No amor e na propaganda

Geraldo Alonso foi um empresário de grande competência, além de um líder do setor, pois participou com grande destaque de diversas iniciativas que deram a nossa profissão dimensão e dignidade. A Norton, que ele fundou, foi uma das grandes agências nacionais e concorrente poderosa das multinacionais que funcionavam no país. Mas não seria justo que eu me arvorasse em biógrafo do Geraldo, pois sua história pode ser melhor contada por inúmeros contemporâneos dele. O problema é que, ao lado do homem de empresa, havia um Geraldo folclórico e seus amigos e admiradores, quando chegam no capítulo “causos do Geraldo”, se esquecem do viés histórico e dedicam-se a falar do vastíssimo anedotário.

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Lula Vieira é publicitário e sócio da Mesa Consultoria

Outro dia foi assim. Estava tranquilamente no Lorenzo Bistrô, comendo um franguinho caipira, quando encontro o grande Senador, apelido carinhoso do jornalista Rogério Monteiro, com a família toda, também se dedicando ao nobre esporte da alcoolização civilizada. Vai que daí chegou a inevitável hora de eu pedir historinhas para contar aqui procês, um hobby que me diverte há muitos anos, mas que, de vez em quando, me angustia, diante da perspectiva de não ter o que escrever.

Graças a Deus meus amigos são chegados a um papo e não se negam a se lembrar de boas histórias. Alguns, vindo em meu auxílio, até inventam algumas coisas, cobrindo casos banais com o manto diáfano da fantasia. Tudo igual ao jornalismo e aos historiadores. Voltando à minha mesa no Lourenzo Bistrô, antes que eu fale mal de alguma outra profissão.

Contava-me o Senador uma história do Geraldo Alonso realmente deliciosa. Segundo ele, o Geraldo vinha pela Praça Roosevelt, em São Paulo, quando é abordado por um senhor muito bem-vestido que, com um papel na mão, mostra evidente dificuldade de se orientar. Diz o desconhecido: “Señor, por favor, donde se quieda la compania McCann-Erickson?”. Geraldo tem uma inspiração e responde na bucha: “Não procure o McCann. Não faça isso. Venha até a Norton, que é uma agência muito melhor, mais criativa, mais rápida e ainda por cima conhece muito melhor o mercado brasileiro!” E arrasta o espanhol para o Edifício da Norton, logo em frente. O cara podia ser cobrador, vendedor, corretor de seguros, mas o Geraldo intuiu que poderia ser um cliente. E mais, que a sua impetuosidade poderia impressionar o gringo. Pois deu certo e foi uma das contas mais lucrativas da Norton.

Eu devia – obrigação de bom repórter – ter anotado o nome do cliente. Mas confesso que não era a primeira taça de vinho e eu me esqueci de escrever e agora já não me lembro. Até porque, pensando bem, não sou nem repórter. Como tenho de entregar a coluna logo na terça, vai assim mesmo, com a minha promessa de ligar amanhã pro Senador e pedir mais detalhes para completar. O que importa é que a história mais uma vez prova a velha teoria de meu chefe na Young, o Joe de Deo: tudo é válido para se ganhar uma conta.

Papo que segue e chega Maurício Cabral, filho de Sérgio Cabral, que completa o profundo pensamento garantindo que, além da disputa de uma conta, no amor também é permitido lançar mão de qualquer expediente. E, como exemplo, ouço a narrativa da mais bonita cantada que alguém já deu. Pois, quando solteira, a futura mãe dele, Maurício, foi eleita Miss Vitória e o jovem Sérgio foi destacado para entrevistá-la. Cabral fez uma reportagem fantástica, inclusive destacando os dotes intelectuais da moça, muito acima da média das misses daquele tempo.

Matéria que até mesmo fugia dos padrões do JB, que costumava olhar estes concursos com um certo preconceito intelectual. Mas, perdidamente apaixonado, Sérgio tratou a moça como um misto de beleza, altíssima inteligência, profunda cultura e excepcional sensibilidade. E ainda completou com um aviso aos interessados em tantos encantos: ela namorava um jornalista. Claro que recebeu um telefonema indignado da entrevistada. Não pelo conteúdo geral da matéria, mas pela história do namoro com um jornalista. Tentando provar o tremendo engano do Sérgio, Magali (a miss) pergunta: “então me diga, qual o jornalista que eu namoro?” Sérgio responde na bucha: “Eu!” Estão casados há 43 anos.

Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor