Representatividade LGBT+

Quando inicio um trabalho de alinhamento ESG nas empresas, proponho sempre começar com um censo entre os colaboradores.

A realização do censo deve ser cuidadosa, respeitando o anonimato dos respondentes, já que os dados obtidos são sensíveis.

Pelo censo, identificamos o percentual de pessoas que se autodeclaram pretos ou pardos e os que se classificam como pertencentes ao universo LGBTQIAPN+, por exemplo.

Os dados são importantes para determinar a necessidade de iniciativas inclusivas e ações afirmativas.

Por exemplo, se o percentual de pessoas pretas está abaixo de 10,2%, cabe alguma iniciativa de equiparação, já que este é o percentual de pessoas que se declararam pretas no último censo do IBGE, realizado em 2022.

O ideal é que a empresa reflita internamente uma diversidade semelhante à encontrada no Brasil. Quando o tema é o universo LGBT+, porém, há vieses importantes a serem considerados. Antes de mais nada, o tema ainda é tabu para muitas pessoas.

Boa parte da população brasileira é conservadora e preconceituosa, o que desestimula as pessoas informarem sem receios sua identidade de gênero. No último censo do IBGE – em 2022 –, as questões relacionadas às expressões de gênero ficaram restritas à homossexualidade ou bissexualidade.

O resultado foi que apenas 1,9% (2,9 milhões) se declarou como pertencente a esses grupos. As associações e os grupos de estudos sobre identidade de gênero e o universo LGBTQIAPN+ questionam o baixo número, que inibe a formatação de políticas públicas e outras iniciativas pertinentes.

Estima-se que esse número seja cinco vezes superior. Com base nisso, a Havaianas, que mantém ativismo consistente junto ao universo LGBT+, aderiu ao movimento All Out e contou com o respeitado instituto DataFolha para uma pesquisa paralela. Além da pesquisa, em si, denominada ‘Pesquisa do orgulho’, a iniciativa compreendeu oito meses de viagens pelo Brasil, percorrendo 150 cidades, estimulando a participação de pessoas de orientação sexual não binária. O resultado desse movimento foi a obtenção de dados mais condizentes com a realidade.

Na verdade, 15,5 milhões de brasileiros se identificam com o grupo LBTQIAPN+. Este número representa 9,3% da população brasileira.

O relatório da pesquisa alcançou 78 páginas com dados e informações sobre as necessidades desses grupos, suas relações familiares e suas agruras.

Esse estudo foi transformado num case pela agência Media.Monks São Paulo, em nome da Havaianas, rendendo um Silver Lion no último Cannes Lions Festival (2023).

Graças a esses dados mais confiáveis, podemos ter a devida dimensão do universo LGBT+ e formatar políticas e estratégias condizentes com esta representatividade.

Não são poucas as campanhas publicitárias que abordam essa questão de identidade de gênero com sucesso. De cara, me lembro de, pelo menos, três cases ganhadores de Leões nos últimos anos.

Lembro-me daquele da Coca-Cola que, corajosamente, envazou latas de Coca-Cola com o líquido de Fanta para combater a expressão homofóbica “Essa Coca-Cola é Fanta, hein!”.

E a comunicação da Coca-Cola dizia: Essa Coca-Cola é Fanta, sim! E daí?. Logicamente, a tiragem foi limitada e dirigida à imprensa, líderes de opinião e ativistas.

Outro case ganhador de Leão foi o do Mercado Livre, que, durante a pandemia, viabilizou uma Parada do Orgulho LGBT+ São Paulo totalmente virtual, tendo Gloria Groove como madrinha.

E o terceiro, mas não menos importante, foi o ganhador de Grand Prix no Cannes Lions, criado pela VMLY&R para a Starbucks brasileira, que transformou ps seus cafés em verdadeiros cartórios para pessoas trans dispostas a obter novo nome, condizente com sua nova identidade de gênero.

Ainda que não seja por ativismo, as marcas precisam dar mais atenção ao universo LGBT+. Afinal, ele representa quase 10% da população brasileira.

Alexis Thuller Pagliarini é sócio-fundador da ESG4
alexis@criativista.com.br