Mais que recorrente a tentação das empresas de converterem músicos espetaculares de um único e mesmo instrumento, o grande campeão na flauta, ou no piano, tentando fazê-lo tocar, com semelhante sucesso, pandeiro, cuíca, reco-reco, tuba, saxofone, violino e tamborim…

E, por outro lado, quando uma empresa, por competência ou agraciada pelas forças das circunstâncias, consegue construir uma marca que ascende à condição de líder de uma categoria de produtos, duas notícias. A primeira e ótima, é praticamente imbatível em seu território de atuação. Em muitos casos, converte-se mais que marca de produto, em designação genérica de categoria. Tipo Durex, Chicletes, Gillette, Band-Aid, Yakult, Maizena e outras dezenas mais.

A segunda é péssima, jamais tente usar a marca para qualquer outro produto ou serviço, que o consumidor reagirá como a dizer: “chicletes, não encha o saco, concentre-se em ser goma de mascar…”.

Quem ouviu esse urro de revolta e protesto de seus consumidores e clientes seguidores foi a Yakult, quando decidiu converter-se em marca de cosméticos. Passou anos ensinando às pessoas o que era Yakult. Gastou fortunas falando dos lactobacilos vivos.

Conseguiu mudar o hábito das famílias, especialmente de crianças. Ocupou um espaço. Testemunhou perplexa seus principais concorrentes lançarem um produto similar e cansou-se de ouvir e divertir-se com as pessoas falando: “vou comprar um Yakult da Nestlé, da Vigor, Danone e outras marcas”.

Mas veio a tentação, faltou juízo, e queria porque queria que as pessoas acreditassem que Yakult era perfeito para abençoar produtos de beleza. Perdeu 10 anos, US$ 100 milhões, enfiou o rabo entre as pernas, e jogou a toalha. Encerrou as atividades de seu negócio de beleza e recusa-se a falar sobre o assunto.

Neste momento, quem assume tamanho risco e coloca em risco a sua marca campeã, Qualy, é a BRF, leia-se Sadia/Perdigão.

Depois de um processo de total qualidade que demandou 30 anos desde o lançamento, no ano de 1991, da Qualy Cremosa, tendo como suporte e lastro Qualidade de Vida, desde o fim do ano a BRF anuncia que recorrerá ao guarda-chuva e santo protetor Qualy para uma infinidade de novos produtos.

Na partida decolou, além das margarinas, com queijo, requeijão, pão de queijo e, surpresa, isso mesmo, com manteiga… Socorro! Vamos gritar de novo e bem alto, sooccccoorrrooooooo!!!

Qual a probabilidade de dar certo? Próxima de zero. E de dar errado, mais de 90%. Assim a BRF está dando um grande tiro no pé.

Teria sido muito melhor desenvolver uma nova marca para os produtos que pretendia e já lançou sob as bênçãos de Qualy, do que exaurir sua galinha de ovos de ouro, e/ou vaca leiteira. Só faltou a Qualy lançar Qualyada… Mas, sabe-se lá por quais razões, alguns executivos e empresas acreditam que vale a pena contrariar o aprendizado de décadas.

Que os deuses dos produtos e serviços apiedem-se de Qualy diante do desvario de seus gestores…

De que adiantam centenas de lições no correr da história do marketing, administração, negócios, se as pessoas recusam-se a aprender?

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing (famadia@madiamm.com.br)