Em meio a uma crise econômica sem precedentes em nossa história, agravada por outra na política que parece não ter fim, o Brasil publicitário demonstra sua inegável e reconhecida força à apreciação do mundo em Cannes.
 
Não nos surpreende, porém, o fato de termos superado 2016 no universo das premiações no Cannes Lions, pois sabemos, como talvez nenhum outro país saiba, que as crises se combatem com muitos remédios, um deles acreditar e fortalecer a atividade publicitária.
 
Porque é na força da propaganda que reside a ativação dos mercados, que por sua vez, reagindo em cadeia, provocam, por mínimo que seja, um reaquecimento no sistema econômico. E quando isto ocorre, como por osmose, cria-se a tendência da melhora. 
 
A história se repete não apenas em nosso país, mas em todos aqueles que optaram pela livre iniciativa, elegendo a atividade publicitária como combustão maior para as vendas e o desejo de compra das pessoas. Até mesmo nos poucos países de economia estatal, a força da publicidade faz-se presente, embora nem sempre visando a elevação da qualidade de vida da sua população.
 
Nesses países totalitários, a propaganda funciona como um embuste, fazendo crer que seus habitantes vivem ou viverão logo adiante no melhor dos mundos. A História tem provado, felizmente para a democracia, que as palavras de Lincoln são imorredouras: “Não se pode enganar todo um povo, o tempo todo”. 
 
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Cobrindo o Cannes Lions desde 1971, quando o festival era apenas de filmes comerciais e se realizava alternativamente em Cannes e Veneza, sob a prosaica denominação de Festival Internacional do Filme Publicitário, sempre fomos combatidos pela direção do evento por divulgarmos os resultados antes da cerimônia de entrega dos prêmios.
 
Os vencedores nos chegavam ao conhecimento por diversos meios, sempre sobressaindo – modéstia às favas – uma das mais caras riquezas do bom jornalismo, o binômio boas fontes, bons furos.
 
A imprensa seria uma chatice só, sem isso. Divulgar um fato que já é do conhecimento público, também é sua função, mas extremamente burocrática.
 
Ao nosso comportamento, fiel à profissão, foram se juntando outros colegas, sempre procurando antecipar, para os seus leitores, os vencedores de Cannes e outras informações de interesse geral do setor jornalístico abraçado. E sempre houve uma espécie de caça às bruxas por parte da direção do festival, mas sem nunca chegar a queimá-las nas fogueiras da inquisição.
 
Este ano, surpreendentemente, pois era o primeiro Cannes Lions do novo CEO do festival, o brasileiro José Papa Neto, a proibição “engrossou”, sob a ameaça de se cassar as credenciais dos jornalistas insubmissos.
 
O fato gerou – como tudo hoje em dia – extensos comentários nas redes sociais, cuja leitura evidenciou para o editorialista a lamentável incompreensão de alguns patrícios nossos sobre o trabalho da imprensa.
 
De qualquer forma, cumpria-nos colaborar para apagar o incêndio que nos ameaçava. Preferimos então, de comum acordo com os “rebeldes” (mas, cumpridores ao extremo dos seus deveres profissionais), acatar à proibição, mesmo que sob protesto.
 
Era a decisão mais amena, diante da ameaça de suspensão dos nossos trabalhos, através da cassação das credenciais formulada pelo novo CEO do Cannes Lions.
 
Fica o registro, porém, de mais uma arbitrariedade praticada contra o livre exercício de uma profissão que tem, na liberdade de expressão e no dever de informar seu público, dois valores exponenciais.
 
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Causou estupefação geral no considerável público presente ao Cannes Lions, a divulgação da proibição, pelo alto comando do Grupo Publicis, de participarem suas congêneres em todo o planeta de premiações publicitárias em 2018, inclusive o Cannes Lions. 
 
Tentamos obter informações a respeito dos motivos dessa polêmica decisão e o máximo que conseguimos foram razões de ordem econômica. Ou seja, as agências do Grupo Publicis deixarão de se beneficiar dos rendimentos de vitórias que obtêm mundo afora, nas diversas premiações da comunicação do marketing, em troca da economia dos investimentos em inscrições e viagens do seu pessoal, quando se trata, por exemplo, da importância de um Cannes Lions.
 
Muito provavelmente, o alto comando do Grupo Publicis não levou em conta o desânimo a ser causado nos seus criativos espalhados pelo mundo, abraçados a uma atividade profissional que faz das competições seu melhor estímulo para superarem-se.
 
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Este Editorial é uma homenagem ao jornalista Jorge Bastos Moreno (O Globo), recentemente falecido, que na sua trajetória profissional procurou sempre dar os melhores furos, ainda que desafiando os poderosos de plantão. Um deles foi a escolha de Figueiredo para a Presidência da República, aprovada pelo Alto Comando Militar, em plena ditadura.
 
Jorge Bastos Moreno foi bem lembrado pelo confrade Adonis Alonso, em post no Facebook, durante os prós e contra à proibição da direção do Cannes Lions acima citada.
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Outra homenagem imprescindível: a Nizan Guanaes, pela defesa do trabalho da imprensa brasileira, na cobertura do Cannes Lions. Nizan reconheceu a importância desse trabalho no crescimento do festival, principalmente no Brasil. Achou um erro a ameaça de cassação de credenciais de jornalistas, que, usando suas fontes, divulgaram resultados de premiações antes das cerimônias oficiais. “Isso faz parte do trabalho da imprensa”, disse Guanaes, falando a um grupo de jornalistas na manhã do último sábado (24), na sala de imprensa do Palais.