Fabiano Higashi: “Cada advento tecnológico fez a ilustração evoluir”/Divulgação

Fabiano Higashi, diretor de criação e head of art da Wieden+Kennedy São Paulo, será o jurado brasileiro de Illustration no D&AD 2021. Na entrevista abaixo, o criativo demonstra conhecimento profundo da área, remontando à época das cavernas, quando os seres humanos se comunicavam por meio de pinturas rupestres, para dar a sua visão sobre a importância da ilustração na publicidade. Ele também fala que, com as restrições impostas pela pandemia à criação de campanhas, não foram raras as vezes que recorreu às ferramentas visuais mais básicas neste período para desenvolver um projeto. Pela primeira vez no júri do festival, Higashi afirma que suas expectativas são altas.

Origem
A propaganda sempre bebeu das artes visuais para comunicar o que quer que fosse. A ilustração é somente uma das disciplinas. Mas, se olharmos a linha do tempo, o primeiro fato a se notar sobre a categoria é histórico e contundente: antes do advento e massificação da fotografia, toda forma de comunicação, publicitária ou não, era totalmente refém da ilustração. Primeiro nas pinturas rupestres, depois nos textos canônicos, nas vanguardas, nas gravuras, nas charges e, finalmente, na publicidade. E, embora a ilustração seja erroneamente categorizada como item criativo de luxo, não existe disciplina mais democrática para usar na hora de criar. Não é necessário um casting, uma equipe grande ou abertura de câmera. Basta só uma ideia e uma tela. Por isso, a importância da ilustração se mantém exatamente a mesma desde a época das cavernas: comunicar uma ideia de maneira contundente.

Evolução
Muito se fala sobre os meios e formatos morrerem ou perderem espaço com adventos de novas tecnologias. Isso é uma meia verdade. Cada advento tecnológico fez a ilustração evoluir, não perder espaço. Antes do tablet havia o aerógrafo. Antes do aerógrafo havia o bico de pena. Antes do bico de pena havia o pincel. Antes do pincel havia o dedo. A ilustração não perdeu espaço em nenhum desses adventos. Claro que os especialistas em cada método naturalmente perdem espaço para as novas gerações, mais acostumadas com novos meios. Faz parte da natureza implacável da evolução tecnológica. Isso foi uma verdade da geração passada para a minha – largou-se o paste-up em favor do photoshop – e será uma verdade para as que me ultrapassarão – já nascidas com TikTok, Instagram e softwares de AR nas mãos. Resumindo, a categoria em si não vai morrer, ela apenas mudará.

Pandemia
Todos tivemos de nos adaptar às restrições criativas da pandemia. Isso inclui aceitar os rígidos protocolos de produção que inviabilizam sets ou estúdios repletos de pessoas. Os orçamentos também diminuíram, o que por si só já inviabiliza a abertura de câmeras. Restaram aos designers e diretores de arte a boa e velha mão e o olhar. Símbolos, gravuras, vetores, scanners. Não foram raras as vezes que recorri às ferramentas visuais mais básicas nesta pandemia para desenvolver um projeto.

Japão
Sou suspeito para falar por conta da minha ascendência nipônica, mas, pra mim, o Japão está em outro nível de entrega. Não houve um festival de criatividade em que não tenha me surpreendido com a qualidade que vem de lá. É um país culturalmente famoso pelo apreço estético das ilustrações, rigor que remonta desde a sua fase pré-histórica – no período conhecido como Jomon –, atravessa a era moderna – quando Monet compra as litografias de Hokusai – e conquista o mundo com a globalização dos mangás e animês. Com o perdão da conformidade, estamos (literalmente) alguns milênios atrasados nessa corrida. Ao mesmo tempo, só no Brasil se observa uma multiplicidade visual tão rica e democrática. Pra mim existe um encanto nos nossos vernáculos que nenhum outro país é capaz de alcançar.

Ideia
A avaliação de uma ilustração em um festival não passa somente pelo crivo estético, mas também de propósito. Para que serve aquela ilustração? Com qual intuito ela está sendo usada? O que ela quer comunicar? Claro que a técnica importa, mas, pra mim, ela é coadjuvante nesse todo.

Festival
O D&AD é o meu festival de criatividade favorito. Primeiro porque na sua origem é um festival dedicado ao craft da profissão. Segundo é que o sarrafo lá é bem mais rigoroso que em outros. Por isso, a minha expectativa não podia ser mais alta. Toda premiação do D&AD é um banho de inspiração, e sempre dedico um tempo estudando o que ganhou, pura e simplesmente porque isso refresca os neurônios.