A proximidade dos times técnico, de design e de negócios do Magazine Luiza ajuda a entender o que é importante para o usuário (Divulgação)

A voz do outro lado do telefone tenta falar português para confirmar a aquisição de um produto, mas fica a sensação estranha de receber um contato internacional para checar uma compra feita no Brasil. Essa situação exemplifica um distanciamento que pode interferir na estratégia das marcas quando o assunto é UX – da sigla que quer dizer “user experience” ou experiência do usuário. Aqui, colocar produtos e serviços no coração do cliente é o “x” da questão.

Parte do CX – “customer experience” -, que compreende a jornada completa de interações do consumidor com a marca, o UX Design planeja experiências de uso capazes de introduzir os consumidores em ambientes amigáveis e funcionais, garantindo eficiência e aguçando desejos tanto no mundo físico como no universo online. “É fundamental que se crie um ambiente de intimidade”, alerta Mário Aoki, gerente de UX da agência Moringa.

Foi o que fez o Magazine Luiza. Com a ajuda da influenciadora digital Lu, a varejista tem no seu marketplace um território com a cara do brasileiro, estabelecendo uma conexão que vai além da compra. “A Lu tem um papel fundamental na construção da experiência do usuário e no vínculo da marca com o consumidor”, confirma Leonardo Lins, gerente de UX Design do Magazine Luiza. O diferencial da varejista é ter o cliente no seu core business, e a sinergia entre os times técnico, de design e de negócios é que garante a experiência multicanal.

Mas não basta oferecer o canal certo. Produto adequado, facilidade e conveniência ganham um peso tão elevado nesta composição de valor quanto o preço e a logística. “As entregas, muitas vezes, estão alinhadas a uma série de complicações que fazem do produto final algo não prazeroso”, lembra Marcelo Custódio, professor de gestão da experiência do cliente na pós-graduação da ESPM São Paulo.

Leonardo Lins, gerente de UX Design do Magazine Luiza (Divulgação)

O despreparo ficou ainda mais evidente durante o isolamento social imposto pela pandemia do novo coronavírus. Com a explosão do e-commerce, muitas empresas foram repentinamente obrigadas a fixar uma relação direta com os seus clientes, colecionando enxurradas de reclamações ligadas a falhas de atendimento e na entrega de produtos. “Já vínhamos percebendo o comportamento de mudança dos canais físicos para o ambiente digital antes mesmo da pandemia”, aponta Lins.

O acerto depende não só do investimento em programas de CRM, mas principalmente da habilidade de interpretar os dados e transformá-los em estratégias para a alavancagem das vendas. “O profissional de business intelligence (BI) deve perceber as minúcias dos dados, notando, por exemplo, o motivo pelo qual a pessoa vê o anúncio, mas não concretiza a compra”, indica Aoki.

No Magazine Luiza, os dados quantitativos sinalizam o comportamento dos consumidores, mas é da análise qualitativa que as hipóteses são confirmadas, utilizando entrevistas profundas e testes de usabilidade. “A magia acontece nesses dois momentos. Observamos, por exemplo, como o usuário interage com o nosso aplicativo. O desafio é ter uma ferramenta relevante para o dia a dia do usuário. Conexão emocional é importante”, enumera Lins.

Aplicativo do Sebrae ganhou novas funcionalidades e um plano para refinamentos futuros em projeto de UX criado pela Moringa (Divulgação)

As informações coletadas permitem que as marcas compreendam as diferentes jornadas de uso, ancorando ações pensadas para atender às necessidades das pessoas nos canais mais convenientes. “A interação pelo WhatsApp é uma das que mais crescem”, sublinha Aoki.

Da Moringa, vem o exemplo do aplicativo do Sebrae. No início do ano, a agência começou a investigar os cenários que cercam o app e propôs melhorias de interface baseadas em entrevistas e testes de usabilidade aplicados com clientes reais. Foi assim que a nova versão do app, lançada no último mês de outubro, ganhou novas funcionalidades e um plano para refinamentos futuros.

“Produtos são projetos que demandam atenção constante, pois sempre há espaço para revisões”, adverte Aoki. Segundo o executivo, o ambiente online precisa transmitir segurança e idoneidade. “E pode também utilizar uma linguagem mais humana, como seria na loja física”, emenda. Inteligência artificial e algoritmos também devem ser contemplados para garantir ofertas individualizadas e programas que realmente consigam abraçar a fidelidade do cliente e ainda render a lucratividade esperada pelos acionistas.

“Há muitas empresas interessadas em coletar dados e melhorar a experiência de uso, mas poucas admitem estarem capacitadas para isso”, pondera Custódio. Quem puxa as inovações são as empresas do mercado de varejo, setor altamente sensível à conversão. Mesmo assim, a iniciativa para erguer um ambiente omnichannel parte das companhias de grande porte concentradas nos principais eixos urbanos do país. Pequenos e médios empreendimentos tentam executar o trabalho artesanalmente, cenário que aponta para o potencial de crescimento do mercado de UX nos próximos anos.

Mário Aoki, gerente de UX da agência Moringa (Divulgação)

A busca de preparo para a mudança abre novas oportunidades, inclusive no mercado de trabalho na indústria da comunicação. “Já vemos profissionais especializados em monitoramento de redes sociais migrando para a área de BI pela projeção de crescimento do UX”, conta Aoki. De acordo com estudos da consultoria Nielsen Norman Group, referência mundial em UX, o número de profissionais desse segmento deve passar de um milhão em 2017 para 100 milhões até 2050 globalmente.

Atentas ao crescimento da disciplina, as agências firmam parcerias com empresas especializadas para que também elas possam experimentar a evolução de um negócio cada vez mais empenhado em criar vivências inesquecíveis. “Trade, fidelização, relacionamento, costumer experience e costumer science são os principais aliados das agências”, destaca Custódio. Com decisões nem sempre racionais, afinidade é essencial para lançar produtos e serviços. “A maturidade chegou para as agências. Os designers começaram a entender mais os números”, concorda Leonardo Lins.

A expansão coloca o UX até mesmo na mira dos investidores. A consultoria DUXcoworkers acaba de lançar o programa de aceleração StartUX, que promete conectar projetos inovadores e de impacto social a fundos de investimentos. O potencial vai longe. A expectativa é que os trabalhos centrados na experiência do usuário possam incrementar a criatividade no empreendedorismo brasileiro.