O velho e o atum

Definitivamente estou ficando velho. Não é frase de efeito, não é metáfora. Constato que estou ficando velho com a saudade de quem dava duas sem tirar de dentro. Essa capacidade (ai de mim, já tive!) é a mesma que me permitia subir escadas sem segurar no corrimão. Dançar a noite inteira. Olhar para meu pau com intimidade. Coisas muito importantes que faziam parte de minha juventude e que perdi.

Dói muito se descobrir velho. Assim como doía muito ser jovem. Porque viver dói muito. A diferença é que a juventude dói de outro jeito. Há uma vida pela frente. A dor da velhice é que há uma morte pela frente. A arrogância do jovem é a mesma do velho. Um acredita que sabe de tudo porque não entende o mundo de merda em que foi obrigado a viver e se sente incapaz de mudá-lo. O outro acha que já assistiu aquele filme. Ele também foi jovem e sabe que o buraco é infinitamente mais em baixo.

Mas por que estou falando isso tudo? Porque fui convidado a sair de casa para ir à casa de um jovem que fez um tartar de atum com gergelim. E me senti extremamente cansado. Cansado porque estou ficando velho. E não posso imaginar que um brasileiro numa tarde de domingo fique tão enlouquecido que seja capaz de cozinhar para sua amada um atum com gergelim. Ou isso é o símbolo de uma nova era, ou chegou uma nova era que não foi feita para mim.

Nada contra atum com gergelim. Juro por Deus que não. Mas será que é isso mesmo que estou vivendo? Tartar de atum é sonho de consumo? Pode ser, deve ser. Mas, como estou ficando velho, definitivamente velho, fico meio aterrorizado. Tartar de atum não passa de um peixe cru cortado em fatias. Isso é o que se serve numa tarde de domingo em família? Ninguém que vai comê-lo vai se lembrar de velhas tardes da infância, a não ser que seja um japonês. Que, diga-se de passagem, jamais teria tartar de atum como comidinha básica numa refeição familiar de domingo.

Ficar velho é fogo. Fica ranzinza como um adolescente. E se ficar muito velho fica chato como uma criança. Mas, nesta tarde de domingo, eu e meu gato castrado (há mais do que se pode pensar de parecências entre meu gato e eu, tirante a castração) estamos aqui sentados, pensando que um fim de tarde ouvindo música e bebericando um vinho possui seu valor. Ou seja, o que perdemos em virilidade, em subir escada sem segurar no corrimão, é recompensado por uma certa paz. Com alguma dureza eu diria que é a paz do castrado.

Sim, me dói. Já disse. Mas, se me lembro da época que meu pau ficava duro durante horas, e eu fui assim, como todo mundo (ai de mim!) não havia paz. O que poderia haver era esperança. Para um velho, a esperança se resume em viver sem dor e que exista alguma recompensa por este sofrimento todo. Acabo de me recusar a ir comer tartar de atum com gergelim. Acabo de me recusar a viver neste mundo maluco. Estou inapelavelmente velho.