A persistente confiança no impresso é um tema que permeia a mídia no Brasil e no mundo. A reboque do especial que PROPMARK publicou na semana passada sobre o assunto, Fábio Gallo, presidente da Associação Nacional dos Editores de Revistas (Aner), dá sua visão nesta entrevista exclusiva para nosso portal.

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O jornal  impresso  se mantém como o meio de comunicação mais confiável para os brasileiros, segundo a Pesquisa Brasileira de Mídia, do Ibope. Afinal, por que as pessoas confiam mais em edições  impressas  que no digital?

Gallo – É difícil responder a essa pergunta sem fazer um mergulho profundo nos hábitos de consumo de informação. Mas acredito que, por trás dessa preferência pelo impresso, há a questão do duradouro X efêmero. Os meios digitais ainda geram a percepção de que tudo surge e desaparece muito rápido. No impresso, a percepção é o contrário disso: o que foi registrado permanece, quase como um documento, um atestado. Esse é um ponto. O outro, mais importante, é a credibilidade que os títulos impressos construíram ao longo de décadas. São veículos testados e aprovados, a cada dia, semana, quinzena, mês, pela audiência. Num ambiente no qual somos bombardeados por informação – muitas delas falsas – isso faz toda a diferença. 

Apesar da onda de blogueiros e influenciadores digitais, uma matéria bem apurada continua trazendo valor para os leitores e anunciantes. Não há como negar isso, certo? Como fortalecer esse ativo?

Gallo – Acredito que o jornalismo de qualidade – independente, com matérias bem apuradas e desenvolvidas, que escuta todos os lados da história – será cada vez mais necessário e valorizado pela sociedade. Blogueiros, influenciadores e jornalistas – de uma forma geral – fazem coisas diferentes. E, acima de tudo, têm interesses diferentes. O trabalho de um influenciador digital está muito mais próximo da publicidade do que do jornalismo. A sociedade sempre precisará de informação independente e confiável. E bom jornalismo se faz com bons jornalistas – profissionais preparados, com foco no interesse da audiência, não importando a linguagem ou a plataforma empregadas. Para fortalecer o bom jornalismo é preciso investir em pessoas. 

Que exemplos bem-sucedidos vc tem visto, no Brasil e fora, por parte de jornais e revistas, para fortalecer esse ativo?

Gallo – Acredito que a mídia brasileira, a despeito de todas as dificuldades conjunturais, tem investido nesse ativo. Basta ver o papel que os meios têm desempenhado na cobertura política. Fora do Brasil, o Washington Post, comprado há alguns anos por Jeff Bezos, é um exemplo de como a aposta em novas tecnologias e no bom jornalismo pode dar ótimos resultados. O New York Times é outro exemplo. E, recentemente, a viúva de Steve Jobs anunciou a compra da revista The Atlantic, justamente com o objetivo de manter a alta qualidade editorial da publicação. 

O bom jornalismo nunca vai morrer. Como ele se beneficia no cenário da chamada pós-verdade – e como ele pode ajudar o impresso a manter a relevância?

Gallo – A disseminação de informações falsas, com diferentes propósitos, sempre existiu. Mas esse fenômeno foi absurdamente expandido com a adoção maciça das redes sociais. A todo momento, somos bombardeados por informações cuja procedência e veracidade são duvidosas. Mais do que nunca, precisamos de veículos que dependem de sua própria credibilidade para viver. Um jornal, uma revista, uma rádio, um site – um meio de comunicação, enfim, não pode disseminar notícias falsas sem colocar em risco a sua sobrevivência. Há um compromisso explícito com a verdade. É esse compromisso que faz com que as pessoas recorram aos veículos – inclusive aos impressos – como guias nesse mar, muitas vezes hostil, de informação.

Qual a sua opinião sobre o jornalismo estritamente impresso, hoje?

Gallo – O jornalismo impresso continua a ter um papel importantíssimo, por tudo o que falamos até agora. Vivemos uma era na qual o indivíduo tem o poder da escolha. Se o jornalismo impresso continua a existir no mundo todo – e, em alguns casos, ainda mais forte do que antes – é porque o mercado quer que seja assim. Dito isso, é importante ressaltar que publishers do mundo todo trabalham para garantir que suas audiências possam escolher. O impresso, com suas particularidades, é uma plataforma entre várias outras. É preciso entendê-las e fazer bom conteúdo adaptado às características de cada uma delas. 

Como a Aner vem trabalhando o impresso, de maneira geral, junto ao segmento, e qual a visão da entidade a respeito do tema?

Gallo – Valorizamos o impresso como uma plataforma desejada e necessária ao mercado. Não é por acaso que ele continua a ser o principal pilar de boa parte das editoras associadas à Aner. Mas, como foi dito anteriormente, não acreditamos que uma plataforma de conteúdo deve se sobrepor a outras. Não temos a pretensão de escolher pelo mercado. Nossa filosofia é contribuir para que os editores sejam reconhecidos como produtores de conteúdos de qualidade, críveis, voltados ao interesse da audiência, adaptados a cada plataforma e ao interesse de cada segmento, de cada comunidade de interesses.