Milagres, excepcionalmente, acontecem...
E assim, praticamente contrariando todas as previsões, a Embraer conseguiu “levantar, sacodir a poeira, e dar a volta por cima”. O chamado turnaround. Amargou e superou a tal da “tempestade perfeita”.
Depois de vender parte substancial da empresa à Boeing, no território onde era protagonista exuberante e tendo um único concorrente, a Bombardier, viu sua nova sócia e controladora mergulhar numa crise infinita, na medida em que a aposta de maior sucesso da Boeing, onde concentrava 80% de suas esperanças em relação ao futuro, revelou-se o maior fracasso da indústria da aviação, até meses atrás.
O malfadado Boieng 737 Max que não fez outra coisa que, em vez de voar, decolar e despencar, matando centenas de passageiros, colocando sobre severas restrições a competência da gigante americana. Diante desse fato, a Embraer que já se organizava como uma nova empresa, sem parte expressiva do que vendeu para a Boeing, teve de receber de volta, brigar na Justiça na tentativa de uma mais que justa compensação, e se reconstruir e reposicionar radicalmente.
E aí, como se costuma dizer, numa tempestade mais que perfeita, veio a pandemia, que terminou de derrubar, metaforicamente, todos os aviões que estavam no ar, impedindo os demais que tentaram decolar, e cancelando durante meses a atividade da aviação comercial.
E, como ocorre em circunstâncias como essas, diante de terra literalmente arrasada, não existe outra alternativa que não seja parar, refletir, enfrentar os desafios, e se repensar por completa. E foi o que fez, com competência e sensibilidade, a Embraer.
Conclusão: iniciou 2022 com a sensação de ter contido sua pavorosa destruição, respirando sem aparelhos, e voltando a merecer a atenção, simpatia e confiança dos investidores, assim como, principalmente, dos gestores de investimentos. O supostamente impossível revelou-se possível e com boas, quase ótimas, perspectivas pela frente. E dentre as iniciativas tomadas para superar o vendaval, a Embraer se reestruturou, repensou seu futuro, onde verdadeiramente poderia ser e seguir competitiva, sem jamais perder de vista a componente inovação. Assim e hoje vê suas ações, que chegaram a bater no fundo do poço em abril de 2020, cotadas a R$ 7,86, fecharem o ano passado com uma valorização de quase 200%, ao redor dos R$ 23, e hoje estável e próxima desse valor.
Portanto, além de se reorganizar em termos de negócios e gestão, a Embraer recebeu de volta o que vendeu, e que, de certa forma, era a sua joia da coroa. Os modelos E175 em diferentes configurações que fabrica para a aviação regional, onde segue sendo a empresa líder mundial. E por ser a empresa líder, e ter de prestar serviços, tem uma receita cativa que corresponde a quase 30% de todas as suas receitas, e onde trabalha com uma ótima margem.
Seu projeto C-390, com alguns tropeços iniciais – cargueiro militar e maior aeronave já desenvolvida pela empresa –, ultrapassou a etapa de investimentos pesados e mais correções necessárias, e agora deverá se converter em boa fonte de novas receitas.
E de olho no futuro próximo, é uma das grandes atrações em todo o mundo no novíssimo território dos eVTOLs, veículo elétrico de pouso e decolagem vertical. O reconhecimento a sua competência levou a Embraer, e sua empresa aérea Eve, que produz seu modelo de Vtol, a fazer uma fusão com a americana Zanite, preparando-se para abertura do capital na bolsa de Nova York, dando origem à Eve Holding.
Em síntese, amigos, foi mais ou menos o que aconteceu com uma empresa que chegou literalmente à beira do precipício, mas, diante da competência e sensibilidade de seus líderes, conseguiu converter-se num dos melhores exemplos da canção espetacular do genial e saudoso Paulo Vanzolini. “Ali onde eu chorei. Qualquer um chorava. Dar a volta por cima que eu dei. Quero ver quem dava...”.
É raro, quase impossível, mas, às vezes acontece. Um quase condenado a morte – Embraer – escapou. Coberta de glórias e merecimentos. Depois dizem que a sorte tem obsessão pelos competentes... Claro que tem... Merecem!
Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing
fmadia@madiamm.com.br