Qual é o futuro de Retail Media no Brasil?
O varejo pode ser muito mais do que um negócio de compra e venda de produtos. Um bom exemplo é o que chamamos de Retail Media, ou a oportunidade para que anunciantes usem espaços físicos (dentro e fora das lojas) e digitais (website, app, e-mail), além de dados dos varejistas, para realizar campanhas de marketing de uma forma mais assertiva. Um estudo realizado pelo BCG e pelo Google estima que esse é um mercado que irá crescer 25% ao ano até 2026, quando deverá responder por cerca de um quarto dos gastos totais das empresas com publicidade.
Essa é uma oportunidade enorme, que avança em diversos segmentos do varejo. No mundo, supermercados, lojas de departamentos, redes de vestuário e até mesmo lojas de decoração e presentes oferecem suas propriedades digitais e seus espaços nos PDVs para que fornecedores promovam seus produtos para os clientes.
A grande vantagem de Retail Media está no fato de que a comunicação com o cliente se dá em um momento em que já existe uma intenção clara de consumo. Com isso, a possibilidade de conversão aumenta. Utilizando os dados do varejista e aplicando ciência de dados, os anunciantes conseguem utilizar targets mais assertivos e desenvolver campanhas mais relevantes, que podem entregar ofertas personalizadas e um conteúdo mais interessante para cada cliente. E quanto mais interesse, maior o potencial de vendas.
O mercado brasileiro de Retail Media ainda é relativamente incipiente, especialmente se comparado ao varejo americano, no qual todo grande varejista (e a maioria dos de médio porte) já conta com soluções nesse sentido. Mas companhias como GPA, RD, Americanas e Mercado Livre já transformaram suas propriedades digitais e físicas em uma linha adicional de geração de receitas.
Esse é um movimento que tem um imenso espaço para crescer no Brasil. Mas por onde começar?
Um “atalho” importante para a implementação de programas de Retail Media no varejo é a existência de programas de fidelidade, uma vez que esse é o caminho mais direto para coletar dados sobre os clientes e seus hábitos de consumo – que, por sua vez, embasam as decisões de mídia nos pontos de venda físico e digital.
A estruturação de um programa de fidelidade pelo varejo permite estabelecer uma relação diferente com os cliente, a partir de benefícios ou descontos, frequentemente financiados pelos fornecedores . Nesse sentido, existe uma convergência de objetivos com Retail Media: ambos se propõem a estimular o retorno do cliente à loja, aumentar o volume de vendas, trazer margens mais saudáveis e aumentar o conhecimento sobre o cliente para criar relacionamentos de longo prazo.
Decisões que precisam ser tomadas
Um grande desafio no caminho de implementação do Retail Media é entender que, por ser um novo negócio para o varejo, será preciso passar por uma curva de aprendizado. Essa curva pode ser percorrida em voo solo ou em parceria com fornecedores de soluções. Por ser um negócio que está distante do core do varejo, nem todos têm o conhecimento e a capacidade de investimento necessários para percorrer essa rota sozinhos. Por isso, recomendamos que cada varejista faça uma análise dos recursos (processos, tecnologias e pessoas) que possui e considere a busca de parcerias para estruturar o novo negócio.
A gestão do negócio de Retail Media, por sua vez, pode ser feita 100% internamente ou com parceiros estratégicos de comercialização e execução de mídia. E, mesmo que a escolha seja por parcerias, o varejista deve coordenar esse trabalho para gerar resultados ainda mais relevantes para o negócio.
Mas que resultados podem ser obtidos com o uso de Retail Media? A resposta é clássica: “depende”. Tudo depende da capacidade que o varejista tem de capturar uma parcela significativa do potencial de seu ecossistema: o estudo do BCG estima US$ 110 bilhões em venda de mídia própria nos próximos 5 anos nos EUA, que gerarão quase US$ 75 bilhões em lucros. Dessa forma, contribuem de forma muito mais significativa em comparação com as margens do tradicional negócio mercantil.
Mas a venda de mídia pelo varejo não gera resultados apenas na operação de publicidade. O que o anunciante busca é converter a audiência em clientes – o que gera vendas dentro da loja e contribui para o aumento do faturamento do varejo. A dunnhumby, ao longo de sua experiência como fornecedora de soluções de Retail Media e data analytics, percebe que, em clientes maduros, é possivel obter uma receita adicional direta de 0,5% até 1% sobre o faturamento da empresa, sendo que cada campanha traz um crescimento adicional de vendas (uplift) de 1,5% a 2%.
Por um outro lado, a adoção de soluções de Retail Media não se resume a busca por novas receitas. Na verdade, pode se tornar uma excelente ferramenta para proteger receitas existentes. Com os crescentes desafios de rentabilidade encontrados pela indústria, é esperado que os seus investimentos sejam cada vez direcionados para parceiros que ofereçam mais capacidade e precisão de mensuração, aumentando a assertividade e gestão de retorno nas ativações.
O desafio da mudança de cultura
Na construção de uma rede de Retail Media, um desafio essencial é forjar parcerias com os anunciantes – que são, na maioria dos casos, os próprios fornecedores do varejista. É preciso olhar para esses parceiros sob novas lentes, indo além da relação mercantil para criar uma interlocução com áreas diferentes, com base em outros parâmetros.
Para um varejo acostumado durante décadas a negociar em termos de desconto e volume, essa é uma grande transformação. Novas métricas, uso intensivo de dados, tecnologia, alcance e retorno sobre os investimentos se tornam ainda mais importantes. Para muitos varejistas, a mudança de cultura pode ser um desafio quase intransponível.
Isso faz com que fornecedores de soluções e a própria indústria desempenhem um papel importante, contribuindo para a evolução do Retail Media. O ideal é que o planejamento das ações seja feito em conjunto, analisando todos os canais: investimentos em trade, em descontos, visibilidade em loja, produtos patrocinados no site, e-mail marketing, eventos sazonais, etc. Essas conversas passam a ser integradas, apesar de, em diferentes momentos, perseguirem métricas diferentes.
Além do aumento de receita, a colaboração entre varejista e fornecedor para esforços de Retail Media é uma maneira inteligente e oportuna de interagir em todos os pontos da jornada do consumidor.
Nos próximos anos, veremos um grande desenvolvimento de Retail Media no varejo brasileiro. de um lado, as empresas estão sob pressão de margem e buscam novas alternativas de aumento de receita e rentabilidade. Do outro, os fornecedores/anunciantes que já trabalham com algumas redes nesse modelo de negócios passam a demandar ações semelhantes em mais varejistas, estimulando o crescimento do mercado.
Miriane Schmidt é diretora de mídia e customer engagement da dunnhumby
miriane.schmidt@dunnhumby.com