A Miss Santa Catarina e o marketing da resistência

Quando o marketing é tratado com sabedoria, passa a ter serventias diversas, que vão muito além de seus óbvios propósitos comerciais ou eleitorais. Torna-se, por exemplo, uma ferramenta poderosa a ser utilizada na afirmação de um posicionamento político-cultural.

Nesse sentido, Santa Catarina acaba de nos dar um exemplo contundente de ação oportuna, necessária e urgente.

Injustamente envolvidos no discurso nefasto de uma minoria, que tenta fazer crer que o estado é terreno fértil para a proliferação de ideias abomináveis, como o nazismo e o racismo, os catarinenses acabam de dar uma resposta exemplar à sociedade brasileira: elegeram uma miss negra para representá-los.

Ou seja, transformaram um costumeiro concurso de estética, de limitado alcance regional, num excepcional momento de manifestação pública nacional pela ética.

Fazer a leitura precisa de um contexto negativo e transformá-la em uma ação positiva, através de um concurso de miss - evento clássico de marketing -, foi extremamente inteligente e adequado.

A beleza da jovem Pietra Travassos, de 18 anos, eleita Miss Santa Catarina, extrapolou os limites do olhar convencional, ao situar-se num ambiente e numa circunstância carregados e conduzidos pela beleza do pensamento inclusivo.

Nasceu, assim, um propósito verdadeiro para um evento que vinha perdendo significado ao longo dos anos, exatamente por insistir num modelo com cada vez menos valor moral e social: a etnia de colonizadores, como indicador de padrões de beleza.

A coragem da decisão, é claro, gerou uma reação contrariada da parcela preconceituosa da sociedade.

O que, aliás, era perfeitamente previsível e se mostrou de grande utilidade, ao expor e identificar prováveis criminosos, além de revelar a verdadeira dimensão do preconceito e os limites do seu significado.

Mais importante, no entanto, foi a oportunidade dada a brasileiros de todo o país para, juntos com a imensa maioria dos catarinenses, saudarem com entusiasmo a decisão tomada, e formarem uma vigorosa corrente de resistência ao racismo.

A eleição da Miss Santa Catarina 2025 deve inspirar novas iniciativas com a missão de contrapor políticos e influencers que andaram contaminando as mídias digitais, com discursos de alertas discriminatórios àqueles que desejavam viver no estado.

Felizmente, seus vídeos têm sido ridicularizados pelo Brasil afora, embora essas mesmas críticas ainda continuem, em parte, recaindo, injustamente, sobre toda a população.

É preciso fazer mais, utilizar todo o poder das ferramentas de marketing, para que o estado se liberte de estigmas, recentemente avivados, e volte a ser percebido exclusivamente por suas históricas, incontáveis e inquestionáveis qualidades geográficas e humanas.

Talento para isso não falta aos profissionais de comunicação catarinenses.

Bem-vindas, portanto, campanhas que enalteçam a Santa Catarina verdadeira, a Santa Catarina representada pela maioria da sua população.

Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing (stalimircom@gmail.com)