Por acompanhar o festival há muitos anos, vejo o Cannes Lions sempre como um poderoso meio – e não um fim em si. Para mim, Cannes Lions deve ser visto como uma rica fonte de exemplos, benchmarks, insights e tendências.

As premiações “apenas” corroboram e celebram os melhores exemplos do mundo, que refletem melhor o Zeitgeist (características genéricas de um determinado período de tempo, expressadas pelas manifestações intelectuais e culturais do mundo, numa certa época).

Estou convencido que o que melhor se aproveita do festival é o estudo cuidadoso de tudo que é discutido por lá. Nas palestras, nos fóruns, nos workshops e, é claro, nas premiações.

Ao ver uma nova categoria sendo lançada – Creative Business Transformation (Transformação Criativa de Negócios) –, acho que todos nós devemos entender as razões que levaram os organizadores a criar mais uma vertente de premiação.

A ideia é premiar a criatividade que impulsiona os negócios – um pensamento criativo que muda a forma como as marcas se organizam, como as pessoas trabalham e como seus clientes e consumidores se envolvem com elas.

Eles dizem querer reconhecer a engenhosidade que leva à criação de novos produtos e serviços, à reinvenção das operações e das experiências dos clientes em empresas de todos os portes que impulsionam mudanças transformadoras.

Um desavisado pode achar tudo isso um tanto distante de um festival que sempre privilegiou a propaganda, mas na verdade está totalmente coerente com um evento que se propõe a tratar da criatividade de forma holística – e não só da comunicação.

Não é à toa que a categoria de inscritos que mais cresce no Cannes Lions é a de clientes. Já faz tempo que o festival já não foca apenas em peças publicitárias. Interessa mais agora enaltecer a criatividade que transforma, que impulsiona negócios. Está no escopo da nova categoria também todo o universo de CX (Customer Experience) e UX (User Experience), além de Business Design. Alguém de agência deve estar pensando: “mas o que eu tenho a ver com isso?”. E a resposta é: tudo! As soluções que um cliente espera de uma agência nesses novos tempos vão muito além da criação e efetivação de campanhas publicitárias.

Os clientes esperam encontrar agências capazes de contribuir com soluções inovadoras de negócios, de processos, de experiências e, em última instância, de resultados. Agências capazes de apoiar a concepção e o design de um novo jeito de impactar, engajar e fazer negócios.

A organização afirma que a nova premiação é aberta a qualquer organização que cria e oferece mudanças transformacionais dentro ou em nome de uma marca. Incluindo, mas não se limitando a, empresas ou equipes internas que fornecem serviços criativos, consultoria, experiência ou design de serviços, desenvolvimento de novos produtos, inovação e transformação digital.

As agências sempre foram protagonistas de primeira grandeza no Cannes Lions e podem continuar a ser. Mas é preciso que se adequem às novas demandas e às novas áreas de atenção dos seus clientes.

Basta analisar os cases premiados com Grand Prix na edição deste ano do festival. São poucos os cases relacionados puramente a campanhas ou peças publicitárias. O que mais se vê são cases de abordagens criativas de negócios, de experiências e de ativações inusitadas.

Em evento recente, ouvimos dois CEOs
de grandes empresas afirmarem que a agência de propaganda está fora da sua agenda por ficarem restritas a propostas unicamente publicitárias.

“Preciso de interlocutores que me ajudem a pensar em formas inovadoras de fazer negócios e não simplesmente de colocar no ar campanhas criativas. Isso é parte do processo, mas não o mais importante.”

O recado para as agências está aí: se quiserem fazer parte da conversa estratégica dos seus clientes, é preciso pensar também na transformação criativa de negócios. A nova categoria do Cannes Lions é mais do que oportuna.

Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional das Agências de Propaganda) (alexis@fenapro.org.br)