Segmentos profissionais que se desestruturam corporativamente sofrem consequências dramáticas na sua condição de cobrar com segurança o valor que atribuem ao produto de seu trabalho. Essa desestruturação costuma ser resultado da reestruturação corporativa de quem paga, com o objetivo de não pagar mais o que vinha sendo cobrado.

Uma equação perversa que, no longo prazo, desorganiza o mercado sem benefícios notáveis, além de uma simples diminuição de custos, confundida equivocadamente com uma requalificação de investimentos.

Gastar menos não aperfeiçoa o critério dos gastos, quando busca apenas reduzir valores. Ao diminuir-se o valor de um serviço, usando uma medida incompatível com uma avaliação adequada desse mesmo serviço, ele também se desobriga de seu valor. Principalmente quando o comportamento reativo se impõe com o objetivo de resistir ao peso das novas métricas, estabelecidas a partir de decisões unilaterais.

A tendência nesse caso é uma corrosão inevitável em todo o sistema, pois organizações são montadas, historicamente, sobre uma base confiável de precificação. No momento em que essa “chave” é repentinamente desligada começa um “desarme” em cadeia semelhante ao dos sistemas elétricos. Quanto mais tempo esse desligamento for mantido mais esse desmonte se estenderá até o blackout total.

Por conta do decorrente “apagão” econômico-financeiro nas relações entre agências e anunciantes, o negócio brasileiro da propaganda vem sendo completamente descaracterizado na última década.

Depois de muitos anos assombrando o mundo por sua incrível autossuficiência criativa e sua segurança em sustentar margens sólidas para o negócio, a “indústria” nacional do setor vê-se engolida por uma onda avassaladora de “práticas globais”: a desesperada corrida pela sobrevivência dos players internacionais, mergulhados na grave ameaça representada por acordos leoninos fechados com clientes gigantescos.

O ganho em escala virou uma questão de vida ou morte, deixando de existir negócios “pouco interessantes” ou “a serem observados para possibilidades futuras”. Tornou-se necessário fazer caixa onde quer que fosse. E rápido. Um tanto românticos, os brasileiros custaram a perceber o tsunami e acabaram atropelados pelos fatos. E fez-se pó da radiante propaganda brasileira. Como ocorre em todo pós-abalo devastador, começam a brotar e crescer “plantinhas” aqui e ali, mas de uma outra espécie, adaptadas ao “clima”.

À maneira dos cactos, por exemplo, cuidam de absorver e armazenar o máximo da umidade do ar para sobreviver às secas longas e tenebrosas. Florir, se possível. Agora mesmo, mais uma vez o Brasil comemora os tantos Leões que traz de Cannes, ocasião em que as agências se esforçaram em fazer da premiação – retalhada em diversas categorias técnicas que muito mais conversam entre si do que emocionam – notícia. É sintomático que, como em nenhuma outra época, acumular e noticiar Leões se tornou tão mais empolgante do que exibir as peças a que eles premiaram.

Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing (stalimircom@gmail.com)

Leia mais
O futuro somos nós
Reputação: o paraquedas de Tite