A premonição de Caetano mais que confirmada

Inspirado nos escritos dos muros da cidade de Paris, onde no mês de maio de 1968 os estudantes percorriam a Champs-Élysées bradando por liberdade, Caetano Veloso ingressa no palco do Festival da Canção daquele mesmo ano, em companhia dos Mutantes,  cantando ‘É proibido proibir’...

De certa forma, um exercício premonitório do que acontece hoje. Não é que é proibido proibir. É impossível proibir, por mais que os alucinados e carcomidos ministros do Supremo tentem. O tsunami tecnológico, pela disrupção estrutural, e colocando tudo a baixo muito especialmente as proibições, zerou tudo, e, agora, tudo pode e muito mais.

Até anos atrás, meses atrás, dias atrás, ainda comentávamos sobre a proibição dos jogos de azar. A eventual volta dos casinos. E, enquanto isso, e através da disrupção, toda uma megaindústria de “games”, exercitados e praticados todos os dias por vovós e vovôs, mais pais e mães, mais filhos, mais netos, que em determinado momento insinuava a venda de alguma coisa, a possibilidade de algum tipo de aposta, não sem sair de casa, sem sair da cadeira... e resgatando para os jogos duas ou três gerações já consideradas perdidas, e preparando todas as novas gerações para a volta acelerada da jogatina. Pra que a volta dos casinos, se podemos jogar direto da cama, ou do sofá? Pra que comprar em lojas de rua se em minutos o que queremos chega em nossas casas?

Começamos, nesse retorno, pelos games, e nos descobrimos, agora, no negócio das Bets. Só mudou o “sexo”. E essa reflexão, com poucas ou quase nenhuma diferença, vale para todas as demais atividades e negócios.

Se quando Caetano bradou ‘É proibido proibir’, não era bem assim, agora é. Estamos, todos, mergulhados até o último fio de cabelo, na maior crise estrutural da história da humanidade. Uma crise total e silenciosa, que remete ao slogan da Persico Pizzamiglio, lembram, “você não vê, mas, estamos aí...”.

Cessa a causa, cessa o efeito
E aí, literalmente, do dia para a noite, e em decorrência da pandemia, algumas empresas decolaram na vertical e nem o céu parecia ser o limite. Hoje, essas empresas de impulso inicial espetacular, contabilizam perdas definitivas e em igual proporções. Com perspectivas mínimas de recuperação.

Poucas empresas foram mais comentadas, saudadas, glorificadas, na pandemia, que o Zoom. No ano da pandemia, quando o Zoom mal engatinhava e com uma série de problemas, conseguiu a proeza de ver suas ações decolarem na vertical e, em poucos meses, acusarem uma valorização de 765%. E vieram outras empresas, outras soluções, algumas das big techs muito menos por vontade específica, mas muito mais para preservar territórios decidiram investir na comunicação corporativa a distância, e o Zoom foi perdendo sustentação, gás, e desde o final da pandemia seu valor de mercado reduziu-se a 20%. US$ 77 bi derreteram...

Outros dos Big Hits da pandemia, como a RingCentral, empresa de comunicações nas nuvens, que decolou com tudo e vai ficando pelo caminho. E uma Peloton, bicicletas ergométricas, uma referência dos tempos da pandemia, desde 2020 vê as suas ações desinflarem e hoje não valem mais do que 10% do que valiam há dois anos.

Em síntese, cessada a causa, cessa o efeito, e assim caem numa dramática realidade. E o que aprendemos e deveríamos assimilar e agregar a nossa sensibilidade e cultura essencial?

Que vivemos, de longe, a maior crise estrutural da história da humanidade decorrente do tsunami tecnológico. E que os planos que contam, de verdade, são os estratégicos, e não as oportunidades circunstânciais e decorrentes de eventualidade.

Que até podem trazer algum refresco no curto prazo, mas, cessada a causa cessa o efeito, as empresas caem numa trágica realidade e, muito pior ainda, agregam ao pensamento interno, a toda a sua equipe, a consciência do supérfluo, do irrelevante, do oportunista. Em muitas dessas empresas, a miopia incorpora-se, o que as condena, definitivamente, ao desaparecimento. O clima interno é de derrota, incompetência, ingenuidade. Poucas sobreviverão.

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing
fmadia@madiamm.com.br