"Para superar a crise, marcas vão ter de se reinventar"
Há luz no fim do tunel. É o que a ABA (Associação Brasileira de Anunciantes) prevê para o momento delicado que vive a economia brasileira. Mas recomenda criatividade e inovação como insumos essenciais para trilhar o caminho da reinvenção da relação entre marcas e consumidores. Há redução de investimentos em mídia, mas as ações nos pontos de venda tiveram incremento. “Há necessidade de se investir de forma mais assertiva”, diz Sandra Martinelli, presidente-executiva da ABA.
Sandra Martinelli: “Efetividade é o ponto chave. A questão é como usar a mesma verba de forma eficaz”
Como os anunciantes estão observando o cenário econômico brasileiro?
Com muita atenção e o olhar voltado para o futuro. O momento é delicado, mas é uma fase. E, para superá-la, as marcas vão ter de se reinventar. É o momento da inovação e da redescoberta da forma como as marcas anunciantes se comunicam e se relacionam com o consumidor, seja pela mídia, no ponto de venda ou nas redes sociais.
A criatividade é um elemento-chave de diferenciação neste momento?
Sim, a criatividade é a base de boas ideias e o caminho da reinvenção. Precisamos buscar novas maneiras de falar com o consumidor, cada vez mais exigente e com padrões elevados. Ele tem acesso à informação de todas as formas e se mostra mais criterioso na hora de consumir.
A entrega dos fornecedores estratégicos está de acordo com as necessidades dos anunciantes?
Os anunciantes buscam constantemente novas e diversificadas alternativas para atender à dinâmica evolução dos consumidores. O mercado está passando por mudanças significativas. Com isso, nossas estratégias e ações devem acompanhar esse processo para sermos mais efetivos, e como consequência os fornecedores precisam se adaptar aos critérios e demandas das novas práticas, para atenderem às expectativas geradas. Os padrões de qualidade dos produtos são cada vez mais rígidos, e a publicidade é reflexo do modelo de negócios atual e futuro.
Qual é o tom dos briefings dos anunciantes?
Vivemos este momento de enormes mudanças, como já mencionamos, com muitas mídias novas, consumidores acessando a informação de formas diferentes. É importante que os briefings respondam com eficácia e rapidez, que esses vetores exigem para atingirmos os resultados esperados.
As promoções devem enfatizar preços ou usar que argumentos para chamar a atenção?
O que vemos são campanhas que incentivam o volume de consumo em função de preços promocionais, mas que, mesmo sendo eventuais, podem trazer retorno para as marcas e iniciar vínculo de aderência à marca. Dessa forma, é uma oportunidade de chamar a atenção do consumidor aos benefícios e atributos de um produto.
Há uma estimativa de redução de investimentos?
De certa forma, sim. Sempre gera algum impacto, que é menos uma redução de investimentos e mais a necessidade de investir de forma mais assertiva e objetiva. O investimento é redistribuído, de acordo com setor para comunicação mais voltada aos compradores ou ponto de venda. A busca pelo investimento eficaz também fica mais evidente e mídias que apresentam melhor ROI tendem a crescer. Investimentos em pesquisas e métricas devem crescer, buscando responder questões sobre eficiência e eficácia de mensagem e mídia. Estratégias de construção de marca funcionam a longo prazo, onde consistência de mensagem e saliência em mídia são essenciais.
Os veículos de comunicação estão sensíveis às negociações?
Acreditamos que ocorre maior flexibilização em sua grande maioria.
Como a ABA tem se posicionado para orientar os anunciantes associados?
Nossa pauta precisa estar sempre relacionada a temas como a busca pela eficiência, foco e disciplina em uma época com várias frentes sendo abertas. É preciso pensar e buscar novas formas de se comunicar e relacionar com o consumidor, seja pela mídia, no ponto de venda ou nas redes sociais. Também estamos em busca de diferentes formas de aferição de resultados por parte dos anunciantes. Esse é uma discussão antiga, mas que está cada vez mais em pauta entre os anunciantes.
A experiência que o Brasil tem com crises anteriores ajuda a formatar estratégias para enfrentar a atual?
Definitivamente, a história sempre traz ensinamentos sobre como enfrentar e reverter certos quadros. Porém, hoje vemos duas situações inseridas em um mesmo contexto, que nunca haviam coexistido. Temos uma crise institucional, política e econômica, o que impacta tanto em anunciantes quanto em consumidores. De um lado, temos empresas lidando com um mercado instável e cheio de desconfiança, com veículos novos que, nas crises anteriores, não existiam (a internet e as mídias sociais); do outro lado temos o consumidor com voz ativa, participação relevante e sendo decisivo no dia a dia das marcas, exigindo determinados comportamentos e posicionamentos das companhias. É um cenário todo novo no qual companhias, marcas, veículos de comunicação e consumidores estão experimentando novas saídas e estratégias.
Como anunciantes observam o modelo brasileiro de publicidade pelo viés do tripé: mídia, criação/planejamento e atendimento?
O planejamento é soberano. Tudo parte dele e é importante que se tenha bom planejamento antes de partir para a criação. O atendimento é a maneira, digamos, tradicional de se lidar com o cliente e deve estar em harmonia com a criação. Mídia está vivendo um momento de desafios com a pulverização do digital. Mas é um tripé, portanto, um não vive sem o outro.
E pelo viés da remuneração? Como os anunciantes contemplam o modelo brasileiro?
O atual modelo brasileiro está sendo revisto, como todos estão acompanhando pela imprensa. Desde 2014, a ABA vem realizando, através de um grupo de trabalho (GT Cenp), uma série de reuniões com seus associados visando a atualização das Normas-Padrão e a revisão dos procedimentos de Non Compliance. Em agosto de 2015, a entidade foi oficiada pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) sobre as atividades do Cenp e, de lá para cá, um grupo de trabalho, formado por representantes de anunciantes, agências e veículos vem se reunindo regularmente no Cenp, visando a busca dos melhores caminhos para a atualização das relações comerciais do mercado publicitário brasileiro. O foco de todos e a evolução, é olhar para frente e estar mais próximo possível do que está ocorrendo na sociedade e em todo o mundo, trazendo luz ao assunto e alinhando expectativas. Esperamos em breve ter o resultado deste trabalho, que visa a modernização da autorregulamentação, considerando os princípios de transparência, livre iniciativa e livre concorrência.
Qual é o formato ideal de remuneração das agências?
O formato ideal é aquele que garante a livre iniciativa e a sustentabilidade na relação entre anunciantes, agências e veículos, respeitados os princípios da livre concorrência e a transparência.
O fee e o sucess fee são bem-vindos?
Sim, todas as formas de remuneração são bem-vindas, desde que previamente acordadas, também dentro dos princípios da livre concorrência e da transparência.
E as BVs? A ANA, nos Estados Unidos, tem feito restrições duras a esse modelo de remuneração?
A ABA espera que haja um entendimento entre agências e anunciantes para que se chegue em um modelo que atenda às demandas de todos. Muito do que se pratica em outros países não pode ser aplicado no Brasil e vice-versa. E é por isso que nós trabalhamos com o Cenp, com nossos Comitês, em busca das melhores práticas do mercado, endereçando nossos associados para que suas relações com seus fornecedores sejam saudáveis e benéficas para ambos os lados. A ABA vem acompanhando esta movimentação junto à ANA, inclusive porque integra o Conselho Executivo da WFA – World Federation of Advertisers (da qual a ABA e a ANA fazem parte, junto com outras 55 associações nacionais de anunciantes em seis continentes e mais de 50 dos principais anunciantes de todo o mundo). A WFA é a única organização global que representa os interesses comuns das empresas anunciantes, e a ABA está em constante contato para termos uma visão mundial dos assuntos ligados a marketing e a comunicação.
O que a ABA espera das agências?
É simples: resultado, inovação e eficácia. Efetividade é o ponto chave. A questão é como usar a mesma verba de forma eficaz.
Não há comoditização dos formato?
Há quem entenda que sim, mas, sinceramente, vejo esse momento como uma transição. As empresas e os veículos ainda tentam entender e acertar quais são as mensagens e os meios de transmissão mais efetivos em impacto no consumidor, mas, ao que parece, o ideal é criar um mix de veículos que aproveite o melhor que cada mídia pode oferecer para garantir o posicionamento da marca, a venda do produto, a lembrança da empresa. É claro que há produtos/serviços bastante segmentados e que funcionam neste ou naquele determinado formato, mas, em geral, as organizações buscam encontrar um equilíbrio inteligente entre os veículos.
Como a ABA enfrenta problemas relacionados às restrições?
Nós trabalhamos com um foco: oferecer as melhores práticas, soluções e estratégias para nossos associados. Por isso, a primeira preocupação é sempre estar de acordo com as leis, dentro das normas, respeitando os órgãos reguladores, como o Conar. A partir daí, com a formação de Comitês, Grupos de Trabalho e eventos direcionados, contamos com representantes das empresas parceiras para debater e discutir as estratégias mais atuais para utilizar os veículos e meios de comunicação de forma íntegra e saudável, sem ferir os direitos e deveres de todas as partes envolvidas, do anunciante ao cliente, passando por todos os departamentos das agências.