tem a ver com uma inspiração vinda do Google, de que as marcas podem se transformar, não precisam ter um slogan fixo, porque os assuntos mudam muito rapidamente”, explica Sergio Silva, professor do curso de publicidade e propaganda da Faap (Fundação Armando Alvares Penteado). Ele completa que as marcas que estão mais alinhadas com o ambiente digital são as que mais trabalham publicidade em cima de temas.
De acordo com o especialista, o slogan é uma ferramenta de construção de marca e que acompanha o próprio amadurecimento da marca. “Muitas vezes a empresa precisa se qualificar”, diz ele. Silva, no entanto, cita que as marcas de varejo, por exemplo, têm grande dificuldade de lançar slogans porque não sobra espaço para trabalhar essa consistência, porque elas precisam criar campanhas para datas comemorativas. Afinal o varejo precisa vender, acima de tudo.
O professor da Faap destaca que slogans duram enquanto forem relevantes para o contexto da marca e do momento atual. Ele cita o caso da Volkswagen, que depois do recente escândalo de falsificação de resultados de emissões de poluentes em motores a diesel, rapidamente deixou de usar a assinatura em alemão “Das auto” (em uma tradução livre, o automóvel) e passou a adotar “Inspirada na sua vida”. “O Das auto passou a soar muito arrogante após esses problemas”, observa ele.
A CVC é outro exemplo. “A empresa passou muito tempo usando o conceito ‘CVC, tudo por uma boa viagem’, que denota uma certa agressividade comercial. Já a nova assinatura ‘CVC sempre com você’ vem acompanhada de mudanças de postura de atendimento, mostrando que a empresa acompanha o cliente em todos os momentos”, pontua Silva.
Bem-sucedidas
O professor da Faap ressalta também que existem marcas que trocam de slogan frequentemente, como é o caso da Coca-Cola, e são muito bem-sucedidas. “Todos os slogans da marca se tornam ícones. A Coca-Cola faz isso com sucesso”. Vale lembrar que o atual conceito do refrigerante, “Taste the feeling” (“Sinta o sabor”), se tornou um dos hinos das Olimpíadas do Rio no ano passado.
Já a renovação de um slogan que faz parte do vocabulário e da forma de expressão das pessoas é sempre uma coisa que deve ser analisada com cuidados redobrados, avalia o líder acadêmico da área de marketing da ESPM, Marcelo Pontes. Exemplos de slogans que viraram expressão popular não faltam: “Não tem comparação (Brastemp), “Tem 1001 utilidades” (Bombril), “O primeiro a gente nunca esquece” (Valisere), “Desce redondo” (Skol) e “Uma boa ideia” (51) são alguns deles.
A Brastemp, aliás, recentemente reposicionou a marca com um conceito bem semelhante ao que fez sua história na propaganda. “‘Sem dúvida, Brastemp’” (criado pela FCB) parece reforçar a ideia de ‘único’, de ‘sem comparação’ que vinha sendo trabalhado. É de se imaginar que a concorrência reforçada, não apenas em termos de atributos de produto, mas também em termos de percepção de marca, estava levando alguns consumidores a questionarem os diferenciais da Brastemp. Se for isso, a nova assinatura promete diminuir essa dissonância e, se bem trabalhada, como foi feito com o slogan ‘não tem comparação’, pode ter resultados interessantes”, analisa Pontes.
“Mas sempre é bom lembrar que a assinatura ‘não tem comparação’ foi colocada no imaginário popular com campanhas memoráveis, com uma linguagem simples, autoral da Brastemp, não apenas quando colocavam os atores Wandi Doratiotto e Arthur Kohl, como também quando colocavam outros personagens absolutamente pertinentes para o conceito passado. Ou seja, o slogan sempre foi acompanhado de uma execução brilhante de campanhas extremamente criativas, bem-humoradas”, completa ele.