Mobile é a nova fronteira do Google
Em 2013, será a primeira vez que as buscas do Google vindas de dispositivos móveis ultrapassarão as feitas via desktop. E o gigante de buscas já iniciou sua empreitada para que anunciantes e agências entendam o potencial do segmento. No Brasil, onde há 27 milhões de smartphones, o mercado é visto como de enorme potencial. “O mercado mobile é global. As mesmas tendências estão acontecendo em todos os países”, afirma Peter Fernandez, diretor de mobile e social do Google para a América Latina. O executivo chegou ao país há dois anos, após a startup em que atuava, a Admob, criada no Vale do Silício, ser adquirida pelo Google em 2009. Nesta entrevista, Fernandez fala dos rumos do segmento nos principais mercados do mundo.
Mercado local
“O mindset padrão no Brasil é que estamos muito atrasados em matéria de tecnologia, de celulares, do segmento de mobile como um todo. Mas realmente não é assim. O mercado mobile é um mercado global. As empresas que vendem celulares são as mesmas em todos os países. Apple, Samsung, Motorola, LG e algumas outras: são elas inovando para o mundo inteiro. Por isso, exatamente as mesmas tendências estão acontecendo em todos os países. Creio que no Brasil, agora, em matéria de tecnologia, estamos um ano e meio atrás dos Estados Unidos. Mas estamos acelerando mais rápido que eles. Se você observar a penetração de celular hoje no Brasil, verá que é maior que a de celulares na Alemanha há um ano. Ela chegou a 13% de penetração e, um ano depois, o Brasil alcançou o mesmo índice.”
Dispositivos
“Os devices são cada vez mais poderosos e há várias razões para isso. A Apple foi quem inventou o smartphone real. Havia antes alguns modelos, com acesso WAP, que ainda existem, mas a navegação é pouco dinâmica. A Apple realmente inventou o primeiro smartphone porque deu a ele um browser completo e, por isso, os aparelhos hoje são como um computador. Mas ela ficou com a parte mais high-end do mercado. O Android é basicamente um sistema aberto, ou seja, qualquer fabricante pode utilizar. E há alguns players que fazem também aparelhos super high-end, como Samsung e seu aparelho Galaxy SIII. É o único que está realmente tirando market share do iPhone. Mas, depois, há outros, como HTC e LG, com portfólio grande, que dividem-se entre o high-end, mas também tentam capturar o segmento do mercado menos sofisticado. De qualquer forma, há todas essas empresas concorrendo entre si para vender smartphones para todo mundo.”
Consumo de dados
“As operadoras não podem mais contar com crescimento de planos de voz. Basicamente, todas as pessoas do país já têm uma linha telefônica e as empresas estão procurando outras formas de crescer. Venda de smartphones e de planos de dados são o modo principal pelo qual estão conseguindo crescimento de receita. Ao mesmo tempo, porque estão todas concorrendo entre si, o preço cai devido à abundância de oferta. Estamos vendo os preços diminuírem e os planos ficando mais acessíveis. Há sempre quem diga que temos uma base majoritariamente de pré-pago e que, por isso, não há força de consumo de dados. Mas isso não é verdade. A TIM, por exemplo, permite que planos pré-pagos deem acesso à internet. É fácil e barato.”
Ceticismo
“Realmente, o mercado de publicidade brasileiro é cético. Mas há cada vez mais pessoas muito visíveis no mercado dizendo que já é hora de abrir os olhos para mobile. Empresas como F.biz e Pontomobi mostram que há cada vez mais players disputando a liderança do segmento porque ele já é obviamente importante. Não é opinião, é fato, mas falta o amplo entendimento disso. O preço das ações de Google, Facebook e outras depende, agora, muito da percepção de qual será a estratégia mobile dessas empresas. Até Wall Street já acredita que mobile é superimportante. A questão é somente uma falta de entendimento. É por isso que estamos investindo tanto em programas para ajudar o ecossistema a correr atrás da realidade. Dados que lançamos sobre o segmento é para evidenciar que a importância de mobile deixou de ser opiniosa e hoje ela é fato.”
Brasil x EUA
“Até nos Estados Unidos é superfrustrante o entendimento das agências de publicidade sobre o quão estratégico mobile é. Muitas empresas norte-americanas não compreendem ainda. Mas o número no Brasil das que não acreditam ainda é maior. Porque há menos coisas ocorrendo no ecossistema ainda. E quando me refiro à ecossistema quero dizer a existência de criadores de aplicativos, agências entendendo a importância de mobile, desenvolvendo campanhas para seus clientes e comprando mídia mobile, além de anunciantes não só entendendo o valor estratégico do segmento, mas desenvolvendo proposta de valor distinta para mobile. Tudo é uma questão de desenvolvimento do ecossistema, que aqui ainda está em processo de aprimoramento.”
Buscas
“Hoje, 15% das buscas de Google Brasil são em mobile. Mas globalmente é bem maior. Neste ano, no mundo todo, pela primeira vez, o Google terá mais pesquisas vindas de dispositivos móveis que de desktops. Há seis meses, tivemos o primeiro país a ter mais de 50% das pesquisas vindas de mobile, o Japão. O iPhone foi lançado em 2007. Há cinco anos e meio, quando você saía da sua casa para ir visitar um amigo, você tinha que ir para google.maps.com e imprimir o trajeto. Ninguém imagina esse comportamento hoje e tal realidade é como um passado distante. E isso foi há cinco anos! Tão pouco tempo depois, o Google terá mais pesquisas vindas de celular do que de computador.”
Crescimento
“As tendências são para todos os mercados. Fundamentalmente, não há diferença entre Brasil e Japão. Dentro de alguns anos, todo o país terá 100% de penetração de smartphones. Ninguém pode prever quantos anos exatamente isso demorará para ocorrer, mas será muito mais rápido do que imaginamos. O progresso não é linear. Se olhar nos gráficos de penetração de celular no mundo, há uma curva exponencial. Se algo demorou um ano para ocorrer, o próximo fato em mobile não levará um ano, mas seis meses. E o desenvolvimento tem sido sempre assim, exponencialmente. Todos os dados mostram isso de forma clara.”
Potencialidades
“Em muitas empresas, existe a percepção de que mobile não gera impacto nas vendas. Do lado de branding, já é bem-aceito pelas grandes marcas que mobile é um canal fortíssimo, por vários motivos. O potencial de interação com um anúncio em mobile é muito maior do que em um computador. O mobile permite muitas funcionalidades, há resposta em tempo real a movimentos, há experiências e a possibilidade de explorar a tela sensível ao toque. Do outro lado, para anunciantes que se preocupam com geração de receita, existe uma percepção de que mobile não dá certo. Mas realmente não é isso. Há várias ações que anunciantes do país têm que fazer para observar que o ROI existe. Casos que já vi: anunciante faz campanha em mobile mandando usuários para um site desktop. E depois reclama que ninguém compra o produto ofertado! Não é que não funciona, é que a experiência que se está dando para o usuário não é adequada.”
Geração de negócio
“Na outra ponta, há vários exemplos de empresas com experiências bem-sucedidas. Um caso no Brasil é a Netshoes. Basicamente, eles disseram para nós: sempre que alguém estiver pesquisando no Google sobre qualquer produto e esse usuário estiver localizado a 0.5 km de um shopping, inferimos que ele está, na verdade, dentro de um shopping, comparando preços. Talvez esse usuário esteja dentro da loja Centauro, checando se o produto está mais barato na internet. Neste caso, Netshoes quer mostrar um anúncio, com uma oferta, dizendo “temos esse produto com 10% de desconto”. Dessa forma, eles receberam CTR superalto, bem mais do que a média de desktop, porque o usuário estava definitivamente no momento da compra. As implicações disso são enormes. A Netshoes está conseguindo capturar compras que o usuário quer fazer no mundo real com uma estratégia mobile. Neste ano, 10% da sua receita virão de compras feitas via dispositivos móveis.”
Mundo ideal
“Nosso mundo ideal é que 100% das empresas tenham, não somente site mobile, que funciona bem, mas também proposta de valor bem pensada para o segmento. Todas as companhias de viagem deveriam oferecer produtos um tanto diferentes sabendo que o comportamento de compra de última hora é muito forte no mobile. Não dá para simplesmente adaptar o que você faz na internet para smartphone porque há diferença comportamental no uso dos devices. E seus consumidores, que estão fazendo buscas no mobile, têm demandas diferentes de quando estão no desktop.”
Futuro
“Nos anos 1990, houve muitas empresas que falharam porque foram desestabilizadas pela internet. As lojas de música falharam. Mas também em varejo há vários exemplos de empresas que foram desbancadas pelo e-commerce, com o surgimento de companhias como Amazon, com serviços mais convenientes e mais baratos na internet. Exatamente a mesma coisa está acontecendo agora, só que o que ocorre com mobile é dez vezes maior do que o que houve com a internet. Só há dois bilhões de pessoas acessando a internet e os outros cinco bilhões irão começar no futuro próximo, mas o farão a partir do celular. O consumidor vai cada vez mais escolher quem oferece um serviço eficiente em mobile e as que se adaptarem terão sucesso. Por isso, não me preocupo: vamos chegar no mundo ideal que projetamos.”
Evangelização
“Fazemos um trabalho extenso de evangelização nas agências. É importante grifar que minha equipe não funciona como uma força de vendas para mobile. Na verdade, as equipes que cuidam de setores específicos, como varejo, são responsáveis por visitar o cliente, resolver seus problemas, dar apoio à campanha, independentemente da plataforma. Temos a mesma solução para agências. Há, por exemplo, a equipe que cuida de todas as empresas do grupo WPP. Nossa evangelização existe na forma com que eu e minha equipe educamos as outras que cuidam do dia a dia com agências e clientes. Ainda fazemos webinars, workshops e palestramos em grandes eventos onde há empresas de publicidade. Temos ainda iniciativas como prover informação: no ano passado, lançamos a pesquisa ‘Our Mobile Planet’ no Brasil e criamos um site com dados sobre o segmento.”
Próxima onda
“Há uma onda que chamamos de ‘wearable computing’. Muitas pessoas hoje estão utilizando o iPod Nano como relógio e, na internet, há empresas vendendo pulseiras para se utilizar o aparelho dessa forma. Sem a Apple ter essa intenção, há pessoas fazendo uso dessa ‘tecnologia vestível’ e, na verdade, muitas das fabricantes de celular estão empenhadas em desenvolver relógios que sejam não somente celular, mas que funcione como um computador pequeno. Google Glasses, por exemplo, segue a mesma lógica de ‘wearable computing’. Realmente, achamos que a próxima tendência de mobile será isso: computação como extensão do corpo. Os celulares já são um tanto assim: eles estão conosco 24 horas. É um relacionamento simbiótico. Progressivamente, os devices estarão cada vez mais próximos do corpo humano.”