Nova lei salva o ano das produtoras

 

Se o ano de 2013 não foi de um crescimento tão pujante para a publicidade como nos anteriores, e com reclamação geral do setor em relação a uma infinidade de burocracias, o audiovisual teve sua válvula de escape. A Lei da TV Paga (12.485/2011) finalmente decolou e sobrou trabalho para as principais produtoras do mercado. Algumas delas, já referências na publicidade brasileira, rodaram inclusive seus primeiros longas-metragens. Caso da Cine, com “Ninguém ama ninguém… por mais de dois anos”, dirigido por Clovis Mello, e a Paranoid, com “Serra Pelada”, de Heitor Dhalia. “Inauguramos ainda nosso novo hub de pós-produção e efeitos especiais: a Cine X”, afirma Raul Doria, sócio e produtor-executivo da Cine, que cresceu 13% no ano.

Quem também inaugurou um novo braço foi a O2. Denominado Novas Telas, engloba tudo que está fora da publicidade convencional de comerciais. “Já tínhamos uma demanda forte para outros tipos de experiências, como websérie, interatividade, museus, projeções especiais, games e outras coisas. Decidimos então montar uma estrutura para atender e produzir esse tipo de job que requer, além de experiência, também pesquisa”, explica Andrea Barata Ribeiro, sócia e produtora-executiva da empresa. “Com a Lei da TV Paga, fizemos sete séries em um ano. Isso representou um crescimento de mais de 40% na área”, completa.

Na Conspiração, o núcleo de TV também teve um crescimento substancial. “Neste momento, temos 27 programas, sendo nove séries de dramaturgia em fase de desenvolvimento, produção ou fechando negociação. Estamos com uma equipe grande de roteiristas fixos: são 11 só para a TV e, por isso, conseguimos cumprir os prazos das emissoras e produzir com qualidade”, afirma Gil Ribeiro, que assumiu a presidência da produtora em março deste ano e revela que a empresa deve crescer 20% sobre o faturamento de R$ 130 milhões atingidos no ano passado. “Para 2014 a meta são R$ 180 milhões”.

Para a Dogs Can Fly, a Lei da TV Paga proporcionou serviços de produções como programas de TV, nacionalização de conteúdos internacionais, séries de cápsulas para os breaks comerciais e projetos de branded content. “O interessante de tudo isso foi a obrigação de investir em profissionais, fortalecendo os departamentos de criação de conteúdo, de produção e de pós-produção da produtora”, ressalta José Henrique Caldas, sócio e diretor-executivo. “Crescemos 25%, mas a área de entretenimento teve um aumento de 100% em relação a 2012, principalmente pelo volume de produções decorrentes da lei da cota nacional na TV paga”, enfatiza Edu Tibiriçá, sócio e produtor-executivo da BossaNovaFilms.

Hungry Man e Prodigo Films também vão na mesma linha. “Ter começado o ano com a abertura da área de Cinema & TV foi muito bom, sendo que a realização de oito séries para televisão no primeiro ano de atuação neste segmento foi uma grande surpresa para nós”, diz Alex Mehedff, managing partner da Hungry Man. “O ano de 2013 foi o melhor ano da história da Prodigo. Nosso faturamento total cresceu 20%, sendo que o conteúdo cresceu 100% e já representa 25% da receita”, revela Francesco Civita, sócio da produtora, que apresentou mais de 40 projetos na área de conteúdo.

Em contrapartida, Hugo Janeba, CEO da Mixer, acredita que medir os impactos da lei e do aquecimento do mercado brasileiro só será possível, de forma séria e com resultados reais, nos próximos 12 ou 18 meses. “Os projetos de conteúdo e entretenimento, diferentemente da publicidade, têm ciclos de desenvolvimento e de produção mais longos”, ressalta.

Já na Sentimental, apesar do crescimento do conteúdo, a grande “estrela” foi a boa e velha publicidade. Sócio e diretor-executivo da produtora, Marcos Araújo lembra que a empresa conquistou todos os principais prêmios nacionais e internacionais do mercado, trabalhando para as principais marcas e agências do país. “Campanhas memoráveis foram produzidas”, diz, citando trabalhos como “Vem pra rua”, para Fiat (criado pela Leo Burnett Tailor Made); “Alma”, para Leica (F/Nazca S&S); “Pode ser”, para a Pepsi, e a série da Visa que traz a famosa indagação “Posso te falar uma coisa?”, ambas da AlmapBBDO.

Burocracias

Mas nem tudo são flores no audiovisual brasileiro. Prazos de pagamentos estendidos pelos clientes, custos altos, dificuldades para filmar em alguns lugares e diversas burocracias foram citados como entraves do setor. “Além da oscilação do mercado nos primeiros meses do ano, tivemos também diversos problemas com atrasos de pagamento”, afirma Regiani Pettinelli, head of sales da Movie&Art – que no geral teve um ano bem positivo, com a parceria com a produtora argentina Landia, abertura de escritório em Brasília e a formação da A+Movieart Rio, que marcou a chegada do novo sócio – o produtor-executivo Antonio Carlos Accioly. “Esperamos seguir esse ritmo em 2014, aproveitando as oportunidades de negócios que surgirão, principalmente relacionadas à Copa do Mundo”, completa a executiva.

Sócia-diretora da Zohar Cinema – talvez a mais “internacional” entre as produtoras brasileiras –, Isabelle Tanugi diz que a burocracia constante e a dificuldade em atender bem por falta de infraestruturas próprias ao mercado por parte das prefeituras do Rio de Janeiro e de São Paulo, bem como o aumento dos preços das equipes e dos equipamentos foram alguns dos problemas enfrentados este ano. “Conseguir filmar virou uma façanha, um ato quase heroico de persistência e coragem. Já se foi o tempo em que produções internacionais vinham filmar no Brasil com prazer, custos justos e soluções amigáveis. Agora, só se vêm rodar aqui por pura obrigação de roteiro e mídia”, ressalta. “As agências e clientes também continuam cobrando agilidade e milagres em cronogramas por parte das produtoras. Não vejo nenhum ponto positivo para o mercado em 2013. Nenhum avanço tecnológico e nem político. Só burocracia e mais burocracia”, completa.

Mesmo tendo apresentado um bom crescimento de 20% este ano e se consolidando como uma das produtoras mais premiadas do mercado brasileiro, Egisto Betti e Tatiana Quintella, sócios e produtores-executivos da Paranoid, concordam com Isabelle. “A dificuldade de se filmar na cidade de São Paulo vem se acentuando cada vez mais”, afirmam.

Outro ponto lembrado foi a “lei da oferta e procura”. “Os custos de produção não param de subir, ao mesmo tempo que as mesas de compras dos anunciantes  se utilizam de estratégias cada vez mais agressivas para redução dos preços”, ressalta Raul Doria, para quem o aumento da produção na área de conteúdo absorveu a mão de obra da produção de filmes publicitários, ao contrário do que acontece nos Estados Unidos. “Precisamos com urgência formar mais mão de obra e incrementar o parque técnico. Como isto não se faz da noite para o dia, há a necessidade de um mínimo de compreensão das mesas de compras, e muito mais paciência dos sindicatos”, conclui. “Tivemos um aumento desproporcional do custo de mão de obra em um mercado despreparado para o crescimento atual”, diz Gil Ribeiro.

Por fim, Dimitria Cardoso, diretora de atendimento da Dínamo Filmes, diz que, apesar de um ano bom para produtora, 2013 foi inconstante. “Começou muito bem, mas por alguns meses sentimos uma quebra no fluxo de pedidos de orçamentos e de jobs. Talvez pelos protestos, talvez pelo PIB menor que o esperado”.