Opiniões

1. A sociedade brasileira precisa caminhar muito, ainda, para ser considerada como minimamente organizada.

Ao contrário da letra de Miguel Gustavo, também em época de Copa do Mundo de Futebol, somos hoje bem mais que 70 milhões, somos 200 milhões, porém sem ação.

O espasmo dos movimentos de junho do ano passado não passou disso. Ao menor sintoma de combate, cedeu diante do grupelho de black blocs que até hoje não se conseguiu saber muito de sua origem. Nem mesmo a morte do cinegrafista da Band foi motivo suficiente para se desvendar o “mistério”, pelo menos até aqui.

Nessas ocasiões, é bom não esquecer, convém sempre indagar como o personagem de Agatha Christie: a quem interessa o crime? É sempre um bom caminho em direção à autoria. A propósito, ainda que com o período de pasmaceira carnavalesca, não se soube mais a respeito das investigações envolvendo os dois suspeitos do crime do Rio.

Mas, por que fazemos o juízo acima acerca da falta de compromisso do nosso povo com a organização? Os motivos brotam às centenas, mas um deles tem sido fundamental nestes tempos de mensalão e espanto nacional diante da mais recente decisão do STF a respeito da definição de quadrilha.

Simples assim: pouco vimos ou lemos sobre o cerne da questão, que é o absurdo da nomeação dos integrantes da mais alta corte de Justiça do país ser feita por quem preside outro dos três poderes da República, no caso o Executivo. O mesmo Executivo que pode ter seus membros julgados pelo colegiado do STF, cujos componentes são escolhidos… pelo Executivo.

É algo surreal, kafkiano, e na enxurrada de comentários a respeito desse julgamento do STF, mesmo nos mais ácidos, pouco se escreveu sobre esse absurdo, que poderá se repetir mais vezes, enquanto perdurar esse sistema de escolha que é uma afronta ao princípio da independência dos poderes entre si preconizado pela Carta Magna.

Qual a culpa da sociedade brasileira nessa contradição? Reside na ausência de movimentos que já deveriam ter sido por ela iniciados, em busca de mudança nesse enunciado constitucional.

Quem deve escolher os membros do STF, se não o povo diretamente (impraticável em nosso país), ao menos os componentes do próprio Judiciário, e não faltarão mecanismos para que isso venha a se processar democraticamente.

O que falta é vontade e sem esta pouco ou nada se modifica.

2. Há algo de errado no Projeto de Lei Substitutivo (ver matéria nesta edição) aprovado pela Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal em sua sessão de 25/2: ele preconiza que as licitações para a contratação de agências de publicidade pelo governo passem a dar maior peso (70%) ao valor cobrado pelo serviço prestado, reduzindo para 30% o peso da proposta técnica.

O autor do Projeto Substitutivo, senador Paulo Paim, defende também a formação de consórcios de agências para o atendimento das contas de governo, que dividiriam a responsabilidade entre criação, planejamento e compra de mídia entre diversos players, dividindo igualmente a verba e a remuneração.

Exorta o senador que uma das motivações para a apresentação desse Projeto Substitutivo reside no combate à impunidade e à corrupção, observando (pasme o leitor) que “os maiores problemas no erário público ocorrem via empresas de publicidade”.

Se o chamado mensalão proporcionou esse tipo de conclusão ao ilustre senador, ainda é tempo de revê-la, pois é uma temeridade julgar todo um mercado empresarial e profissional por um fato isolado e combatido inclusive de forma veemente pelo próprio trade. Seria o mesmo que julgarmos todos os senadores pelos erros graves cometidos por um deles, como vimos recentemente.

Se o leitor imagina que terminou aí o despropósito do Projeto Substitutivo, tem mais: outro senador, Roberto Requião, pretende incluir o desconto padrão, definido pela Lei nº 12.232 e reforçado pelas normas-padrão do mercado publicitário brasileiro, nas negociações. Isto significa o seguinte: as agências devem repassar parcela dos seus honorários ao contratante público, reduzindo os custos para este.

Como tem virado moda entre alguns setores estridentes da sociedade brasileira combater a atividade publicitária, alguns com interesses ideológicos que se fazem entender duas ou três pedras adiante nesse complexo tabuleiro de xadrez e que deságua no enfraquecimento da mídia independente, o referido Projeto Substitutivo não surpreende. A propósito, o que surpreende no Brasil de uns tempos a esta parte?

Porém, o mercado publicitário como um todo deve prosseguir no movimento já iniciado, visando no mínimo esclarecer os legisladores sobre a inadequação da proposta.

3. O livro “A trajetória de um publicitário comum”, de André Porto Alegre, que será lançado nesta segunda-feira (10), editado pela Matrix, com prefácio de Luiz Lara, entre outros temas relevantes, abordados sob a ótica de um profissional com arte e história, registra um conselho de grande utilidade aos estudantes da área: começar a trabalhar o mais cedo possível na atividade pode não ser o mais importante; o mais importante geralmente reside no estudo e acúmulo de conhecimento, créditos indispensáveis para o sucesso na carreira.

4. Em artigo no The São Paulo Times, edição de fevereiro passado, Agnelo Pacheco, presidente da Agnelo Pacheco Comunicação, critica de forma veemente os “fazedores de propaganda” que só por isso se acham criativos, segundo ele.

O propmark dá um pitaco no texto: “A tecnologia não veio para facilitar? Veio. Mas, eu penso que trouxe, junto, a acomodação. Hoje, são necessários três profissionais para fazer o trabalho de um no passado. Será que no passado aqueles malucos que enfiaram a cara no trabalho eram fanáticos? Penso que não: penso que eles amavam mais o que faziam do que a maioria que faz hoje”.

Este editorial foi publicado na edição impressa de Nº 2488 do jornal propmark, com data de capa desta segunda-feira, 10 de março de 2014