Você está superantenad@, a par das principais tendências, e se prepara para surfar uma nova onda. Quem surfa sabe: se você entrar cedo demais, pode perder a onda, se entrar tarde demais, pode levar uma vaca. Uma das habilidades mais preciosas nesses dias de pressão constante pelo novo, o disruptivo, é saber entrar na onda na hora certa. E com a prancha certa.

Na minha interlocução constante com as agências pelo Brasil, é perceptível uma angústia para saber qual o modelo ideal a ser implementado e com quais ferramentas. Já vi muita gente quebrar a cara – ou, para continuar na analogia com o surfe, levar uma vaca – por acreditar em demasiado no potencial de uma nova tendência. 10 anos atrás, o que mais se apregoava nos seminários e workshops era a morte das agências que não mergulhassem de cabeça no mundo digital.

Não deixava de ser verdade, mas, aquelas que acreditaram piamente no apocalipse, tiveram a amarga experiência de ver sua lucratividade reduzir drasticamente, a ponto de praticamente não viabilizar o novo formato. E lá foram elas, dar um passo atrás, e voltar ao modelo dito “tradicional”. Quantas e quantas agências partiram para experiências erráticas de modelos de negócios só para se mostrarem mais moderninhas e antenadas.

A conclusão a que se chegava é que, na verdade, não se tratava de jogar a velha prancha fora, mas, isso sim, surfar as novas ondas com duas pranchas, uma tradicional e outra mais radical, de quilha menor, para permitir movimentos mais rápidos.

A conclusão que se chega é que devemos conter o ímpeto e saber montar uma equação que conjugue o tradicional com o inovador, o offline com o online, o disruptivo com o permanente. Sim, porque, por mais que sujam novas ondas a todo momento, há ainda um oceano azul imenso de oportunidades, a ser explorado simplesmente com a adoção da velha e boa intuição e criatividade.

Apesar da avalanche adtech ou martech ou alguma coisa tech, que nos faz acreditar na mágica dos dados e dos algoritmos, está se chegando à conclusão de que tudo isso não funciona sem uma boa carga de valores humanos. Veja o que ocorreu em Cannes este ano. A maioria dos cases vencedores, não importando a categoria, estava carregada de ativismo social, com marcas dispostas a ter um protagonismo no movimento por um mundo melhor. Não se trata de ignorar tendências ou abrir mão dos recursos inovadores ou da capacidade de processamento de dados, mas de usá-los de forma sensível e humana.

Foi o que fez, por exemplo, a Carlings, marca de moda que atua na Escandinávia, criando roupas virtuais, que você pode comprar e vestir apenas para fotos virtuais e fazer bonito no Insta com uma roupa diferentona.

Assim, as pessoas evitam o consumo abusivo de bens, que são descartados na próxima onda da moda. Ah! E a renda com as roupas virtuais vai para uma instituição voltada à proteção da água no planeta (Water Aid).

Outro exemplo foi a atitude da Ikea (sempre ela!) de desenvolver acessórios que podem ser obtidos em impressão 3D para pessoas com deficiências. Sofás muito baixos são um obstáculo importante para algumas pessoas com deficiência. Que tal oferecer extensores de altura que os próprios interessados podem produzir em impressoras 3D e aplicar nos pés dos sofás?

Outro exemplo ainda é o da Doconomy, da Suécia, que oferece um cartão de crédito cujo limite não está baseado na sua capacidade financeira. Na verdade, o limite é a pegada de carbono que os itens que você adquire com o cartão deixa. Atingiu um limite de emissão de carbono preestabelecido, suas novas comprar são impedidas. O que essas empresas têm em comum é o genuíno interesse por um mundo melhor.

Mas sem deixar de visar lucro. Essas atitudes não são excludentes. O que elas têm também em comum é que todas ganharam Grand Prix no Cannes Lions deste ano. Será essa uma tendência firme? A se julgar pelos Grand Prix deste ano, sim. Afinal, mais de 80% dos cases vencedores têm essa pegada ativista.

Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional das Agências de Propaganda) (alexis@fenapro.org.br)