Futuro pede nova mentalidade
Vivemos em uma era de imediatismo. O mundo corporativo é dominado por relatórios semanais, metas trimestrais, métricas de engajamento em tempo real. Tudo é medido, comparado, auditado. O curto prazo se tornou soberano — e, muitas vezes, sufocante. Nesse ambiente, líderes, empresas e até mesmo indivíduos acabam jogando como se estivessem em um campeonato esportivo: vencer o próximo pitch, garantir a maior fatia de mercado, conquistar aquele prêmio que trará prestígio imediato. Mas será que a vida, os negócios ou a própria cultura podem ser reduzidos a uma disputa de vencedores e vencidos?
O autor Simon Sinek, em ‘The infinite game’, nos provoca a pensar diferente. Inspirado na obra de James P. Carse, ele distingue dois tipos de jogos. Jogos finitos são aqueles com regras claras, jogadores conhecidos e um objetivo definido: futebol, xadrez, tênis. Eles têm início, meio e fim, e no final há sempre um campeão. Já os jogos infinitos não possuem linha de chegada. Os participantes entram e saem, as regras podem mudar, e o propósito não é vencer — é continuar jogando. Negócios, política, relacionamentos, ciência, cultura: todos pertencem a essa segunda categoria.
Quando confundimos as duas lógicas, os efeitos podem ser devastadores. Ao aplicar a mentalidade finita em jogos infinitos, líderes sacrificam o futuro em nome do trimestre, organizações abandonam sua essência para perseguir métricas superficiais e profissionais se exaurem em carreiras que parecem não ter propósito. O resultado é visível: aumento de burnout, rotatividade de talentos, perda de relevância e incapacidade de adaptação diante de mudanças profundas.
Para sustentar-se em jogos infinitos, Sinek propõe cinco princípios que funcionam como um guia para líderes, empresas e também para indivíduos:
1. Causa justa – Mais do que uma missão ou um slogan, trata-se de um ideal maior que inspira e orienta escolhas. É o que dá sentido ao esforço coletivo e cria resiliência mesmo em tempos de crise.
2. Times de confiança – Ambientes nos quais as pessoas se sentem seguras para errar, aprender e evoluir. Sem confiança, equipes se fecham, a inovação não floresce e a colaboração se torna frágil.
3. Adversários dignos – Rivais que nos obrigam a melhorar, em vez de inimigos que precisamos destruir. O mercado é mais fértil quando existe respeito mútuo, competição saudável e aprendizado constante.
4. Flexibilidade existencial – A capacidade de mudar radicalmente quando necessário, mesmo que isso traga perdas no curto prazo. A história mostra que as organizações que sobrevivem são aquelas que sabem se reinventar antes que seja tarde demais.
5. Coragem para liderar – talvez o princípio mais difícil. Liderar com a mentalidade infinita exige convicção para enfrentar críticas, pressão por resultados imediatos e a tentação de atalhos fáceis. É preciso coragem para defender uma visão de futuro em um mundo que cobra vitórias instantâneas.
Essa forma de pensar altera profundamente a maneira como entendemos o sucesso. O que realmente importa não é quem “ganhou hoje”, mas quem estará vivo, relevante e inspirador daqui a 10, 20 ou 50 anos. O verdadeiro desafio não é alcançar a próxima meta — é sustentar uma trajetória capaz de atravessar gerações.
Essa reflexão vale para empresas, mas também para indivíduos. Carreiras não precisam ser vistas como corridas para conquistar cargos e títulos, mas como jornadas de aprendizado e contribuição contínua. Relações não precisam ser contadas em vitórias e derrotas, mas em vínculos que resistem ao tempo. E culturas não precisam girar em torno do que é tendência agora, mas daquilo que deixa marcas duradouras. Em um mundo onde a pressa domina, talvez a maior revolução seja recuperar a paciência. O jogo infinito nos convida a trocar a ansiedade do resultado pelo prazer da construção, a obsessão pelo ganho imediato pela serenidade de saber que estamos criando algo que fará sentido muito além de nós.
No fundo, a vida não é sobre chegar primeiro, mas sobre continuar presente. Não é sobre erguer um troféu, mas sobre deixar um legado. Não é sobre vencer, mas sobre durar. E essa pode ser a pergunta mais importante que cada um de nós — líderes, marcas, profissionais, cidadãos — precisa se fazer: estamos jogando para vencer ou para continuar jogando?
Bruno Guerrero é chief growth officer da Altermark