Brasilidade, combustível para economia criativa
A criatividade é uma das habilidades do século e chave para os desafios da atualidade. Associada à economia, é fonte de desenvolvimento socioeconômico, criação de empregos e inovação tecnológica. Quanto mais a tecnologia avança, mais a criatividade humana se faz valiosa. Segundo o Fórum Econômico Mundial, até 2025 a automação vai eliminar 85 milhões de empregos no mundo, enquanto a nova divisão de trabalho, entre máquinas, humanos e algoritmos, vai criar 97 milhões. Mais do que nunca, o olhar criativo, que se alimenta do mundo para metabolizar novas ideias, torna-se necessário.
E, no quesito criatividade, o brasileiro brilha. Temos criatividade no DNA. Nascemos do sincretismo cultural e encontramos a nossa autenticidade na antropofagia. Em um contexto de escassez, recorremos à criatividade como resposta aos nossos problemas. Somos o país da gambiarra e da cultura “faça do seu jeito mesmo”.
Não à toa, os primeiros insights que temos da pesquisa Branding Brasil, uma iniciativa que estamos lançando em junho, que tem o objetivo de investigar como o brasileiro vê o valor do Brasil, aponta que a criatividade é a característica que reconhecemos como fortaleza. “Brasileiro é criativo, faz do limão uma limonada”. Aparece tanto nas coisas mais simples quanto nas grandiosas: são apontados como sinônimos de brasilidade as Havaianas reparadas com um prego (gambiarra) e a inventividade do nosso Carnaval.
A qualidade criativa também é o que impulsiona o nosso empreendedorismo e inovação. Só no ano passado, o Brasil registrou a abertura de 3,9 milhões de negócios. A economia criativa, que abrange os setores de consumo, mídia, cultura e tecnologia, representa hoje quase 3% do nosso PIB e movimenta, em média, R$ 171,5 bilhões por ano na economia, gera 6,6 milhões de empregos e é composta por mais de 140 milhões de empresas.
Hoje, o Brasil concentra 77% das startups e 70% dos investimentos da América Latina – região que, atualmente, tem o crescimento mais acelerado em volume de capital de risco no mundo –, já conta com quase 30 unicórnios e está entre os 10 países que mais produzem negócios bilionários, além de exportar inovação com empresas jovens como iFood, Nubank, Quinto Andar, Gympass, Loft e Ebanx.
Este cenário sinaliza a potência que temos em mãos, quando nosso DNA criativo e uma visão de negócio se encontram. Ao mesmo tempo em que ficamos inspirados, também nos perguntamos: se a criatividade é força vital para a economia global e um aspecto tão forte da nossa cultura, a marca Brasil não deveria ser mais fortemente associada a isso? Até quando seremos mais reconhecidos pelas nossas commodities do que pela nossa propriedade intelectual?
Para se ter uma ideia desse descompasso, Austrália e Nova Zelândia são, junto com os Estados Unidos, vistas como as nações que têm o melhor ambiente para criação e manutenção de novos negócios ligados à indústria criativa, enquanto o Brasil fica em 28º lugar. Poderíamos estar melhor posicionados.
Nós, brasileiros, já identificamos a criatividade com um ativo valioso da nossa identidade e nosso diferencial. Mas será que não deveria estar de forma mais
intencional nos incentivos públicos e privados para influenciarmos o contexto global de negócios? Com tantos problemas complexos a serem resolvidos no Brasil e no mundo, será que não deveríamos investir mais na nossa capacidade criativa para encontrar soluções que ninguém mais vê?
A antropofagia, marca da brasilidade, pode servir de inspiração. Pois, como dizia Caetano Veloso, o Brasil precisa saber comer e metabolizar. A intenção de metabolizar para criar algo original que possa ser combustível para a economia criativa no mundo. Afinal de contas, somos antropófagos!
Ana Couto é CEO do Grupo Ana Couto
ana@anacouto.com.br