Há quatro livros lançados recentemente cuja leitura é obrigatória. Não tenho medo de ser tão assertivo, contrariando até meus hábitos, mais propensos a admitir que tudo que acho é sempre sujeito a trancos e barrancos. Nesse caso, já que me admiti a usar frases feitas (“trancos e barrancos” vai me dar sentimentos de culpa por bom tempo) me permita usar outro lugar-comum. Ninguém que trabalha em comunicação e marketing pode deixar de ler qualquer um dos quatro, seja qual for a plataforma usada.

Começo pelo qual acho que causará mais polêmica ao colocá-lo no rol de leitura obrigatória para quem trabalha com comunicação. Falo do primeiro livro da trilogia de Laurentino Gomes, Escravidão. Não vou ficar citando editora (é a Globo) porque qualquer um que estiver interessado acha fácil, seja qual for a plataforma escolhida. Eu digo que é leitura obrigatória para quem trabalha com comunicação sem me deter na gracinha de dizer que esta é a atual relação entre patrões, funcionários e clientes. Não me passaria pela cabeça piadinha mais idiota. É só para entender o Brasil. Ou, pelo menos, ter uma boa visão dos motivos para sermos o que somos. Abrangendo o período que vai desde o primeiro leilão de cativos até Zumbi dos Palmares, o livro faz um relato preciso e muito documentado do mais organizado sistema que este país já teve em toda sua existência.

Um sistema que nos envergonha por mil motivos e deveria, pelo menos, nos oferecer lições fundamentais. Mas que, infelizmente, ainda é, em todo ou em parte, completamente desconhecido. Por ser branco, Laurentino corria o risco de estar se usurpando do “lugar de fala” do negro, ao mesmo tempo que, por não ser historiador acadêmico, poderia ser criticado pelo estilo, inteligível, de seu texto. A qualidade do material, no entanto, é tão grande que as raríssimas críticas ficaram por conta dos chatos de plantão, cuja principal motivação quase sempre é o despeito. Os demais volumes da trilogia virão em 2020 e 2021. Aula de história, de pesquisa e de texto. Outro livro nesta minha dispensável opinião que se situa entre os de leitura obrigatória é 50 anos de telejornalismo, em comemoração ao meio século do Jornal Nacional. Falar do que esse jornal significou e ainda significa para a sociedade brasileira é bobagem. Não ofenderia meus leitores com assunto tão óbvio.

Mas abro um parênteses para comentar a qualidade da edição do material gráfico. E pela capacidade dos inúmeros redatores da obra em, mesmo sob a emoção de escrever sobre um tema tão propiciatório, procurarem fazer um relato rico em fatos. Longe de ser um panfleto empresarial, normalmente nesses casos insurportavelmente autoelogioso, é uma história rica muito bem contada. Que se compreendam o orgulho e a vaidade de quem teve alguma participação na obra. Mas é importante ressaltar que o livro procura antes de mais nada ser um relato fiel de um empreendimento reconhecido no mundo todo como de primeira qualidade.

Já que estamos falando de TV Globo, a biografia de Roberto Marinho O Poder Está no Ar também não pode deixar de ser lida. É uma edição da Nova Fronteira, de autoria de Leonêncio Nossa. Muito detalhado, com sinceros depoimentos de ex-funcionários e da própria família, o livro tem alguns defeitos de edição (o que é muito raro na editora) e, em alguns momentos, deixa o leitor meio perdido entre datas e nomes. Erros que deverão ser corrigidos no futuro. Finalmente, uma recomendação para um livro que é uma droga. Mas esta coluna (Graças a Deus!) é lida por profissionais que sabem muito bem que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. O livro de Rodrigo Janot é uma grande droga. Em todos os sentidos. Menos naquilo que realmente é: um retrato do momento de um país confuso.

Ler Nada Menos que Tudo, escrito pelos jornalistas Jailton de Carvalho e Guilherme Evelin, é fundamental para termos uma visão dolorosa do país. Essa é a popular leitura obrigatória, da qual nunca é bom fugir. Não tenham medo, não resolvi de uma hora para outra virar crítico literário. Provavelmente semana que vem estaremos de volta com as histórias de sempre. Como dizia uma velha comediante que trabalhava num furrequíssimo espetáculo na noite carioca: “Eu sei muito bem que vocês querem é ouvir putaria… mas só de sacanagem vou cantar Sur le ciel de Paris…” Não acho que recebi autorização para ser crítico literário nem é para isso que estou neste jornal. Mas, com a devida permissão, um pitaquinho de vez em quando não mata ninguém.

Lula Vieira é publicitário, diretor do Grupo Mesa e da Approach Comunicação, radialista, escritor, editor e professor (lulavieira.luvi@gmail.com)