Estratégia chinesa: o domínio nas tecnologias verdes
Deng Xiaoping, o arquiteto da abertura econômica chinesa, costumava aconselhar o país a manter um perfil discreto no cenário global, seguindo o lema “Esconder a força e aguardar o momento”. Contudo, sob a liderança de Xi Jinping, o gigante asiático está determinado a se tornar um protagonista global, adotando a economia verde como uma de suas principais estratégias para conquistar os mercados internacionais. Esse movimento faz sentido. Segundo a International Energy Agency, o investimento global em energia deve superar USD 3 trilhões pela primeira vez em 2024, com USD 2 trilhões destinados a tecnologias e infraestrutura de energia limpa – um valor que supera o total gasto com petróleo, gás e carvão.
A economia chinesa está em plena transição. Se antes a China era associada a produtos baratos e de baixa qualidade, hoje o país se destaca como um fornecedor global em setores variados, que vão desde alta tecnologia e chips até vestuário e brinquedos. Para garantir um crescimento econômico sustentável, o governo chinês desenvolveu uma estratégia focada em três setores-chave do mercado de baixo carbono: baterias de íon de lítio, energia solar fotovoltaica e veículos elétricos (VEs).
A implementação dessa estratégia começou com o controle dos minerais essenciais para as novas tecnologias de energia verde. Empresas chinesas dominam a mineração e o refino de lítio, cobalto, níquel, grafite e manganês, além de controlar 90% dos elementos de terras raras.
No setor de veículos elétricos, a China consolidou-se como líder global. Dos 40 milhões de carros elétricos vendidos globalmente até 2023, 55% foram projetados, fabricados ou vendidos na China. Com veículos chineses não apenas mais acessíveis, mas muitas vezes superiores em qualidade às alternativas ocidentais, marcas como BYD, XPeng, SAIC, Nio e Geely estão ganhando relevância internacional.
Esse domínio é sustentado pelo controle sobre um componente crucial dos VEs: as baterias de íon de lítio. A CATL, maior fabricante chinesa de baterias para VEs, responde por um terço da produção mundial.
No setor de energia solar, a China exerce uma influência decisiva na transição energética global. O país controla atualmente mais de 80% da cadeia de suprimento de energia solar, com todos os dez principais fornecedores de equipamentos sendo chineses.
Entretanto, esse domínio crescente tem gerado reações variadas nos países desenvolvidos. O “modus operandi” chinês, que inclui subsídios altos e ocultos, controle sobre cadeias de suprimento e materiais, e excesso de oferta, tem sido alvo de críticas. A prática de oferecer produtos com preços subsidiados em mercados estrangeiros tem levado ao enfraquecimento de indústrias locais, à redução de setores empresariais e ao aumento do desemprego em diversas partes do mundo. A indústria de painéis solares é um exemplo notável, onde subsídios massivos permitiram à China eliminar a concorrência globalmente.
Para promover uma economia de baixo carbono competitiva e fortalecer sua indústria verde, a China precisa alinhar suas práticas com as regras do mercado internacional. É essencial que o país demonstre maior transparência comercial e evite práticas de dumping — a venda de bens abaixo do valor justo de mercado para ganhar participação ou eliminar a concorrência. Apesar das controvérsias, é inegável que a China está desempenhando um papel crucial na inovação e na competição nas tecnologias verdes. As economias mais desenvolvidas terão de reagir rapidamente para não serem engolidas pelo “dragão verde” asiático.
Ricardo Esturaro é escritor, administrador de empresas e especialista em marketing, estratégia e sustentabilidade