Está saindo do forno um documentário sobre o Zé Rodrix para o qual dei uma entrevista contando alguns causos que participei e que Zé foi protagonista.

Como fizemos bastante coisa juntos, consegui lembrar de um ou dois fatos que podem ajudar a entender essa figura talentosa e fascinante.

Mas depois do filme pronto, me lembrei de uma história que ele contou envolvendo o sócio dele, o Tico.

Vale a pena relembrar porque é uma delícia.

Um dia entrou um cliente na produtora. Um sujeito absolutamente chato, recém-chegado de um MBA no exterior, com aquele jeitão de quem tinha encontrado Cristo e sabe da verdade absoluta.

A ignorância acrescida de um certo conhecimento de meia dúzia de receitas de bolo e dúzia e meia de frases feitas, boa parte em inglês.

Todo mundo já topou com um imbecil desses, que acha que é o próprio arauto de uma nova era da comunicação.

Se fosse hoje, estaria falando de inteligência artificial e de H2H, uma evolução do B2B e do C2C. E teria ajudado a eleger o Obama, como os oito milhões de brasileiros que fizeram parte da equipe dele trabalhando nas redes sociais.

Mas naquele tempo eram outras as certezas das razões pelas quais a propaganda nunca mais seria a mesma.

Em uma semana, o cara já era uma lenda na casa. Reprovava tudo com cara de desdém e dava aulas sobre neurolinguística e new marketing, pontificando sobre a percepção do consumidor nesta
nova era.
Fazia observações irrespondíveis sobre psicologia do target, objetivos estratégicos, distorções cognitivas e metalinguagem do nervo anal.

Normalmente quem é do ramo pula por cima desses deslumbramentos e se esquece de teorizar sobre o já entendido e se ferra quando pega pela frente um puto desses. Mas, pela surpresa, o rapaz deixou sem fala um monte de gente.

Um dia haveria a apresentação de um jingle da maior responsa e todo mundo ficou com medo de ter de jogar fora o material criado, além de ter de ouvir uma conferência.

Daí o Tico foi chamado para ver se conseguia segurar a fera. Um parênteses: o gênio da raça ainda não conhecia o Tico.

Tico pediu que quando a reunião fosse começar a secretária entrasse na sala e anunciasse: “Senhor Tico, ao telefone dr. Fulano de Tal, presidente da Nestlé”.

Tico pega o telefone, saúda o tal presidente com a maior indiferença, ouve por alguns instantes e grita: “o queeeeeeeeê? Não gostou do jingle?

Só porque você é presidente acha que vai se meter no meu trabalho? Você toca alguma merda além de punheta?

Não vou fazer mais porra nenhuma para você e para a tua empresinha. Enfia a Nestlé no cu! Calma o caralho! É o meu talento, viadinho! E não me encha mais o saco!” E desligou violentamente.

Após a gritaria para um telefone mudo, voltou-se para o cliente e perguntou candidamente: “E aí, o que você achou do nosso jingle?”

Não é preciso dizer que foi tudo aprovado. Se o doido tratava assim o presidente da Nestlé, imagina o que não faria com ele próprio?

Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor (lulavieira@grupomesa.com.br)