Não vamos desperdiçar uma boa crise!
Escrevo este texto observando uma fina garoa pela janela. Minha base é São Paulo e, depois de semanas secas, tivemos por aqui uma chuva fraca, mas muito bem-vinda. Outras áreas do país – e mesmo do estado de SP – ainda aguardam uma chuva que amenize o sofrimento de um clima análogo ao deserto, com umidade muito abaixo do desejável.
Mesmo aqui em São Paulo, essa chuva passageira apenas ameniza pontualmente, sem resolver o problema. O primeiro efeito colateral desse clima adverso se dá nas pessoas, causando problemas respiratórios, principalmente em crianças e idosos. Há, porém, um efeito ainda mais perverso: as queimadas. Com a secura dos campos, qualquer fagulha pode gerar um incêndio de enormes proporções. E o pior é que já há provas de que pessoas têm iniciado o fogo em algumas regiões, de forma deliberada e criminosa.
No norte do país, os rios perdem seu volume de água a olhos vistos, comprometendo fauna e flora do entorno, sem falar na população ribeirinha, que sofre com a perda do seu insumo vital.
Toda essa crise climática, que nos afeta de forma inédita, acaba deixando um legado pedagógico. Se não for pela consciência, que seja pela dor. Ao sentir na pele os efeitos negativos do clima sem controle, a sociedade entende que algo precisa ser feito.
E rápido! Empresas, governos e instituições são pressionadas a agir em consonância com as melhores práticas socioambientais, antes que seja tarde demais.
A sociedade começa, ainda que de forma tímida, a questionar as empresas que continuam poluindo o meio ambiente ou usando insumos inadequados. Muitos – principalmente os da geração Z – já estão dispostos a pagar um pouco mais por produtos de empresas que adotam as melhores práticas na produção e distribuição dos seus itens.
E boicotar aquelas que ainda se mostram insensíveis.
A substituição de energia advinda de fontes fósseis por outras, menos poluidoras; a economia de água na produção; o uso de embalagens recicláveis ou degradáveis; a gestão responsável de resíduos; a economia circular, enfim, são iniciativas cada vez mais valorizadas e tendem a ser determinantes na hora da escolha de consumidores mais conscientes.
E isso tudo fica mais evidente e relevante durante uma crise.
E aí vem a frase que inspirou este artigo: “Nunca desperdice uma boa crise”, disse Wiston Churchill. Durante a Segunda Guerra Mundial, Churchill percebeu que a crise poderia ser uma oportunidade para remodelar a sociedade britânica e implementar reformas que beneficiariam a nação a longo prazo.
Ele acreditava que as dificuldades e os desafios trazidos pela guerra poderiam ser catalisadores para inovação, progresso e melhoria.
No contexto atual, a crise climática precisa ter esse efeito catalisador para mudanças significativas por parte de todos os atores da sociedade.
As previsões de efeitos catastróficos decorrentes do aumento da temperatura da Terra acima de 1,5°C, em relação à era pré-industrial, ainda têm sido recebidas com reserva e mesmo um certo negacionismo por parte de empresas e instituições mais céticas.
Mas os fenômenos climáticos dos últimos meses têm corroborado as previsões, trazendo um quadro sombrio para o futuro da Terra.
Temperaturas recordes em diversas partes do mundo, inclusive no Brasil, seca e fogo de um lado e enchentes incontroláveis do outro.
Tudo isso gera um nível de atenção e urgência sem precedentes. A crise pode então ter esse efeito didático, convencendo os mais céticos quanto a necessidade e importância de uma mudança de atitude que possa reverter esse processo danoso para todos.
Então, não desperdicemos a crise! Esperamos que o governo saiba lidar com a fase aguda dessa crise, mitigando seus efeitos catastróficos e, da nossa parte, que mudemos de hábitos e cobremos mais por uma mudança significativa.
Antes que seja tarde demais!
Alexis Thuller Pagliarini é sócio-fundador da ESG4
alexis@criativista.com.br