Saúde como um bem cultural

Sempre fui uma entusiasta do desenvolvimento cultural. Ao longo da minha carreira, sempre tive o lado A e o lado B. E quem me conhece sabe o quanto levo os dois lados, lado a lado, em tudo que faço.

Explico. O lado A sempre foi em publicidade, em grandes agências, atendendo grandes clientes da indústria pharma, e com uma rotina típica de uma publicitária paulistana. Já o lado B, foram dez anos trabalhando em uma ONG e no ateliê que fundei no coração do Bixiga – O Estúdio Sem Nome*.

Lá, fomentamos conversas sobre pautas fundamentais para a construção de uma sociedade mais igualitária, diversa e plural. Discutimos roupa identidade, atuamos em territórios de vulnerabilidade social, com mulheres cis e trans, abordando violência, identidade e expressão de gênero.

Trabalhamos com pessoas que enfrentavam todas as violências contemporâneas, entendendo que muitas são heranças da formação cultural histórica.

Foi nesse cruzamento entre saúde e cultura que me tornei uma ativista do desenvolvimento cultural a partir da saúde. Afinal, a saúde não é apenas um direito universal, mas também um bem cultural.

As representações, conhecimentos e práticas relacionadas à saúde são formuladas dentro da complexa teia social na qual está inserida – época, região, classe social e religião, entre outros. Nessa dinâmica, existe uma influência mútua: a cultura (hábitos, costumes e modos de vida) molda a forma como a saúde é percebida e praticada, e a saúde – ou sua ausência – impacta diretamente a produção, o acesso e o consumo de manifestações culturais.

Nesse cenário, o desenvolvimento cultural a partir da saúde se torna chave para impulsionar pautas contemporâneas.

É através da integração das práticas de saúde e cultura que conseguimos acolher e aceitar a pluralidade, a diversidade e fomentar cada vez mais a inclusão e o respeito pelas diferenças.

Para mim, esse é o grande potencial – e o grande desafio – de comunicação e mobilização dentro do setor da saúde.

Quando compreendemos a saúde como um bem cultural, percebemos seu poder não apenas de ser influenciada pela cultura, mas também de moldar a identidade de um povo e promover avanços sociais e de cidadania.

*O Estúdio Sem Nome encerrou suas atividades devido à maternidade e à mudança de vida necessária, dado o contexto macrossocial de ser mãe, que me levou para outro território. Território onde vivi o contexto pandêmico, e a pandemia, assim como impactou territórios e estruturas de saúde, também alterou profundamente a cultura, reforçando ainda mais a interdependência entre esses dois universos.

Camila Zupo é diretora de planejamento estratégico da FCB Health Brasil