Marlene Bregman, consultora da Leo Burnett, se diverte contando sua trajetória profissional para os jornalistas do PROPMARK (Fotos: Alê Oliveira)

Quando chegou à Leo Burnett, em 1979, Marlene Bregman já tinha acumulado nove anos de Editora Bloch, um mestrado em comunicação, graduação em jornalismo e um estágio na Carlile Advertising, em plena Madison Avenue. O sonho americano também já tinha ficado para trás, assim como o dia em que serviu de intérprete das perguntas de Hebe Camargo aos astronautas recém-chegados da missão lunar.

Do alto de seus 76 anos, Marlene reina na agência que ajudou e ainda auxilia a prosperar. Bate ponto (quase) todos os dias e a constante sagacidade fez com que não sofresse ao ver a área de pesquisa, que comandava há 40 anos, se transformar em departamento de planejamento.

“Entrei na Leo como diretora de pesquisa e planejamento. Nós fazíamos pré-testes. Naquela época dificilmente um comercial ia ao ar se não tivesse sido pré-testado, se as pessoas não tivessem entendido claramente a mensagem, os benefícios de produto e qual era a vantagem competitiva. Fazíamos pesquisa de hábitos de uso e nós éramos, em muitos casos, o departamento de pesquisa dos nossos clientes”, diz a hoje consultora estratégica da Leo Burnett Tailor Made em sabatina realizada pela equipe do PROPMARK.

Uma de suas atribuições era fazer pesquisa de introdução de novos produtos. “Trabalhávamos em conjunto, mas sobretudo em comunicação e imagem. Naquela época, ao fazer uma pesquisa, demorava 90 dias para termos a solução, quando ela chegava o problema já não existia mais ou já era outro.”

Mais uma diferença era o ROI, que segundo Marlene era medido pela “caixa registradora”. “Não tínhamos nada a ver com o business, o nosso papel como comunicadores era construir a imagem, então fazíamos os tracks para ver que novos valores e atributos aquela marca tinha conquistado no coração do consumidor”, reflete.

Planejamento

Para Marlene, a maior diferença da época em que entrou na Leo Burnett para hoje é que as agências já não fazem pesquisa, mas planejamento.

“Antigamente, construir o discurso era uma coisa passiva e o meu consumidor escutava, hoje as marcas não têm mais o controle. Agora, a marca e o consumidor interagem o tempo todo. Novas disciplinas sofisticadas foram desenvolvidas e eu posso ver o comportamento das pessoas no momento que ele acontece”, brada.

Marlene Bregman e Armando Ferrentini durante encontro no PROPMARK

De acordo com Marlene, é preciso construir uma marca entendendo a trajetória do consumidor. “É no planejamento que as coisas acontecem. É lá que o ponteiro começa a girar a favor do cliente”, defende. Na década de 1970, a Leo Burnett trazia de Chicago técnicas prioritárias para serem aplicadas no Brasil.

“A Leo é um celeiro de conhecimento, sempre foi uma empresa que investiu muito em gerar não só informação, mas transformá-la em conhecimento.” Hoje, Marlene diz, “os departamentos na Leo estão always on e o planejamento pode criar negócios para uma marca. Somos antropólogos digitais seguindo as passadas dos consumidores. É por isso que hoje a primeira pergunta não é qual é o problema de comunicação, mas qual o problema do seu negócio. A comunicação na era digital está imbricada no negócio, você não pode pensar no negócio sem pensar na maneira como você fala com as pessoas”, defende.

Trabalho

Desfrutando dos privilégios que a maturidade traz, às sextas-feiras – dia do rodízio do seu carro – Marlene trabalha remotamente. “Eles não precisam de mim para tudo”, se diverte.

Engana-se, porém, quem vê nela uma peça decorativa da Leo Burnett. Marlene encabeça projetos de liderança, estudos de comportamento, concorrências e, em 2019, teve grande parte do seu tempo tomada por um projeto de governança da própria agência.

Foram mais de 200 horas de áudio gravadas com os 50 principais executivos da Leo para entender deficiências e oportunidades da equipe e revelar qual o propósito da agência. Resolução essa, que ainda não pode detalhar, mas que dá algumas ideias.

“Estamos com um propósito de agência, que é de contribuir cada vez mais para o negócio do nosso cliente”, despista. Para Marlene, o trabalho de governança envolve a cultura da agência, refletindo no comportamento das pessoas. “Não é só para agência, é tudo para qualquer marca. Acho que foi o Michael Porter quem disse que a cultura mata a estratégia a cada manhã. Não adianta você colocar planos em pé, se você não criou na sua agência, ou na sua empresa, uma cultura interna, que são os valores, ética e integridade”, diz.

“Cultura é a terra adubada. É aquilo que a gente é. E se eu me mostrar diferente daquilo que sou hoje […] serei desmascarada três segundos depois”, aponta.

Novos tempos

Admiradora de Alyssa Milano, idealizadora do movimento #MeToo, Marlene afirma nunca ter sofrido assédio sexual, mas é categórica ao dizer já ter sido alvo de assédio moral. Por isso, vê de forma positiva as mudanças da sociedade.

“Estamos vivendo tempos muito bonitos. Se de um lado, com as redes, vivemos no mundo do não-perdão, as empresas, por outro, estão muito preocupadas com isso. Eu sei que a minha está”, argumenta.

Até por isso, Marlene crê numa mudança de comportamento do mercado. “Estamos entrando em algo muito melhor, que começou timidamente, e tenho certeza que vai ser a tônica entre 2020 e 2025, que é o propósito social das empresas. As companhias têm de ser mais do que vender bons produtos. A empresa precisa ter um papel social, sobretudo porque estamos na vanguarda do machine learning”, aponta.

A reposição de pessoas e tecnologias não assusta Marlene. Para ela, o constante aprendizado se dá no trato com o outro e em ter o domínio sobre o desejo do cliente.

“Eu não preciso saber fazer para entender o valor de algo, sua utilidade ou direcionar as pessoas. No fim do dia, a gente precisa ter é a custódia do pensamento do consumidor”, resume.

“Vocês não acham que sou uma pessoa privilegiada de poder ter passado por tudo isso, ainda estar neste meio e em uma empresa extraordinária? A minha vida, aprendizado, entusiasmo, o meu amor e a minha paixão estão intrinsecamente ligados à Leo Burnett”, conclui.