O mérito da Academia de Ciências e Engenharia da Alemanha ao cunhar o termo “Indústria 4.0” foi identificar uma revolução tecnológica e social, enquanto essa revolução ainda está se desenvolvendo. As revoluções anteriores foram analisadas de uma perspectiva histórica.

Ao alertar a sociedade alemã sobre a velocidade das mudanças que viriam, indicando a necessidade de um movimento coordenado entre academia, setor privado e governo, acabou também por impulsionar o mercado na busca de novas soluções que ajudaram a realizar as previsões anteriores. Desde então, fornecedores de vários países oferecem diferentes visões do conjunto de tecnologias e soluções que possibilitam as mudanças previstas.

Sem dúvida, as tecnologias são os instrumentos que trarão as mudanças, porém o resultado é impactado por como a sociedade, governos, empresas e principalmente seres humanos reagem às mudanças.  Um diagnóstico do governo norte-americano – ainda no governo Obama – toca no ponto sensível da revolução atual: a tecnologia pode alterar a forma da distribuição de riqueza, concentrando-a, ainda mais, nos detentores de conhecimento.

Apesar de algumas tecnologias envolvidas na Indústria 4.0 – notadamente inteligência artificial e utilização massiva de dados para análise – tenham uma influência sobre algumas tarefas tidas como “intelectuais”, nada indica que abstração e criatividade possam ser automatizadas.  Um estudo da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) de 2016 presume que o risco de substituição de trabalhadores por tecnologias de automação diminui conforme aumenta seu grau de instrução.

Segundo o estudo, até 44% dos profissionais que não possuem o segundo grau continuariam ameaçados de perderem seus empregos pela adoção de novas tecnologias, caindo este percentual para 1% para pessoas com curso superior ou até 0% para pós-graduados.

“Tecnologia não é destino”, reforça o documento da administração Obama ao estabelecer estratégias para suavizar as mudanças que terão impacto na sociedade e na vida dos cidadãos americanos. O que o documento delineia é uma política responsável que mantenha níveis de empregabilidade elevados, com produtividade e níveis de automação significativamente mais altos do que hoje, por meio das instituições existentes.

Uma estratégia fundamental é baseada na educação, “educar e treinar os americanos para os trabalhos do futuro”. O desafio é garantir habilidades em leitura, raciocínio lógico, tópicos de computação e pensamento crítico, além dos padrões atualmente encontrados.

As conclusões da análise americana, bem como de diversos estudos incentivados pelo governo alemão, aplicam-se a qualquer empresa inserida no mercado altamente globalizado, qualquer que seja seu tamanho ou país onde esteja instalada. Os ganhos de produtividade obtidos por determinados segmentos tendem a ser tão altos, que levaram Bill Gates a sugerir taxação de impostos para robôs. A proposta, que parece tão estapafúrdia, carrega o mérito de alertar para o tamanho das mudanças que já se enxerga no horizonte.

No Brasil, problemas diversos como taxa de juros, política cambial e infraestrutura influenciam fortemente nos resultados finais. O direcionamento organizado de políticas industriais é também bem menos efetivo em relação aos dois países citados acima – reflexo de uma fraqueza de nossas próprias instituições. O ponto no qual empresas podem agir com liberdade é na busca de conceitos e tecnologias, ambos disponíveis em escala global e de forma igualitária.

Porém, se “Tecnologia não é destino”, também é certo que não é uma vara de condão. Aplicada indistintamente, sem diagnóstico anterior, mapeamento de cenários e planejamento adequado projetos de evolução fracassam. Empresas que esperam se beneficiar de novas tecnologias devem fornecer o ambiente adequado onde essas tecnologias florescem e prosperam.

Trabalhar com pessoal qualificado pode significar diminuir a quantidade de níveis hierárquicos e trazer decisões para o chão de fábrica de forma mais evidente. Mudanças tecnológicas trazem consigo a necessidade de estar aberto a modificações profundas na organização do trabalho e a quebra de hábitos arraigados na cultura da empresa. Investir no Fator Humano continuará a ser o fator-chave para prosperar.

Hilton Marinho é diretor associado para Indústria 4.0 da RSI Redes